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amazônia
2008-11-23
Ferramenta computacional calcula tamanho de chavascais e das campinaranas, duas zonas com grande oferta de água

Novos ecossistemas têm fauna e flora próprias, diz cientista do Inpa; passo seguinte é aplicar método em todas as regiões do país

Qualquer um que tenha caminhado no mato na Amazônia já desconfiava que o ambiente chamado de terra firme (aquele que nunca é inundado) é muito heterogêneo. Mas a revelação feita por um modelo matemático desenvolvido no Brasil e apresentado em uma conferência internacional sobre a Amazônia nesta semana faz emergir o tamanho dessa diferença.
"Nós descobrimos a existência de quatro ambientes dentro da chamada terra firme", afirma Antônio Nobre, do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia). A ferramenta, baseada "em muita física básica", segundo o ecólogo, permitiu calcular que 58,5% da chamada terra firme é um baixio que tem acesso fácil à água em todas as épocas do ano.

"São áreas de chavascais e de transição", diz Nobre. "Não que essas áreas tenham lâminas d'água, mas elas são úmidas. Quando você anda pelo chavascal ele faz "choc", "choc"..." Na área de transição, também chamada de campinarana, há predomínio de areia e "o lençol freático é bastante raso", afirma o pesquisador.

O novo modelo, que partiu do conceito físico dos vasos comunicantes, analisou até agora uma área de 18 mil quilômetros quadrados ao redor do rio Negro, no Estado do Amazonas. "A ferramenta está pronta para ser usada em toda a Amazônia. Esse será o próximo passo do estudo", diz Nobre.

Hoje, estima-se que 17% da Amazônia seja preenchida por áreas inundáveis e 83% por áreas de terra firme. Com os novos dados, esse último grupo ganha quatro subdivisões.

Dentro dos baixios, a modelagem feita no âmbito do LBA (Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera da Amazônia) e do Geoma (Rede Temática de Pesquisa em Modelagem Ambiental da Amazônia), que usou imagens feitas pelo ônibus espacial Endeavour, identificou duas classes.
Os chavascais, que ocupam uma área de 25,6% da terra firme, e uma área de transição (ecótono), que representa 32,9% do total das áreas estudadas que não são inundáveis.

Na região onde o lençol freático é mais profundo e a água nunca chega, há 11,1% de encostas e 30,4% de platôs.

Florestas diferentes
"A aplicação disso é muito importante. Na verdade, estamos falando de lugares diferentes, assim como Nova York difere de Bancoc", diz Nobre. De acordo com o pesquisador, o ciclo de carbono e dos demais nutrientes serão bem distintos em cada novo ambiente. "Os tipos de árvore e a fauna associada a eles também vão mudar."

Com esse novo mapa de drenagem e topografia nas mãos, os biólogos e ecólogos poderão direcionar melhor suas expedições e até ajudar a conservar muito mais a biodiversidade amazônica, segundo Nobre.
"A vida é a grande responsável pela regulação do planeta Terra. Por que os nossos vizinhos [no Sistema Solar] são muito quentes ou frios?"

Mirando a lei
A ferramenta desenvolvida por Nobre e outros pesquisadores pode também até fazer mudar a legislação ambiental.

"As áreas com água são áreas de proteção permanente. Agora, nós mostramos que elas podem estar muito mais longe de um corpo do água do que se pensava antes. Talvez seja preciso ajustar a lei", disse Nobre, que espera usar a ferramenta em outras áreas do país.

Hoje, a legislação diz que a mata ciliar -aquela que existe nas margens dos cursos d'água- deve ser preservada por algumas dezenas de metros da margem. "Mas será que isso é suficiente para preservar todo o ecossistema aquático?" -pergunta Nobre. Afinal, nem sempre a lei é muito considerada. Um outro estudo apresentado em Manaus, por exemplo, mostrou que uma área de mil hectares em Roraima perdeu 80% de sua mata ciliar.

(Folha de São Paulo, 22/11/2008)

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