Documento divide opiniões de ambientalistas. Alguns acham que ele é desnecessário; outros, que facilita o cumprimento da leiO ministro do Meio Ambiente Carlos Minc afirmou, ontem, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve assinar o decreto que regulamenta a Lei da Mata Atlântica nesta sexta-feira. Rumores indicavam que o documento poderia entrar em vigor ontem, porém o ato foi adiado para que a assinatura ocorra em uma cerimônia pública com a participação de ambientalistas, segundo a Agência Brasil. Enquanto alguns especialistas alegam que o novo decreto facilita a implementação de medidas para a recuperação do bioma (região com o mesmo tipo de clima e vegetação), outros dizem ser redundante.
O conteúdo do documento carrega a expectativa dos ambientalistas por que ainda não se sabe exatamente quais novidades podem surgir. De acordo com o diretor executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem (SPVS), Clovis Borges, o decreto “será positivo” para preservar os focos restantes de Mata Atlântica. “Será um documento de bastante consistência, que procura estabelecer o enriquecimento das florestas secundárias”, diz.
Borges defende que um novo decreto aumenta os instrumentos para a execução da Lei da Mata Atlântica, assinada em dezembro de 2006. A falta de regulamentação efetiva dificulta a implementação das novas normas. “Com ele, os limitadores da lei passam a estar regulamentados, evitando conflitos em razão de diferentes interpretações”, explica.
Para Mario Mantovani, diretor da Fundação SOS Mata Atlântica, não havia necessidade de um decreto, porque a lei de 2006 foi regulamentada em cada um dos 17 estados cortados pela floresta. De um total total de 1,3 mil quilômetros quadrados ou 15% do território nacional, apenas 7,3% da mata se salvou em pequenos focos. “O decreto se torna algo burocrático. E redundante, porque os problemas se concentraram só no Paraná e em Santa Catarina”, diz.
Conforme Mantovani, era possível manter a vida da mata sem a necessidade de novas leis. O Código Florestal, de 1930, estipulava a manutenção de reserva legal de 20% da área total de uma floresta. E as Áreas de Preservação Permanentes (APP) foram estimadas em 17%. “Com isso, 37% da Floresta Atlântica teria sido preservada. O que resta hoje é, na verdade, muito pouco. E o que foi alterado vai continuar alterado”, diz.
Aumenta proteção de araucáriasO novo documento, assim como a Lei da Mata Atlântica, pode auxiliar na manutenção das florestas de araucárias. Em 1993, o decreto 750 havia impedido a realização de cortes na Mata Atlântica. A legislação conseguiu, de certa maneira, impedir o avanço do desmatamento, à exceção do Paraná e de Santa Catarina.
Nesses estados, encontram-se a maior parte das araucárias e, no decreto de 1993, não havia consenso se esse tipo de floresta se enquadrava no tipo de vegetação protegida como Mata Atlântica. “A lei incide apenas sobre os 7% que restam de floresta. Esses estados jogaram contra a lei, foi uma espécie de sabotagem para não impedir a devastação”, opina Mario Mantovani, diretor da Fundação SOS Mata Atlântica. “Dos 7%, apenas 1% é de Araucárias. E, mesmo assim, ainda há o interesse em acabar com esse resto de vegetação”, completa.
Clovis Borges, diretor executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem (SPVS), argumenta que os espaços onde se localizavam as florestas de araucária se tornaram espaços de exploração comercial. “Foi um contra-senso. Centenas de milhares de hectares mudaram de floresta nativa para plantação de soja e reflorestamento de pínus para aproveitar a venda de madeira”, diz. De acordo com Borges, o poder público cedeu aos interesses do setor econômico de agricultura, pecuária e madeira, deixando de lado os interesses de conservação do meio ambiente e do bem comum. “É preciso sair da idade da pedra e considerar áreas naturais como parte de um negócio. Mais importante: são necessárias à vida”, afirma.
(
Gazeta do Povo, 19/11/2008)