O etanol de segunda geração, produzido a partir da celulose presente nos resíduos da cana-de-açúcar, é uma alternativa fundamental aos cerca de cem países capazes de produzir o combustível renovável e que desejam fazê-lo sem prejudicar a produção de alimentos.
O cenário foi destacado por Christoph Berg, diretor geral da F.O. Licht, consultoria alemã do mercado de commodities, na tarde de segunda-feira (17/11), em São Paulo, durante a sessão plenária que abordou o tema da segurança energética na Conferência Internacional sobre Biocombustíveis, que reúne delegações de 92 países para a discussão dos desafios e oportunidades dos biocombustíveis.
“Do ponto de vista da oferta, as tecnologias de primeira geração deverão garantir um crescimento relativamente constante no mercado do etanol até 2018. A partir daí, os produtores mundiais precisarão de tecnologias da geração seguinte. Caso contrário, teremos o limite da oferta em relação à competição entre o uso da terra para a geração de energia e a produção de alimentos”, alertou.
Berg, que é membro do Grupo Consultivo sobre Biocombustíveis da Comissão Européia, apontou que o etanol, nesse período de tempo, tem capacidade de atingir uma participação no mercado global de combustíveis de até 10%, considerando a estrutura tecnológica atual.
“Uma participação de mercado maior do que essa só seria alcançada com o domínio das tecnologias do etanol de segunda geração, que poderão prover os necessários metros cúbicos extras do biocombustível por hectare”, afirmou.
O etanol de segunda geração, uma alternativa para o uso energético da biomassa, pode ser obtido a partir da tecnologia de lignocelulose, que utiliza o bagaço e a palha da cana com vantagens ambientais e econômicas.
Calcula-se que esses compostos orgânicos, hoje praticamente sem valor comercial, correspondem a cerca de 50% da biomassa terrestre. A produção de etanol da lignocelulose extraída desses materiais é feita com tecnologias ainda em fase de aperfeiçoamento. A transformação pode ser feita com uso de ácidos (hidrólise ácida) ou de enzimas (hidrólise enzimática).
Pesquisas brasileiras são destaque
O diretor executivo da Agência Internacional de Energia (AIE), Richard Jones, divulgou dados do relatório anual da entidade sobre o estado atual da economia de energia mundial e as possibilidades para o futuro. Segundo ele, a tendência atual de uso dos combustíveis fósseis é “insustentável” tanto do ponto de vista ambiental como do econômico e social.
“A má notícia do relatório é que a utilização mundial de gás, carvão e petróleo continuará aumentando, assim como as emissões de gases de efeito estufa provenientes desses combustíveis. O resultado poderá levar a um aumento na temperatura global de cerca de 6ºC nas próximas décadas”, disse o diplomata norte-americano, que foi embaixador dos Estados Unidos em Israel, Kuait, Cazaquistão e Líbano.
Esse crescimento do uso e das emissões pode ser evitado, na opinião de Jones, por meio de um esforço conjunto mundial que busque uma economia baseada na diversificação das fontes de energia, melhorando não apenas a eficiência das já existentes como também criando tecnologias novas, especialmente no setor dos biocombustíveis, devido à sua representatividade crescente nos transportes.
“Estima-se que a utilização dos biocombustíveis no setor de transportes cresçerá dos atuais 1,5% para cerca de 8% em 2030. A previsão para 2050 é de 26% de participação. Sabemos que o potencial de crescimento dos biocombustíveis é ainda maior e as pesquisas brasileiras com o etanol de cana-de-açúcar têm mostrado isso”, destacou.
O petróleo responde por cerca de 99% do consumo de energia pransporte rodoviário no mundo e, segundo projeções da Agência Internacional de Energia, a demanda energética nesse setor poderá crescer até 38% nos próximos 20 anos.
O especialista em bioenergia do Imperial College London, Richard Murphy, falou sobre um importante caminho a ser trilhado se o destino final é ter um futuro seguro do ponto de vista energético em nível global. “Primeiro, os países precisam ter certeza de que os biocombustíveis produzidos irão de fato mitigar as emissões dos gases de efeito estufa, de modo a estancar as alterações climáticas”, alertou.
“Há várias formas corretas de garantir isso, como o investimento em pesquisa e desenvolvimento e a criação de políticas públicas que permitam a drástica diminuição de gases estufa em comparação aos combustíveis fósseis”, disse.
Murphy ressalta que o Reino Unido não tem capacidade instalada para cultivar toda a biomassa necessária para garantir o desenvolvimento limpo da frota de veículos do país.
“Vamos depender muito do restante do mundo para a compra de biocombustíveis. Gostaríamos de ser parceiros de outros países no desenvolvimento de alternativas energéticas”, disse o também membro do grupo de trabalho do Plano de Pesquisa sobre Bioenergia do Reino Unido.
(Por Thiago Romero, Agência Fapesp, 19/11/2008)