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proteção da vida marinha
2008-11-14

A salmonicultura está devastando os oceanos. Uma coalizão internacional integrada por cientistas, aborígines canadenses e operadores turísticos exige uma moratória mundial para esta prática. “Vimos um colapso regional de toda a vida marinha nos 20 anos transcorridos desde que foram instaladas as fazendas de salmão”, disse Bob Chamberlin, da Primeira Nação Canadense dos Kwicksutaineuk Ah-kwa-mish, na província canadense de Columbia Britânica. “Só posso sacudir a cabeça com perplexidade diante do fato de se permitir que isto continue”, afirmou Chamberlin à IPS desde a ilha de Gilford, no arquipélago de Brouthton, onde operam 20 estabelecimentos salmoneiros.

Os estudos científicos vinculam as graves reduções nas populações de salmão silvestre na Columbia Britânica com as doenças e os parasitas que se originam nas fazendas salmoneiras em oceano aberto. No Chile, milhões de salmões não nativos escapam dos criadouros feitos com redes e se convertem em espécies invasoras, transformando a ecologia dos sistemas fluviais locais. Estas e outras práticas insustentáveis violam o Código de Conduta para a Pesca Responsável, da Organização das Nações Unidas, diz uma coalizão integrada por Canadá, Chile, Escócia, Irlanda e Noruega, que apresentou uma declaração internacional junto à ONU exigindo uma moratória global.

Não existe um debate real sobre os efeitos da aqüicultura dedicada ao salmão. São necessários três quilos ou mais deste peixe silvestre para produzir um quilo de salmão em criadouro. Habitualmente, os fundos oceânicos sob e em volta das redes em oceano aberto carecem totalmente de vida, enterrada sob os excrementos de ate um milhão de salmões. “As ‘sombras’ das criações podem se estender por três ou quatro quilômetros, dependendo da corrente”, disse Wolfram Heise, diretor do programa de conservação marinha na Fundação Pumalín, uma iniciativa de conservação privada no Chile.

Estas sombras são zonas mortas onde não há nada mais além de lodo e fezes ao longo do fundo oceânico. “Os níveis de oxigênio na água estão tão esgotados que às vezes isto obriga os estabelecimentos a mudarem de lugar”, disse Heise à IPS desde Puerto Varas, mil quilômetros ao sul de Santiago. No Chile custa apenas US$ 100 alugar outra concessão de fazenda salmoneira que dê aos proprietários, principalmente noruegueses, um controle indefinido sobre a região, incluído o leito marinho. Em menos de 15 anos, o Chile se converteu no maior produtor mundial de salmão, com cerca de 700 estabelecimentos, afirmou.

Quase todos os salmões atlânticos criados ali são vendidos para alimentar apetites de japoneses, norte-americanos e europeus. Mas os verdadeiros custos destas fazendas industriais flutuantes são ignorados pela indústria e pelo governo chileno e desconhecidos do público, disse Heise. Como ocorre nas fazendas industriais em terra, onde se cria muitos animais em espaços reduzidos, aos peixes é dada fortes doses de antibióticos e hormônios. Apesar disto, um potente vírus arrasou os criadouros do Chile no ano passado, reduzindo a produção pela metade.

Incapazes de deter a epidemia, os estabelecimentos simplesmente se mudaram para outros lugares, a centenas de quilômetros de distância, abandonando seus empregados locais e também as águas contaminadas, bem como o leito marinho. “Aqui não há nenhuma pesquisa para ver se o vírus está tendo um impacto sobre as espécies marinhas”, ressaltou Heise. No Chile não existe salmão nativo, mas Heise disse que foram encontrados alguns peixes costeiros com sintomas semelhantes ao vírus da anemia infecciosa dos salmões. “Seria surpreendente o vírus não afetar outras espécies”, disse à IPS.

