“Tudo começou com o corte da ceiba” (um tipo de árvore), recorda Isabel Díaz, que iniciou o projeto Guarda-florestal, uma iniciativa ambientalista que pretende incentivar a participação consciente da cidadania da capital cubana na proteção de seu entorno natural, em particular das árvores urbanas. Em dezembro de 2006 uma brigada do Serviço Estatal Florestal executou a poda extrema de uma ceiba centenária no bairro de San Agustín, nos arredores da capital cubana, com a intenção de evitar que um de seus galhos caísse sobre um sobrado onde na época funcionava um consultório médico. “Antes, minha vida na comunidade era bem mais apática”, confessou Díaz à IPS. “A partir desse corte me dei conta de que deveria fazer algo”, acrescentou.
O jovem biólogo tirou fotos e fez vídeos da árvore danificada, recolheu assinaturas entre quem passava pelo lugar e escreveu a dezenas de pessoas alertando sobre o fato. Pouco depois de sua denúncia foi contatado por funcionários do Serviço Florestal para esclarecer que o ocorrido foi uma violação da ordem de poda. A resposta positiva das autoridades e o apoio de pessoas e instituições levaram à idéia de elaborar o boletim eletrônico El Guardabosques, que se define como “uma alternativa em comunicação ambiental”.
Esta publicação bimestral, amparada pela Direção de Cultura do município Plaza de la Revolución, onde Díaz trabalha na área de informática, é distribuído atualmente a mais de 500 endereços eletrônicos, a maioria de universidades institutos de pesquisa, instituições culturais e artísticas, dentro e fora de Cuba. Cada edição apresenta notícias sobre proteção ambiental, denúncias de ações contra a natureza, artigos científicos, textos literários e ilustrações relacionadas com a ecologia, além de documentos legais que normatizam o cuidado com o meio ambiente.
A publicação convida em cada edição a informar os casos de agressão contra as árvores, em qualquer lugar da ilha. Além disso, pretende se converter em um meio para que a população participe ativamente em sua própria educação ambiental. Segundo o Departamento de Ordenação Florestal do Ministério da Agricultura, a área boscosa na província Ciudad de La Havana, a menor das 14 em que Cuba está dividida, atingia em 2005 5,6% de sua superfície.
A capital cubana cumpre as normas da Organização Mundial da Saúde que recomenda ter 10 ou mais metros quadrados de áreas verdes por habitante. Dados do Serviço Florestal indicam que em Havana há 13 metros quadrados, em média, que chegam a até 33 metros quadrados nas zonas suburbanas. A cidade conta desde 1996 com um plano de reflorestamento, conhecido como Meu Programa Verde. Seus objetivos fundamentais são “reverter o desastre silencioso do desmatamento na província”, conseguir um ordenamento proveitoso das árvores e plantá-las em todos os lugares onde isso for possível.
Entre janeiro e setembro passado foram plantados em Havana mais de 2,1 milhões de árvores, que representam quase 3% do total deste país, com 11,2 milhões de habitantes. Estima-se que esse ano o ritmo de reflorestamento na ilha diminua, depois de terem sido plantados em 2007 136,6 milhões de árvores, como parte da campanha do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. “As árvores da cidade são muito velhas e o mais antigo não é idôneo, pois foram usadas espécies agressivas, que podem perfurar cisternas e levantar o calçamento com suas raízes”, afirmou Díaz. A seu ver, “há um pensamento muito incrustado nas pessoas e instituições de que a arvore não tem a menor importância”.
Essa lógica que exclui a árvore do planejamento urbano seria em certa medida a causa do “desastre silencioso” que sofre a vegetação local. Segundo Díaz, as autoridades da cidade tampouco contam com os recursos necessários para repor os exemplares cortados por outros mais adequados. Além disso, a brigada do Serviço Estatal Florestal encarregada das podas carece das condições de trabalho e da preparação necessárias para realizar suas tarefas. O desmatamento aumenta em época de furacões, quando a empresa elétrica e a telefônica se somam ao trabalho de corte de galhos e de arvores para proteger os postes e as linhas de transmissão, lembrou o ativista.
A lei florestal cubana, de 1999, classifica as árvores urbanas dentro dos chamados Bosques Recreativo, nos quais “apenas se permite podas de melhoria para ajudar a aumentar sua função” recreativa e de saneamento ambiental. Díaz integrou-se este ano ao Grupo Gestor para o Resgate do Dia da Árvore, uma iniciativa comunitária do central bairro do Vedado, que desde 2002 trabalha para recuperar a realização dessa jornada, estabelecida em cuba no dia 10 de outubro de 1904 por uma associação de moradores. Esse grupo também criou o Clube de Amigos da Árvore, com a intenção de coordenar as ações das pessoas interessadas em conservar o patrimônio florestal da cidade.
Segundo a tese de doutorado “O desmatamento da ilha de cuba durante a dominação espanhola (1492-1898)”, do engenheiro espanhol Miguel Jordan Reyes, apresentada em 2006 na Universidade Politécnica de Madri, a ilha perdeu cerca de 30% de sua área florestal durante o período colonial. Em 1959, antes do triunfo da revolução liderada por Fidel Castro, a superfície coberta por florestas era de apenas 14% do território nacional. Hoje supera os 25%.
(Por Patrícia Grogg, IPS, Envolverde, 24/11/2008)