O município de Pai Pedro, no Norte de Minas Gerais, a 487 quilômetros de Belo Horizonte, é um exemplar típico dos efeitos perversos na região da combinação entre estiagem prolongada, pobreza e falta de alternativas de geração de renda.
Enquanto recebem água potável unicamente de caminhões pipa do Exército brasileiro desde abril deste ano, moradores da zona rural – que representam 72,7% dos cerca de 6 mil habitantes - revelam como é dura a vida em um dos municípios do estado com mais baixo Índice de Desenvolvimento Humano - 0,575, segundo o Atlas Pnud (2000) .
“As águas passadas já produziram pouco e a cada ano menos. A gente planta, mas não colhe de acordo, porque a chuva não dá para vingar tudo”, afirmou à Agência Brasil Tito Borges, 43 anos, dono de uma pequena propriedade ao longo da estrada de terra de 26 quilômetros que liga Pai Pedro à Rodovia MGT 122.
“Planto milho e feijão, mas uns 50% foi embora”, diz Tito Borges sobre os efeitos da estiagem que chegou ao fim nesta semana.
Ciente da necessidade de armazenar água para a próxima seca, Borges montou uma cisterna e caixas de captação com apoio do Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas (Idene). Mas essa água só serve para cozinhar e lavar. Os caminhões pipa passam uma vez por semana e deixam em média 20 litros de água tratada por morador.
“Quando a água vai ficando pouca, em vez de beber um copo cheio, a gente bebe só metade”, conta. Mas a maior mazela local, segundo ele, é mesmo o desemprego. “Falta emprego e os agricultores não têm condições de preparar uma roça, comprar sementes. Fica difícil”.
Borges não revela a renda mensal, completada como “ trabalhinhos lá fora”, mas garante que “tira pouco”. “Numa crise dessas, quase ninguém tem condição de pagar um dia de serviço. Trabalha quando dá. Um mês trabalha, depois passa dois ou três sem serviço”.
Alguns quilômetros a frente, Fernando Ribeiro 41 anos, acabava de receber a visita do caminhão pipa. Na conversa, logo de cara, o lamento de que nos últimos 15 anos se tornaram comuns secas anuais de oito a dez meses.
“Todo ano é uma calamidade. Se fizer um dívida no banco para plantar roça, depois não tem como pagar”. Na seca, segundo ele, vive com R$ 150 por mês porque “não aparece na roça um que pague por cinco dias de serviço de alguém”.
A próxima parada do caminhão pipa é na casa de Bernaldina Costa, 49 anos. O banho, segundo ela, é com água de poço que resseca a pele. A crença em dias melhores vem da esperança de que “Deus mande muita chuva para nós”. Os quatro filhos foram embora para o interior de São Paulo para tentar sobreviver. “O sonho deles é voltar para aqui. Minha filha ligou e me falou: mãe, arruma um emprego aí para mim. Eu respondi: do quê? Se eu achasse um eu tava dentro”, lamentou.
Ela acusa a administração municipal de só beneficiar os aliados políticos do prefeito: “As coisas só chegam para quem é amigo do prefeito. Não tive Bolsa-Família nem auxílio de safra perdida”.
O prefeito José Geraldo Rodrigues estava em viagem para Janaúba. Em entrevista por telefone, ele reconheceu que o único gerador de emprego na cidade é a Prefeitura. “Quem não é empregado da Prefeitura, fica mesmo sem opção”.
A atração de pequenas indústrias, uma possível solução, só será viável, segundo o prefeito, quando for concluída a ligação asfáltica da cidade com a rodovia MGT 122 - obra com recursos já previsto pelo governo de Minas – e quando houver melhora no sistema de abastecimento e tratamento de água.
Pai Pedro foi emancipada de Porteirinha em 1995. Rodrigues justifica o baixo IDH com a existência de comunidades quilombolas a 60 quilômetros da sede do município, onde pessoas vivem em barracões de madeira e barro. O prefeito garante entretanto, que serão construídas no próximo ano 43 moradias populares para essas pessoas, com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento.
Rodrigues rechaça a acusação de favorecer aliados políticos nos programas assistenciais. “Não perco meu tem com essas coisinhas pequenas”, comenta e informa que 600 famílias do município são beneficiárias do Bolsa Família.
A agente municipal de saúde Augusta Regiane Gomes, 26 anos, conta que se depara diariamente com situações críticas de pobreza na zona rural. “A gente chega nas casas e tem pessoas que nos falam não ter comida nem para dar aos filhos. Crianças de 12 a 15 anos já são mães”.
O sonho de Augusta, que faz faculdade em uma cidade vizinha, é ter condições financeiras para ir embora do município e levar os pais. Mas o pai dela, Augusto Pinto, 70 anos, há 28 em Pai Pedro, dono de uma pensão no local e com mais sete filhos, nem admite pensar na hipótese. “Tô sossegado e não vou largar o pouco que tenho para arriscar fora”.
(Por Marco Antônio Soalheiro, Agência Brasil, 14/11/2008)