Milhões de salmões escaparam do Chile e estão comendo outras espécies. Começaram a invadir rios e lagos, tão distantes quando os da vizinha Argentina, onde não há fazendas de salmão. De novo, há pouca pesquisa sobre os impactos da fuga de salmões e a indústria nega que exista um problema, afirmou Heise. Os salmões se converteram no segundo produto de exportação do Chile. O governo vê isto como uma “maquina de fazer dinheiro”, e o crescimento econômico tem prioridade sobre os demais, acrescentou, ressaltando que “ninguém mede os impactos coletivos, os enormes danos” causados.

Na costa oeste do Canadá, cientistas vincularam a redução das reservas de salmão com os mais de cem criadouros da região. Após publicar sua pesquisa na prestigiosa revista Science, os biólogos marinhos alertaram que uma espécie de salmão silvestre se extinguirá ate 2011, por causa da infestação de parasitas que tem origem nos estabelecimentos que criam salmão. Mais de 80% do salmão rosado produzido anualmente no arquipélago de Broughton, 300 quilômetros ao norte da cidade de Vancouver, morreram por causa destes parasitas desde 2001.

As fazendas salmoneiras “são como um câncer, destruindo o ecossistema em que se encontram”, disse Alexandra Morton, bióloga canadense que fez boa parte das pesquisas sobre os impactos da indústria. A costa noroeste da América do Norte é o lar de varias espécies de salmão silvestre que constituem uma das maravilhas naturais do mundo e são uma parte-chave do ecossistema costeiro. Após passar dois anos ou mais se alimentando em oceano aberto, regressam às suas correntes e rios natais para desovar e morrer.

Muitas espécies, como águias, ursos e lobos, se alimentam dos salmões agonizantes ou mortos. Também levam grandes quantidades de carcaças de salmão para as florestas, que se decompõem, enriquecendo o solo e servindo de alimento para muitas plantas, incluindo os gigantes cedros vermelhos e os abetos de Sitka da região. Foram encontrados nutrientes do salmão dentro das folhas situadas nas copas das arvores de dois mil anos. “O turismo de floresta na Columbia Britânica vale US$ 1,6 bilhão anuais, e o salmão silvestre age contra tudo isto”, disse Morton em uma entrevista. O salmão produto da aqüicultura vale menos de US$ 500 milhões no Canadá, e é dominado por empresas norueguesas.

A indústria está matando o componente crucial das florestas da Columbia Britânica, que poderia ser uma das maiores fontes de proteínas se administrada de maneira adequada, disse Morton. “A costa oeste poderia produzir grandes quantidades de peixes, como já fez algum dia”, acrescentou. Há aproximadamente um ano, um informe do governo da Columbia Britânica recomendou passar aos sistemas de contensão fechada para a criação de salmões, mas a indústria se opôs duramente. As empresas norueguesas dominam a multimilionária indústria, e a Noruega possui grandes operações nessa província.

Entretanto, os poucos sistemas fluviais com salmões silvestres que restam na Noruega são rigidamente protegidos, e as operações de aqüicultura são localizadas bem longe, ao contrário do Canadá. “Eles entraram em meu território e negaram, adiaram, nos distraíram de verdade por 20 anos, sem consideração por seu impacto sobre o meio ambiente e sobre meu povo”, disse Bob Chamberlin. Este e outros líderes nativos tentaram por vários anos conseguir que empresas norueguesas como Marine Harvest, principal companhia mundial de produtos do mar, passasse a um sistema de contenção fechada, sem sucesso.

Marine Harvest produziu 340 mil toneladas de salmão em 2007 e reconheceu muitos destes problemas. Em abril deste ano, a companhia concordou em trabalhar como Fundo Mundial para a Natureza (WWF) para encontrar maneiras a fim de reduzir seu impacto ambiental. “É muito pedir que firmas com Marine Harvest protejam nosso meio ambiente?”, perguntou José  Villalón, por muito tempo gerente dessa companhia e que no ano passado uniu-se à WWF como diretor de seu programa de aqüicultura.

(Por Stephen Leahy, IPS, Envolverde, 13/11/2008)


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