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etanol biocombustíveis
2008-12-01

A crise financeira se convidou para a primeira Conferência Internacional sobre Biocombustíveis, que se realizou em São Paulo de segunda-feira (17/11) a sexta (21 de novembro), obscurecendo a ofensiva diplomática preparada durante longos meses pelo governo de Brasília.

Segundo produtor mundial de etanol, elaborado por baixo preço com a cana-de-açúcar, o Brasil sonha em impor seu biocombustível no mercado internacional como uma matéria-prima energética verde, e não como simples produto agrícola. As autoridades, que elogiam incansavelmente os méritos dessa energia renovável, esperavam que esta conferência pudesse, diante dos 2 mil especialistas e responsáveis políticos vindos de 40 países, legitimar seu etanol.

Mas, em período de crise e de petróleo menos caro, o interesse pelos agrocombustíveis diminuiu e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva finalmente não abriu, mas apenas encerrou, os debates, enquanto o presidente americano, George Bush, cuja vinda era esperada em virtude do acordo de cooperação sobre o etanol assinado entre Brasília e Washington em março de 2007, não confirmou sua presença.

Ao longo dos debates sobre biocombustíveis e o desenvolvimento sustentável, a segurança alimentar ou os desafios para o ecossistema, todos os oradores manifestaram sua preocupação diante do momento delicado que atravessa a economia mundial. "Essa crise também pode ser uma grande oportunidade para rever nossos parâmetros e nos envolvermos em um novo ciclo baseado nos biocombustíveis", temperou o economista franco-polonês Ignacy Sachs.

Enquanto US$ 30 bilhões de investimentos eram esperados para o setor nos próximos meses, a poderosa União Brasileira de Indústrias de Cana-de-açúcar estende a mão ao Estado. "Vamos pedir ao governo que nos ajude a atravessar esse momento difícil", confessou Marcos Jank, que estima que somente a metade dos 200 grupos econômicos do açúcar no Brasil sobreviverá à tormenta.

No entanto, estudos divulgados durante a conferência garantem que a produção de biocombustíveis aumentará 191% até 2015. As plantações de cana ganharam terreno: já aumentaram 15,7% em um ano no sul do Brasil, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais.

Impactos negativos
A crise não é o único elemento que afeta as perspectivas do etanol. Reunidos longe dos salões da conferência, uma centena de representantes de movimentos sociais brasileiros e estrangeiros, entre os quais a Via Campesina, fizeram uma lista dos impactos negativos da cana-de-açúcar, e, portanto, dos riscos da monocultura. Em uma declaração final enviada aos responsáveis pela conferência, essas organizações salientam principalmente as ameaças à segurança alimentar mundial, pois a produção industrial de biocombustíveis entraria em concorrência com os solos e a água destinados à agricultura alimentar.

"Os primeiros sinais do recuo dos alimentos já são notados no Brasil", afirma Jean Marc von der Weid, especialista em agricultura familiar. Ele dá o exemplo do estado de São Paulo, onde se concentram dois terços da produção de etanol: o avanço da cana entre 1990 e 2003 fez recuar as superfícies de milho, feijão preto, arroz, trigo, laranja, café e algodão. "Os capitais investidos na indústria do açúcar visam as melhores terras", estima esse consultor da administração da ONU para alimentação e agricultura (FAO).

A cana empurra a fronteira agrícola para a Amazônia e preocupa os ecologistas. Eles se surpreendem que o governo ainda não tenha divulgado o mapa delimitando as zonas proibidas às plantações de cana, para proteger a floresta tropical. "Esse etanol é o menos caro do mundo, mas a que preço humano?", interroga o advogado trabalhista de Recife Bruno Ribeiro. Para ele, "com a conivência do Estado, os 500 mil cortadores de cana conhecem a precariedade de um emprego sazonal, às vezes em condições degradantes e desumanas". De janeiro de 2003 a outubro de 2008, 6.779 pessoas foram "liberadas" de contratos de trabalho forçado, 5.174 nos últimos 20 meses. "Uma escravidão moderna que aumenta no setor de açúcar, e, portanto, do etanol", denunciou a Igreja Católica no Brasil.

"Há um ano nossas críticas quase não eram escutadas", comentou uma das participantes do seminário, da ONG Fase. "Mas a crise demonstra que o ritmo de consumo de energia não pode ser sustentado e que não devemos nos tornar o celeiro de biocombustíveis dos consumidores europeus ou americanos."

(Por Annie Gasnier, Le Monde, UOL, 22/11/2008)


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