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terremotos erupções vulcânicas seguro ambiental
2008-10-31

O mercado financeiro e as empresas em geral têm com quem aprender a calcular adequadamente o risco climático. As grandes seguradoras têm sido tão fortemente afetadas por eventos naturais extremos, que esse é, hoje, componente obrigatório de seus modelos de risco. Entre os chamados desastres naturais, a maioria está relacionada à mudança climática. Os mais importantes eventos não-climáticos são os terremotos e os maremotos originados pela movimentação das placas tectônicas e as erupções vulcânicas, essas em muito menor proporção, como se vê no gráfico (veja). No primeiro semestre de 2008, por exemplo, os eventos climáticos extremos representaram 90% dos desastres no mundo.

Chamar de “desastre natural” os danos patrimoniais e humanos decorrentes de eventos naturais extremos impede que se registre, imediatamente, porque são desastres. O desastre só existe porque uma parcela de população se expôs ao risco dessas ocorrências e, em muitos casos, contribuiu para aumentar esse risco. Muitas inundações, por exemplo, são mais danosas porque cursos de rios foram alterados, criaram-se obstáculos que acabam impedindo o escoamento das águas de uma grande tempestade ou de um maremoto. Um furacão do tamanho do Katrina, em alto mar, numa região remota, sem ilhas habitadas e sem rotas marítimas, nunca será considerado um “desastre” e só será notado pelos especialistas. Esse furacão de nível 5, na escala Saffir/Simpson, que leva em consideração a velocidade do vento e a força das ondas, quando atinge uma área densamente habitada e com uma enorme quantidade de intervenções no espaço físico que amplificam seus efeitos mais danosos - inundações, desmoronamentos, explosões - vira um desastre. Estudos sobre a área de impacto do tsunami de 2004 no oceano Índico mostraram que a mata costeira, como os manguezais, amorteceram o impacto da onda gigante, fazendo com que os danos fossem significativamente menores nessas áreas, comparadas às em que não havia manguezais. Veja aqui e aqui.

O desastre não é natural. É social. Natural é o evento em si. Natural, inevitável, e relativamente imprevisível. Um risco associado a um elevado grau de incerteza. Riscos previsíveis são facilmente administráveis. As perdas podem ser minimizadas, os prêmios de seguro são menores. Um estudo da Wharton (aqui) diz que as seguradoras cobram 25% a mais de prêmio por um “risco ambíguo”, em relação a riscos com probabilidades bem especificadas.

Catástrofes custam caro
O número de eventos extremos associados ao clima está aumentando e sua intensidade também. Conseqüentemente, as perdas seguradas têm crescido fortemente. Elas triplicaram entre a década de 80 e a década de 90 do ano passado. Entre 2000 e 2006, as perdas seguradas atingiram US$ 420.6 bilhões, principalmente por causa das estações de furacões de 2004 e 2005, que foram muito ativas.

O ano de 2004 foi marcado por catástrofes “sócionaturais” como o tsunami na Ásia; os furacões Ivan, Charley, Frances e Jeanne, no Atlântico; os tufões Songda e Tokage, no Pacífico; inundações no Nepal, Índia e Bangladesh.

Mas, 2005 foi, até agora, o de maior proporção de danos e perdas nesta década, totalizando, segundo números da seguradora  Munique Re, quase US$ 100 bilhões de perdas seguradas, de um total de US$ 220 bilhões de perdas totais. Foi a estação mais devastadora de furacões, marcada por grandes tempestades: Katrina, Rita, Stan, Wilma,  e Denis, no Atlântico. Na Europa, a tempestade de inverno Irwin, causou danos enormes. Além disso, houve mais enchentes na Índia; secas e onda de calor na Espanha, França, Portugal e Itália; terremotos no Paquistão, na Índia e no Afeganistão.

Como esses eventos são imprevisíveis em sua freqüência e intensidade, 2006 foi um ano relativamente tranqüilo. No Atlântico, não houve furacões de alto impacto, embora no Pacífico, tenha havido uma estação mais ativa de tufões. Foram cinco: Shanshan, Bilis, Chanchu, Durian, Saomai e um ciclone, o Larry, na Austrália. Em 2007, houve mais danos, apesar de uma estação de furacões também menos ativa. Houve dois ciclones de maior intensidade, Gonu, em Oman e no Irã e o Sidr, na Índia. Mas a tempestade de inverno Kyrill, na Europa, provocou danos consideráveis, além de terremotos no Japão, queimadas, tempestades de inverno e tornados no EUA, inundações no Reino Unido, na China e no México. Em 2008, as perdas já ultrapassaram as de 2007, com o terremoto em Sichuan, na China e o ciclone em Myanmar. No EUA, houve um número recorde de tornados registrados em um semestre, tempestades severas, inundações no Mississipi, sete furacões, entre eles, Dolly, Gustav, Hanna e o maior furacão em extensão da história, o Ike que, embora não tenha passado do nível 4 na escala Saffir/Simpson, chegou a ter 885 quilômetros de diâmetro. Todos esses dados podem ser encontrados no site da Munique Re, no “NatCat Service”.

Políticas corporativas para o clima
Para a indústria seguradora, a mudança climática já é um dado de realidade. Não é de espantar que todas as grandes empresas do setor se dediquem seriamente ao tema da mudança climática, não apenas incorporando-o a seus modelos de risco, mas fazendo estudos e apoiando estratégias e políticas que permitam minimizar danos e, portanto, perdas seguradas.

