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2008-12-02

O comércio de carbono pode se converter em uma garantia de segurança alimentar na África, se a comunidade internacional reconhecer que a agricultura sustentável e a preservação das selvas contribuem para minimizar a mudança climática. Não há dúvidas de que a mudança climática é uma ameaça. A África é responsável por apenas 3,8% da concentração de gases causadores do efeito estufa, mas será a região mais prejudicada do planeta. A maioria dos cientistas atribui a esses gases, como o dióxido de carbono, óxido nitroso e metano, o atual ciclo de aquecimento da atmosfera, que produz grandes alterações climáticas.

O continente tem mecanismos e recursos limitados para minimizar e adaptar-se às mudanças causadas por esse fenômeno. Entre as atividades paliativas figura o cultivo de diferentes vegetais que compensem as expressões locais da mudança climática e a proteção de zonas costeiras diante da elevação do mar. A delegação do Mercado comum da África Oriental e Austral (Comesa) exigirá mudanças no funcionamento do mercado de carbono na conferência da Organização das Nações Unidas sobre mudança climática, aberta hoje na cidade polonesa de Poznan.

Os mercados de carbono são um mecanismo previsto no Protocolo de Kyoto da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança Climática, segundo o qual países e empresas, especialmente do setor de energia, podem adquirir o direito de emitir gases de efeito estufa em troca de financiamento de projetos que minimizem o fenômeno. “Mais de quatro bilhões de pessoas nos países em desenvolvimento, que dependem da agricultura, estão excluídas desse mecanismo. A África deve utilizar o comércio de carbono para conseguir a segurança alimentar, em risco”, ressaltou o secretário-geral da Comesa, Sindiso Ngwenya, em uma conferência do bloco realizada no mês passado na capital do Quênia.

No contexto do mercado de carbono estabelecido no Protocolo de Kyoto, as empresas que superam seus limites de emissões de gases de efeito estufa podem investir em projetos limpos no Sul, enquanto ganham tempo para reduzir sua própria contaminação. É aí que entram os pequenos agricultores africanos. Se forem reconhecidas a importância do cultivo sustentável e a preservação das selvas, os contaminantes dos países ricos poderão comprar créditos de carbono dos camponeses deste continente. O mercado global de carbono cresce. O volume de 2007 é estimado em cerca de US$ 30 bilhões, duas vezes e meia a ajuda que a África recebe.

Os participantes da reunião de Nairóbi exortaram a União Européia a rever seu Plano de Comércio de Emissões, que apenas permite às companhias dos 27 países do bloco comprar créditos de carbono de empreendimentos industriais, não de projetos florestais, agrícolas ou agro-florestais. A África ficou fora do mecanismo porque a UE considera que a indústria deste continente é muito pequena (e com escassas emissões de dióxido de carbono) para poder ter direito aos créditos de carbono. A diretora-geral da Rede de Análise de Políticas de Agricultura e Recursos Naturais (Fanrpan), Lindiwe Majele Sibanda, cobrou da África que pressione para que a agricultura sustentável seja incluída no comércio de carbono.

“A menos que o convênio que suceder o Protocolo de Kyoto valorize a contribuição da agricultura sustentável pode dar para o mercado de carbono, a África continuará marginalizada”, disse Sibanda. No contexto acordado em Kyoto, no Japão, em 1997, vigente desde 2005, 36 países industrializados (menos os Estados Unidos, que retiraram sua assinatura do tratado em 2001) se comprometeram a reduzir sua emissão de gases de efeito estufa em pelo menos 5,2% até 2012, em relação às concentrações registradas em 1990.

A Comesa deu mandato à Fanrpan para que coordene a Iniciativa sobre a Mudança Climática da Sociedade Civil Africana por uma Política de Diálogo (ACCID). O projeto prepara governos e organizações para que trabalhem no sentido de o convênio que substituir o Protocolo de Kyoto inclua a agricultura sustentável e a preservação das florestas. Se continuarem excluídas – disseram os delegados – os esforços para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e combater a mudança climática podem ser estéreis. É preciso pagar às nações em desenvolvimento para que cuidem de suas florestas, acrescentaram.

Os créditos de carbono podem triplicar o valor das florestas existentes, bem como converter-se em uma boa iniciativa para incluir mais terras nos programas de reflorestamento, insistiu Eric Bettelheim, diretor-executivo da organização britânica Sustainable Forestrey Management (Gestão Florestal Sustentável). A África poderia receber cerca de US$ 10 bilhões pela venda de aproximadamente 500 mil toneladas de carbono, a US$ 20 a unidade, acrescentou Bettelheim.

“Essa quantia pode transformar a economia dos países africanos porque é comércio, não ajuda”, insistiu o especialista. “Os agricultores pobres devem receber mais dinheiro e conseguir maior produtividade ou não serão uma solução para o aquecimento do planeta, e não funcionarão o próximo convênio internacional nem os ecossistemas florestais até o final do século”, concluiu Bettelheim.

(Por Busani Bafana, IPS, Envolverde, 01/12/2008)


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