A Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA) vai assumir a coordenação da fase de execução do Projeto Biodiversidade RS. Em fase de transição, está com seu cronograma atrasado em pelo menos um ano. Nas últimas semanas, a Sema vem se reunindo com a titular da Secretaria de Coordenação e Planejamento, Margareth Vasata, responsável pela coordenação do projeto até agora.
Segundo Margareth, uma das razões do atraso seria uma redução da doação do
Bird/Fundo Global de Meio Ambiente – GEF , que inicialmente seria de US$ 7,5 milhões com contrapartida de US$ 9,5 milhões do governo do Estado. Com os cortes efetuados pelo Fundo para projetos em todo o país (apenas 10 serão contemplados), o Biodiversidade receberá US$ 5 milhões, com contrapartida de US$ 6,1 milhões. “Essa nova situação nos forçou a refazer todo o projeto”, justifica.
Outro fator que contribuiu para o retardamento do projeto foi a velha conhecida burocracia. Só na Secretaria de Assuntos Internacionais, onde seria analisado, ficou paralisado por quase um ano. O desenrolar final depende agora do aval do Banco Mundial para que seja encaminhado até o fim deste ano para a Chief Executive Officer (CEO) do GEF, a francesa
Monique Barbut.
Biodiversidade amigaO ambientalista e Doutor em Biologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Paulo Brack, lamenta o engavetamento do programa e destaca sua importância porque incorpora a biodiversidade no sistema produtivo. “É um projeto belíssimo, porque nunca fora mostrada a compatibilidade entre biodiversidade e desenvolvimento. Descobrimos uma infinidade de maneiras de incluir essa biodiversidade a serviço do desenvolvimento”, completa.
Um exemplo disso seria a
pecuária, atividade tradicional do gaúcho. Brack ressalta que a manutenção da pecuária com um manejo mais eficiente é altamente compatível com o meio ambiente, e ainda poderia ter sua produtividade elevada de quatro e 10 vezes. “Com manejo barato poderiam aumentar em muitos os quilos de carne por hectare”.
Brack, que também é membro da
ONG Ingá e do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), revela que o programa seria uma forma de contrapartida aos mega-plantios de eucalipto licenciados pela Fepam. “Poderíamos manter o bioma Pampa com incentivo ao Ecoturismo e Turismo Rural”, exemplifica.
Sobre a redução dos recursos por parte do GEF, Brack é otimista. Acredita que qualquer valor, hoje, é importante porque o RS Biodiversidade é um contraponto às monoculturas e a agricultura tradicional dependente de química. “A dita agricultura moderna considera a biodiversidade como um empecilho, o que é um erro”. Ao priorizar a exportação de grãos, um país tropical como o Brasil deixa de explorar as centenas de frutas nativas que têm.
De acordo com ele, seria muito mais vantajoso tanto do ponto de vista financeiro quanto ecológico. “Somos viciados em um modelo de agricultura que agride o meio ambiente, importa energia, insumos e exporta seus produtos. Nesse momento de crise seria bom repensar esse modelo”, pondera.
Brack lembra que só o Rio Grande do Sul possui uma centena de espécies frutíferas, e que pelo menos uma dúzia delas está sendo explorada pela
biopirataria mundo afora. Segundo ele, os projetos relacionados à fruticultura estão direcionados à espécies exóticas, não havendo interesse em desenvolver culturas nativas.
“O RS Biodiversidade teria enorme incremento para nosso desenvolvimento nos campo nativos por meio do turismo ecológico, da exploração de frutas nativas, da pecuária e até de sistemas agroflorestais”, cita. Ele salienta que no Estado existem muitas, porém pequenas, iniciativas nessa direção. Centenas de famílias trabalham com
sistemas agroflorestais, com o cultivo da erva-mate.
Em Santa Catarina existe uma grande produção de alimentos orgânicos e policulturas sendo exportados para vários paises da Europa. “Termos uma grande chance de superar as monoculturas. Esse modelo de exportação pode ser bom, mas não tem sustentação. E essa sustentação é a biodiversidade”, analisa. Como exemplo, lembra que o mel das abelhas silvestres tem cinco vezes mais valor do que o mel das
abelhas apismelifera, que tem problemas na biodiversidade por competir com abelhas nativas.
Pior do que a redução dos recursos financeiros, seria a falta de interesse da direção da Sema no programa. Ele salienta que há algum tempo a secretaria e a Fepam estão sob uma “intervenção branca”. “A política ambiental deste governo existe para destravar todo tipo de impedimento que a área ambiental possa significar. Não existia nem interesse, nem entendimento da importância da questão”, afirma.
A reportagem de Ambiente JÁ vem tentando há uma semana contato com o secretário estadual de Meio Ambiente, por meio da sua assessoria de imprensa, sem sucesso.
Sobre o projeto O projeto foi elaborado pela Sema e pela Secretaria do Planejamento e Gestão, por meio da Fepam, Fundação Zoobotânica e Emater com a proposta de promover a conservação e a recuperação da biodiversidade, desenvolver instrumentos de gestão mais adequados, fomentar a conscientização sobre o tema, promover ações de recuperação de áreas prioritárias e garantir a função, a dinâmica e a evolução dos ecossistemas no Estado, divididos em campos, banhados e florestas.
Neste sentido, oito áreas foram consideradas prioritárias, abrangendo 72 municípios: Campos de Cima da Serra; Turvo; Quarta Colônia; Campos de Campanha, Escudo Sul-rio-grandense; Nascentes do Rio Forqueta; Litoral Norte e Litoral Médio.
(Por Carlos Matsubara, Ambiente JÁ, 24/11/2008)