A Lloyds, por exemplo, lançou o projeto Risco 360 para gerar discussão e debate sobre como gerenciar o risco no ambiente de hoje. Uma iniciativa de longo prazo, que alerta para o fato de que as alternativas presentes são “adaptar ou quebrar”. Segundo a seguradora, a freqüência e magnitude das catástrofes - especialmente aquelas relacionadas ao clima - aumentou significativamente nos últimos anos e serão exacerbadas pela mudança climática nos próximos 40 anos. Em 2050, mega-catástrofes como o Katrina se tornarão quatro vezes mais freqüentes do que no início do século. As empresas precisam se adaptar já ao aumento dos riscos de danos naturais e por isso o projeto Risco 360 tem por foco estudar tendências na freqüência de catástrofes e o que se pode fazer para antecipar e responder a essa ameaça crescente.

O grupo Allianz tem uma “Agenda para a Mudança Climática” e uma estratégia abrangente, que envolve estudos e investimentos. Como parte de de um conglomerado financeiro, investe em energias renováveis, como energia eólica, promove estudos e parcerias. A justificativa dessa estratégia é simples e pragmática: “como gestores globais de risco, nós nos preocupamos com a mudança climática porque ela afeta diretamente nossos negócios e nós temos a expertise e os meios para influenciar a maneira pela qual nós todos reagimos à mudança climática”. Para a seguradora, a agenda para ação sobre mudança climática deve: buscar informação sobre riscos climáticos futuros para melhorar a capacidade de previsão e garantia de riscos associados ao clima; controlar sua exposição a catástrofes naturais e outros riscos relacionados ao clima, desenvolvendo instrumentos mais adequados de avaliação de riscos, como zoneamento de enchentes e criando expertise em catástrofes naturais; desenvolver capacidade de gestão de risco relativo às tecnologias de baixo carbono, juntamente com seus clientes industriais, e desenvolver novos produtos de apoio à tecnologia de baixo carbono.

A Munique Re lançou, em 2005, a “Iniciativa de Seguro da Mudança Climática de Munique”, que reúne seguradores, climatologistas, economistas e organizações independentes (ONGs), com o objetivo de desenvolver soluções do ponto de vista securitário para as perdas crescentes decorrentes de eventos extremos relacionados ao clima. O grupo estabeleceu uma parceria com a London School of Economics para quantificar os custos do aumento de catástrofes naturais relacionadas ao clima, determinar como lidar com as incertezas dos modelos climáticos, avaliar as conseqüências potenciais do mercado de créditos de carbono e as melhores alternativas para sua organização e funcionamento, e estimar os impactos econômicos da mudança climática nos “BRIC”- Brasil, Rússia, Índia e China. Ela mantém, ainda, o serviço de banco de dados, NatCat.

A Swiss Re também mantém um programa abrangente relacionado à mudança climática, que vai além do desenvolvimento de produtos voltados para os eventos relativos aos extremos do clima. Mantém um banco de dados o CatNet, só para clientes, que associa estatísticas relativas a catástrofes naturais com informação sobre seguros, dados econômicos e um mapa interativo com estimativas sobre o risco climático. O programa de mudança climática da seguradora também se baseia no tripé pesquisa de risco climático, desenvolvimento de produtos e conscientização de clientes e “stakeholders”, por meio do “diálogo do risco”.

Todas essas empresas têm programas avançados de monitoramento e relatório da “pegada de carbono”. E são apenas alguns exemplos. Há várias outras, nesse segmento, com sistemas avançados de gestão de risco climático.

O futuro é de risco
As seguradoras estão aprendendo, com perdas econômicas, que o futuro é de risco crescente, que pode se tornar uma ameaça à solvência ou uma oportunidade para criar produtos ajustados à economia do século XXI. O mercado financeiro, do qual faz parte o segmento de seguros, passou anos sem considerar os alertas de risco, vivendo complacente euforia alimentada por enorme excesso de liquidez. Essa liquidez, alimentada por enormes e artificiais bolhas financeiras, chegou ao fim, os riscos se materializaram, o sistema entrou em crise global. Como argumentei aqui nas duas colunas anteriores, o sistema financeiro global sairá da crise traumatizado e muito mais sensível ao risco. Terá que rever sua atitude em relação ao risco e a seus modelos de risco, que eram excessivamente financeiros. Esses modelos levavam muito pouco em consideração os dados da economia real e as realidades do ambiente econômico físico. Ao reexaminar seus modelos de decisão, inevitavelmente, vão se deparar com o risco climático e o risco regulatório para as atividades de alto carbono, associado ao risco de tributação direta ou regulatória do carbono. Podem examinar os dados das grandes seguradoras, estudar seus modelos de risco e aprender com eles. Inclusive como não subestimar as ameaças presentes. Nenhuma grande seguradora se sente confortável com o modelos de risco hoje em uso. Todas estão investindo para avaliar melhor o risco climático, que consideram, com toda razão, ainda largamente subestimado por elas mesmas e pelas empresas em geral.

A economia de alto carbono se tornou uma economia de alto risco. A economia de baixo carbono é uma fronteira de oportunidades. Dificilmente os melhores talentos para negócios deixarão de ver essa dicotomia. Sobretudo após o traumático e longo choque de realidade e realismo que esta crise trará ao capitalismo global. Muito provavelmente haverá uma aceleração dos investimentos em tecnologias verdes e produtos de baixo carbono, inclusive em países como a China, cujo próximo Plano Qüinqüenal, tudo indica, trará diretrizes e metas para a transição para um economia de baixo carbono. As empresas industriais serão forçadas a mudar por pressão das empresas de seguro e por força da regulação climática que só tende a aumentar, com ou sem crise econômica.

Não será um processo sem contradições e sem tropeços, mas é um processo inevitável.

(Por Sérgio Abranches, OEco, 30/10/2008)


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