Uma nova defesa prévia pedindo a liberdade dos três quilombolas presos há 25 dias foi protocolada nesta segunda-feira (24), para julgamento do juiz Marcus Antônio Barbosa de Souza, da 2ª Vara Criminal de Conceição da Barra, norte do Estado. Esta é a segunda vez que será julgado o pedido de relaxamento de prisão, negado na última semana.
O defensor público José Geraldo Andrade e o assessor jurídico Jassenildo Reis, do Programa de Defesa aos Defensores dos Direitos Humanos em Risco de Ameaça, estão à frente do processo.
“Não há motivo para eles continuaram presos. É o tipo de crime em que se aguarda o julgamento em liberdade. A justificativa para não conceder tal benefício não faz sentido. Continua a alegação de que o furto de eucalipto é o grande problema da região. Não há tráfico de drogas, violência contra mulher, nada disso. Somente a culpa dos quilombolas”, pontuou o assessor jurídico.
Reis disse que tinha esperança de conversar com o juiz ainda nesta segunda, mas às vezes em que o procurou não conseguiu nem ao menos falar sobre o processo, pois era informado de que ele nunca estava. Agora, ele teme ainda mais demora, já que viaja nesta quarta-feira (26), retornando somente em duas semanas. “Infelizmente, estamos sem expectativas”, completou.
Ele também voltou a afirmar que Edivaldo Jerônimo, Valdete Jerônimo e Edival Jerônimo Florentino deveriam estar no mesmo lugar, e não separados (um está em Pancas e os demais em Conceição da Barra), desnecessariamente. Isso porque na sala onde estão os dois negros cabe até quatro pessoas, como ressaltou.
Para o assessor jurídico, a prisão dos quilombolas representa a sobreposição dos interesses econômicos aos sociais, característico da região. Os negros foram presos em uma área onde a Aracruz Celulose já havia feito o corte, e só restavam galhos secos. Os descendentes de escravos estavam se preparando para catar os restos de eucalipto, que é lixo para a empresa, quando foram surpreendidos pela milícia armada da Aracruz, a Visel, com o apoio da Polícia Militar. Nada foi encontrado com eles. Mesmo assim, a ocorrência relata furto de eucalipto, em flagrante.
A cata dos restos de eucalipto é permitida na região, resultado de um acordo firmado entre a empresa, os quilombolas e a prefeitura de Aracruz. A atividade foi o único meio de subsistência que restou aos negros, depois da chegada das extensas plantações de eucalipto na região, que destruíram as matas e contaminaram os recursos hídricos, afugentando os animais. Os galhos de eucalipto são usados na produção do carvão e do beiju, prato típico da tradição quilombola.
Berto Florentino, pai de dois dos presos e tio do terceiro, tem histórico de forte envolvimento com a luta quilombola pelas terras tradicionais ocupadas e exploradas pela Aracruz Celulose. Ele é o líder dos catadores de resíduos de eucalipto e membro do grupo folclórico Ticumbi, e também um dos últimos a não se intimidar com as ameaças da empresa. Já foi vítima duas vezes de invasão à sua casa, em busca de armas que pudessem incriminá-lo. Mas nada foi encontrado e vários móveis foram destruídos.
Ao todo, de 50 mil hectares pertencentes aos negros na região de Conceição da Barra e São Mateus, a maioria é ocupada pela empresa, que expulsou os quilombolas de suas terras.
(Por Manaira Medeiros,
Século Diário, 25/11/2008)