Mas promessa de Obama de reduzir emissões de gases esbarra em atraso americano após anos de negação da mudança climática
Especialistas elogiam as iniciativas que devem ainda reduzir a dependência de petróleo, mas não esperam grande mudança em 2009
Ao mencionar o desafio de "um planeta em perigo" como uma de suas prioridades no discurso de vitória da última terça-feira, Barack Obama deixou claro que acabou a era da negação da mudança climática global na Casa Branca.
No entanto oito anos de inação durante o governo Clinton e mais oito de franco retrocesso nessa área sob George W. Bush tornaram virtualmente impossível para os EUA cumprirem uma agenda ambiciosa de redução de emissões de gases-estufa na próxima década.
Isso significa que as políticas de clima e energia de Obama, por melhores que sejam, ainda estarão distantes do corte real de emissões necessário para livrar o mundo de um aquecimento maior do que 2C -potencialmente catastrófico- ao longo do século 21.
Pelo Protocolo de Kyoto, rejeitado por Bush, os EUA deveriam cortar 7% de suas emissões em relação aos níveis de 1990 até 2012. Nos últimos anos, no entanto, as emissões do país cresceram 14%. Hoje, a proposta mais radical em debate no Congresso, a chamada lei Lieberman/Warner/Boxer, fala em devolver as emissões ao nível de 1990 em 2020.
"Eu não esperaria uma lei final mais ambiciosa que essa", disse à Folha Elliot Diringer, do Centro Pew para Mudança Global do Clima e ex-porta-voz de Bill Clinton. "Esses números tampouco casam com a meta da União Européia, de 20% de redução abaixo do nível de 1990 em 2020."
Diringer e outros especialistas, no entanto, concordam que o sinal político dado por Obama para as negociações internacionais deve quebrar o impasse na construção de um acordo que amplie e substitua Kyoto após o fim de sua primeira fase, em 2012.
Mesmo assim, diz, uma legislação definitiva no tema dificilmente sairá em 2009 -razão pela qual afirma ser improvável um acordo internacional substancial no ano que vem.
Liderança
"Com Obama eleito, minha esperança é que os EUA possam assumir um papel de liderança", disse o holandês Yvo de Boer, secretário-executivo da Convenção do Clima da ONU.
Obama angariou simpatia entre os ambientalistas e os líderes europeus ao prometer na campanha reduzir as emissões americanas "na quantidade que os cientistas dizem que é necessária": em 80% abaixo dos níveis de 1990 até 2050.
Para isso, quer colocar em vigor um esquema de comércio de emissões no qual as empresas ganham cotas de emissão anuais. Quem excedê-la leva uma multa pesada; quem ficar abaixo ganha o direito de vender créditos de carbono.
Mas o principal público do discurso de Obama na área de ambiente e energia é interno: uma de suas principais propostas é apelidada de "New Deal verde", que consiste em investir US$ 150 bilhões na criação de 5 milhões de empregos na área de energia limpa.
Outra promessa é economizar em petróleo, em dez anos, o equivalente àquilo que os EUA importam do Oriente Médio e da Venezuela: 4,3 milhões de barris por dia. O último corte dessa dimensão foi no choque do petróleo de 1973.
Obama espera assim matar de uma vez os três maiores coelhos de seu governo: tirar o país da crise econômica estimulando um setor no qual os EUA são competitivos (a indústria de base tecnológica), solucionar a crise do clima e livrar o país de sua assumida dependência de combustíveis sujos, que direta ou indiretamente o levou à lama do Iraque e do Afeganistão.
(Por CLAUDIO ANGELO, Folha de S. Paulo, 09/11/2008)