Clima, radiação solar e cultura. Na China, o ritmo das monções (sistema climático que transporta calor e umidade por sobre uma das regiões mais populosas do planeta) ajudou até a derrubar algumas poderosas dinastias, mostra estudo publicado na revista "Science".
Os dados da intensidade dos períodos de seca e de chuva foram obtidos para um intervalo de tempo correspondente aos últimos 1.810 anos. As informações químicas estavam registradas em uma rara estalagmite (formação calcária que se deposita lentamente) na caverna Wanxiang, no norte do país.
A concentração de dois tipos de átomo de oxigênio na estalagmite varia de acordo com o clima --se mais seco ou mais chuvoso. Como o calcário se deposita em camadas nessa rocha com o passar dos anos, é possível saber, ao analisar sua composição, como períodos de estiagem e de chuvas se sucederam ao longo da história.
Os resultados do estudo, feito por chineses e americanos, revelam três intervalos onde as monções foram anormalmente fracas --o que resultou em períodos de estiagem. As primeiras grandes secas, no período estudado, ocorreram entre os anos 850 e 940. O segundo intervalo foi entre 1350 e 1380. As últimas alterações climáticas bem marcadas dataram de 1580 a 1640.
Durante essas três grandes secas, indica o estudo, ocorreram mudanças importantes na história política da China. As seis primeiras décadas do primeiro intervalo seco coincide com o fim da dinastia Tang. Em meados do século 14 começou a decadência da dinastia Yuan. E, na virada do século 16, quem deixou o poder foi a importante dinastia Ming.
O clima, defendem os autores, teve um papel importante em todas essas mudanças. "Mas é claro que outros fatores também pesaram", disse à Folha Hai Cheng, geólogo da Universidade de Minnesota (EUA) e co-autor da pesquisa. No mesmo período em que a seca prejudicava as ambições políticas da dinastia Tang, no século 9º, do lado de cá, no centro do continente americano, os maias declinavam.
A correlação também é positiva com as informações já processadas sobre as épocas de retração e aumento da quantidade de neve sobre os Alpes suíços. "Essa é uma relação bastante clara", afirmam os autores. No período em que as monções de verão na Ásia foram mais fracas, as geleiras nos montes europeus avançaram. A recíproca, neste caso, também é verdadeira.
Mais água no arroz
As concentrações de isótopos (tipos diferentes) de oxigênio também revelam períodos onde o clima favoreceu a dinastia que estava no comando do território chinês. Isso ocorreu, principalmente, entre 960 e 1020. Com mais chuva, o cultivo do arroz prosperou, a população aumentou e a estabilidade no poder, controlado pela dinastia Song, foi total, disse Cheng.
Apesar da relação positiva entre as monções e a política, os dados analisados a partir dos anos 1960 do século passado não batem com todo o restante da série histórica. Ou seja, a alteração das monções não é explicada pela variabilidade natural do clima de forma direta. "O enfraquecimento das monções neste último período pode ser resultado de forças antropogênicas [aquecimento global]", diz Cheng. A questão, agora, é saber se isso terá conseqüências políticas.
(Por EDUARDO GERAQUE, Folha de S.Paulo, 07/11/2008)