O relatório Panorama Mundial de Energia, lançado ontem (12/11) pela Agência Internacional de Energia (AIE), perdeu a grande chance de dar ao mundo as coordenadas corretas para enfrentar as mudanças climáticas e seus catastróficos impactos. Prevendo mais consumo de combustível fóssil do que o planeta pode suportar, além de promover tecnologias equivocadas como a captura e armazenamento de carbono e a energia nuclear, a AIE deu as respostas erradas ao problema.
"O relatório da AIE não vê limitação dos recursos de petróleo e gás para as próximas décadas, mas há um outro recurso que tem limite - o clima do mundo. A AIE produziu um exemplo do que não deve ser feito. Não devemos investir em novas explorações de combustível fóssil e infra-estrutura de produção, mas em energia renovável e no uso inteligente de energia", afirma Sven Teske, especialista em energia do Greenpeace Internacional.
O Greenpeace apresentou ao mundo, em outubro, um cenário muito mais incisivo no combate às mudanças climáticas. A mais recente versão do relatório [R]evolução Energética: Perspectivas para uma Energia Global Sustentável, elaborado em conjunto com o Conselho Europeu de Energia Renovável, mostra como a energia renovável, combinada à uma maior eficiência energética, pode reduzir as emissões mundiais de CO2 das 28 bilhões de toneladas de hoje para 20,9 bilhões em 2030 - metade das emissões do cenário de referência da AIE no mesmo ano.
Com as mesmas previsões de crescimento econômico, custos de combustível e desenvolvimento da população que as da AIE, o cenário do Greenpeace também inclui projeções de longo prazo, até 2050 - com um corte de 50% das emissões de CO2 e a total eliminação do combustível fóssil em 2090.
Ainda que o cenário da IEA incorpore projeções de estabilização de emissões em 2030, o potencial de energias renováveis e eficiência energética foi mais uma vez subestimado. A participação da energia eólica no novo relatório da AIE continua pouco representada, apesar de ser mais alta em relação à edição anterior. Já o papel dos painéis fotovoltaicos e da energia solar concentrada foi quase negligenciado.
“O cenário [R]evolução Energética indica que, no Brasil, as energias renováveis somadas às medidas de eficiência energética podem fornecer 88% da energia da matriz elétrica em 2050 - as energias eólica e solar somadas poderão contribir com 24% da energia total. No final das contas, a redução de gastos com termelétricas fósseis e nucleares resulta em energia mais barata e menos poluente para o país", afirma Ricardo Baitelo, coordenador da campanha de Energia Renovável do Greenpeace Brasil.
Pontos chaves
Apesar de não existir, atualmente, termelétricas usando comercialmente a tecnologia de captura e armazenamento de carbono, a AIE acredita que a cada mês, entre hoje e 2030, duas ou três usinas passarão a usar a tecnologia. O papel da energia nuclear no cenário alternativo da AIE é igualmente irrealístico, exigindo a entrada de uma nova usina nuclear à matriz energética a cada mês, até 2030, um volume bem além da capacidade da indústria nuclear.
"O caminho da energia renovável é bom tanto para o planeta como para a economia. O cenário da AIE prevê investimentos de US$ 13,6 trilhões no setor energético até 2030. Em comparação, o cenário do Greenpeace custa apenas 8% mais, mas economiza mais de US$ 18 trilhões em custos de combustível", acrescenta Teske.
Para ilustrar o que uma revolução energética significa, o Greenpeace abriu hoje uma estação de salvamento climático na Polônia, para incentivar o governo local a abandonar o carvão. Em outubro, o Greenpeace Polônia lançou sua versão do cenário [R]evolução Energética, mostrando que o país não precisa basear sua produção energética em carvão. O relatório ilustra como, até 2050, a Polônia será capaz de gerar 80% de sua eletricidade a partir de fontes renováveis, como vento e sol.
Diferenças básicas entre os dois relatórios:
* O cenário mais ambicioso da AIE revela um pico de emissões em 2020 (450 ppm). O cenário do relatório [R]evolução Energética prevê o pico em 2015, data considerada pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da ONU, como necessária para se evitar as mudanças climáticas.
* Segundo a AIE, as emissões do uso de energia seriam de 25,7 gigatoneladas por ano em 2030. O cenário do Greenpeace reduz em mais 20% essas emissões, para 20,9 gigatoneladas por ano, quase a metade das atuais emissões.
* A AIE se baseia em tecnologias insustentáveis como energia nuclear e captura e armazenamento de carbono. A [R]evolução Energética não conta com a energia nuclear e só incorpora tecnologias que se provaram eficientes.
* Os dois relatórios, da AIE e do Greenpeace, trazem cenários parecidos de demanda por energia para geração de eletricidade, mas o relatório [R]evolução Energética mostra que a demanda energética para aquecimento, transporte e setores da indústria podem ser 13,2% mais baixa.
(Greenpeace, 12/11/2008)