Convenção 169 da OIT, internalizada no ordenamento jurídico brasileiro em 2004, determina que as comunidades tradicionais e indígenas sejam consultadas previamente sempre que algum ato administrativo ou normativo venha a nelas gerar algum impacto.
A Advocacia-Geral da União coordenou, por intermédio da Consultoria-Geral da União, a primeira experiência de implementação da Convenção 169 da OIT no Brasil, quando submeteu a proposta de alteração da Instrução Normativa 20/2005 do Incra a representantes de 300 comunidades remanescentes de quilombos de todo o país e a cerca de vinte “especialistas” que atuam em ONGs que supostamente prestam apoio a essas comunidades.
Diferentemente do que levianamente vem sendo veiculado em algumas matérias jornalísticas, as comunidades não tiveram acesso ao texto proposto apenas nos três dias da consulta — 17 a 19 de abril de 2008.
Declaração publicada por algumas agências de notícias, atribuída a dirigente do Instituto Sócio Ambiental (ISA), com sede em Brasília, chega ao absurdo de afirmar que a consulta se deu em apenas um dia e que as comunidades receberam o texto pela manhã e que sobre ela tiveram que se manifestar à tarde.
Trata-se de informação falsa, assim como tantas outras que nos últimos dois meses vêm sendo difundidas, que em nada contribui para o equacionamento dos problemas que envolvem tão importante política pública que visa assegurar direitos previstos no texto constitucional às comunidades remanescentes de quilombos.
Importa denunciar esse método espúrio de argumentação, bastante conhecido por todos e que nefastas lembranças traz à humanidade, de tentar impor a mentira por sua veiculação repetida e de tentar fazer prevalecer a versão sobre os fatos.
A minuta do texto da nova Instrução Normativa foi distribuída, ainda em novembro de 2007, para todas as Coordenações Regionais da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombos (Conaq), principal interlocutora das comunidades remanescentes de quilombos junto ao Governo Federal. A própria Convenção 169 da OIT recomenda que a relação com as comunidades se faça por intermédio de suas entidades representativas.
Todos os comprovantes de entrega e recebimento dessas comunicações emitidos pela ECT encontram-se nos autos do processo administrativo que tramita na AGU.
Assim, todos os representantes que participaram da consulta em abril de 2008, inclusive os ditos “especialistas” que atuam em diversas ONGs, tiveram acesso ao texto debatido pelo menos quatro meses antes da consulta pública.
As comunidades só aceitaram participar da consulta pública após o Ministério Público Federal manifestar-se, no final de dezembro de 2007, no sentido de que a Consulta proposta pela AGU cumpria o previsto na Convenção 169 da OIT.
Todas as reuniões do GT coordenado pela AGU foram filmadas e registradas em atas. Os três dias de debates na Consulta Pública, ocorrida em abril deste ano em Luziânia (GO), foram filmados e, nos filmes, percebe-se toda a riqueza do debate democrático com convergências e divergências que lhe são inerentes.
A Advocacia-Geral da União está à disposição para prestar esclarecimentos e informações ao Ministério Público Federal, ao Poder Judiciário, à Organização Internacional do Trabalho, à Organização dos Estados Americanos e a quem solicitar sobre todo o procedimento que se iniciou em julho de 2007 e culminou com a publicação da IN/Incra 49, de 2008, em 1º de outubro de 2008.
Reafirmamos nossa convicção de que esse ato normativo, que é absolutamente consentâneo com a Constituição Federal, com a legislação interna e com a Convenção 169, da OIT, certamente tornará mais objetivo e razoável todo o procedimento de identificação, demarcação e titulação das terras às comunidades remanescentes de quilombos do Brasil.
(Por Ronaldo Jorge Araujo Vieira Junior, Consultor Jurídico, 20/11/2008)
Ronaldo é consultor-geral da União e coordenador do Grupo de Trabalho que construiu as novas bases para a Instrução Normativa do Incra sobre a questão Quilombola.