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dengue
2008-11-03
País é campeão de casos nas três Américas por falta de política efetiva

Décadas de políticas descontinuadas de prevenção e erradicação do mosquito Aedes Aegypti levaram o Brasil a ocupar uma posição desonrosa no ranking da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) que acompanha os casos de dengue no continente. O país é responsável por nada menos que 81,7% de todos os casos da doença registrados nas três Américas, de acordo com o organismo. E até 29 de setembro deste ano, já havia contabilizado 472.997 casos clínicos de dengue tipo 1, 2 e 3.

O prenúncio de epidemia da doença em 20 das 27 Unidades da Federação no verão de 2009 deixou o governo federal em estado de alerta. Os ministérios da Saúde e da Defesa devem começar no início de novembro a treinar soldados das Forças Armadas para atuar de forma emergencial no combate à dengue e atendimento a doentes no Rio, São Paulo, Minas Gerais, Sergipe, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Ceará, Pará, Alagoas, Bahia, Rondônia e Goiás – Estados apontados pelo Levantamento de Índices Rápidos (LIRAa) do Ministério da Saúde com alto potencial para surtos de grandes proporções da doença. As epidemias devem ocorrer justo no período de organização administrativa das prefeituras empossadas em 2009.

– Infelizmente podemos esperar uma epidemia de dengue no Rio de Janeiro – alerta Roberto Medronho. – É a crônica da epidemia anunciada. Na capital ela não será de grande magnitude, o que não é motivo para comemorar. Afinal, não será pior porque as pessoas já estão imunizadas porque tiveram a doença. Mas na Baixada Fluminense, no Norte e no Sul do Estado, haverá epidemia.

– O problema é que governos sucessivos das três esferas públicas, União, Estados e municípios, têm falhado continuamente no estabelecimento de uma política contínua de erradicação do vetor da dengue e na capacitação de profissionais do atendimento primário de saúde para diagnosticar e oferecer o tratamento correto aos doentes – afirma o infectologista e consultor da Organização Mundial da Saúde (OMS) para dengue, Ivo Castelo Branco.

Professor do núcleo de Medicina Tropical da Universidade Federal do Ceará, Castelo Branco reconhece que ainda não é conhecido um método eficaz de combate ao mosquito da dengue em sua fase de ovo, o que normalmente seria ponto de partida para qualquer política pública de erradicação do Aedes Aegypti. Os ovos do mosquito são depositados em paredes de reservatórios de água ou em qualquer superfície que possa ser alagada e podem durar meses até serem submersos. Então, em apenas sete dias as larvas nascem, já infectadas.

Para piorar a situação, basta que 1% dos domicílios de um bairro contenham larvas do Aedes Aegypti para que uma epidemia se instale. Normalmente, observa Castelo Branco, as campanhas mais bem-sucedidas de fiscalização não conseguem entrar em ao menos 2% das casas

– Isso quer dizer que campanhas emergenciais lançadas às vésperas da estação das chuvas pouco podem fazer para evitar uma epidemia. Quaisquer que sejam as medidas adotadas, elas devem acontecer muito antes do período crítico da doença. Também não adianta ter governos federal, estaduais e prefeituras se digladiando entre si sobre a quem cabe a responsabilidade sobre o combate à dengue – critica o especialista.

– Estamos diante de um organismo adaptável e bem sucedido na escala evolutiva. Não se fazer de seu combate algo eventual.

Doença democrática, que atinge pobres e ricos, a dengue recebe 70% do Teto Financeiro de Vigilância em Saúde, de acordo com o Ministério da Saúde. O recurso passado para os municípios usarem em ações de prevenção de todas as doenças transmissíveis por vetores e imunopreviníveis. Em 2008, foram R$ 612,2 milhões. Na semana retrasada, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, anunciou o investimento de R$ 1,08 bilhão para combater a dengue a partir do próximo verão. Na opinião dos especialistas, os recursos são bons, mas chegaram tarde.

– Veremos o resultado desses repasses só no verão 2009/2010 – acredita Medronho. – É só imaginar: os municípios receberão os recursos, mas os secretários ainda terão que fazer as licitações. Aí já passou o verão. Segundo o ministério, apesar dos recursos só serem liberados agora, o trabalho integrado entre ministério, estados e municípios começou em abril passado.

– Já estamos com os planos de preparação para combater a epidemia de dengue prontos – garante o secretário-adjunto de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Fabiano Pimenta. Quem não acredita que um trabalho conjunto que tem o apoio da sociedade pode dar certo, está fazendo um desserviço à nacão.

Para Pimenta, a única hipótese possível de fracasso na ação seria fruto de uma eventual descontinuidade dos trabalhos de prevenção devido a transição política.

– Mas não trabalhamos com essa hipótese – afirma.

(Por Karla Correia e Luciana Abade, Jornal do Brasil Online, 02/10/2008)

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