A maior floresta tropical do planeta Terra está em risco de desaparecer, resultado das alterações climáticas, mas, acima de tudo, devido à acção do homem que continua a desbastar milhares de quilómetros de árvores por ano. A cerca de dois meses de se assinalar os vinte anos do assassinato de Chico Mendes, o principal rosto da luta pela defesa da floresta amazónica, Ângela Mendes, filha do seringueiro brasileiro, estará em Lisboa este fim-de-semana para uma série de encontros com ambientalistas portugueses.
Um dos assuntos a ser abordado será a floresta amazónica que, de acordo com especialistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) do Brasil, pode transformar-se numa savana, tal como as existentes em África, até ao final deste século.
O aumento da temperatura média do Planeta em quatro graus, previsto pelo Painel Intergovernamental para Alterações Climáticas, irá provocar mudanças radicais nas fronteiras da floresta. O aquecimento das zonas tropicais, a consequente diminuição das chuvas e o aumento do risco de incêndios são factores de preocupação para cientistas e ambientalistas.
"A Amazónia corre o risco de savanizar. No futuro, a floresta será uma savana empobrecida de espécies", afirma Carlos Nobre, um dos investigadores do INPE. A floresta amazónica concentra uma em cada dez espécies vivas do planeta Terra.
A desflorestação da Amazónia, provocada pelo abate desregrado de árvores pela indústria madeireira, e o aproveitamento da área florestal para a agricultura é responsável por 18 por cento do total da área que desaparece todos anos.
Sendo um dos principais países produtores e consumidores de biocombustíveis do Mundo, o Brasil debate-se com o problema da procura cada vez mais de áreas para a plantação intensiva da cana-do-açúcar necessária para a produção de etanol. Tratando-se de um negócio mais lucrativo para os agricultores brasileiros do que a própria produção de alimentos, as áreas destinadas à cana-do-açúcar têm aumentado para prejuízo da floresta amazónica.
A solução, diz Carlos Nobre, membro do Painel Intergovernamental para Alterações Climáticas, passa "por um uso sustentável dos recursos", reconhecendo ser "muito difícil reverter o cenário actual".
DEFESA DA FLORESTA ATÉ À MORTE
Chico Mendes nasceu em Xapuri, Acre, no Brasil, em Dezembro de 1944. Só aos vinte anos aprendeu a ler e tornou-se líder sindical em 1975, como secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasileia. A luta pela defesa da floresta amazónica e das suas gentes começou em 1976 – lutou pela criação de reservas que garantissem o futuro da Amazónia. Em 1980 foi um dos co-fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT). Foi assassinado à porta de casa, em Xapuri, a 22 de Dezembro de 1988.
Correio da Manhã – Qual o impacto da desflorestação da Amazónia?
Ângela Mendes – Os impactos são muitos e variados: o aumento na emissão dos gases do efeito de estufa, destruição dos habitats de animais e plantas, escassez de géneros alimentícios. Até a monocultura para a produção de biocombustível na região amazónica é perigosa.
Que balanço faz das lutas ambientais?
As lutas são muitas, mas as conquistas são poucas. Chico Mendes defendia a criação de reservas que garantissem o futuro da Amazónia e de quem vivia dela. Sabia que a Amazónia não se poderia tornar num lugar intocável, mas também sabia que o desmatamento avançava a passos largos e que as grandes criações de gado ameaçavam não só a floresta, mas também a vida de todo o Planeta.
As reservas extractivas são uma realidade...
A floresta amazónica dá sementes, óleos, seivas, plantas medicinais que são transformadas em matéria-prima para a indústria farmacêutica, de cosmética ou de perfumes. Também se retira matéria-prima para artesanato e joalharia. Só falta olhar a Amazónia com olhos de quem a ama e vê nela vida e alegria.
SECA
Os dois grandes rios, Negro e Solimões, na Amazónia, são responsáveis por levar humidade a todo o Brasil e gerar a quantidade de chuva necessária para a floresta. O aumento da temperatura está a colocar a sua existência em risco, podendo secar até ao final do século.
(Por André Pereira, Correio da Manha, 31/10/2008)