Fiquei em silêncio nos últimos quatro dias. Não tive ânimo para escrever sobre minha indignação quanto ao que está acontecendo nos processos de licenciamento ambiental no Brasil. Hoje não resisti.
Lá no rio Madeira as obras da usina de Santo Antônio prosseguem como se o documento da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) sobre a presença dos Índios Isolados na região, nunca tivesse existido. Quarta-feira (29/10), o Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, resolveu que pode dar uma licença “parcial” – nova modalidade - para a usina de Jirau e o Tribunal de Contas da União (TCU) soltou uma bomba em que recomenda ao governo agilizar a oferta de empreendimentos hídricos no Brasil.
Não dá para acreditar nesse “desmanche” da legislação ambiental brasileira. Não estão mais sendo respeitadas leis ambientais ou a Constituição Federal no seu artigo 225 sobre a premissa de que todos têm direito ao meio ambiente equilibrado.
E o Judiciário? Os procuradores federais e os promotores estaduais elaboram expressivas peças sobre os desmandos nos processos de licenciamento ambiental praticados por funcionários públicos como o presidente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Roberto Messias Franco. Os juízes analisam essas peças com a atenção merecida? Aliás, Messias Franco foi advertido pelo Procurador da República sobre a possibilidade de responder a um processo por improbidade administrativa se conceder a licença de instalação para a usina de Jirau, cuja localização original está sendo alterada sem a elaboração de novos estudos ambientais.
Quero acreditar que os juízes não estão com tempo suficiente para apreciar, na íntegra, as iniciais das ações civis públicas ajuizadas pelo ministério público. Deveriam fazer o julgamento justo, por exemplo, sobre as usinas do Madeira que irão interferir diretamente nas áreas de Índios Isolados e lembrar que, segundo a Constituição Federal, os empreendimentos não podem afetar terras indígenas. E, além do mais, o Congresso Nacional deve se manifestar sobre interferências em áreas indígenas. Isso está, também, na Constituição.
O Juiz Élcio Arruda, do Tribunal Regional Federal de Rondônia, deu um despacho, no caso de Jirau, onde escreveu que desconhece qualquer presença de indígenas na região das usinas do Madeira. Demonstra, com isso, ser desinformado, alheio às notícias da imprensa e aos documentos que foram produzidos sobre o assunto. Isso é Justiça? Parece que está blindado dentro
de uma espécie de “papa-móvel”.
E o outro Juiz Federal, de Mato Grosso, não deve ter tido tempo, também, para apreciar o pedido de suspensão do leilão do Sistema de Transmissão do Madeira feito pelo Procurador Federal Mario Lucio Avelar. O projeto da Linha de Transmissão que vai ser licitado, implica numa obra de 2450 quilômetros inserida num corredor de 10 quilômetros de largura, que atravessa os Estados de Rondônia, Mato Grosso, Minas Gerais e São Paulo, passa por não sei quantos municípios, terras indígenas, unidades de conservação e, pasmem, sem Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA).
Aí eu descubro uma nota técnica do Ministério Público Federal, Procuradoria Geral da República, 4ª Câmara de Coordenação e Revisão, Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, sobre licenciamento de grandes empreendimentos. Essa nota esclarece que para licitar Linhas de Transmissão tem que ter a Licença Ambiental Prévia como determina a Resolução CONAMA 006/87. Se assim não for, “evidencia o não cumprimento aos princípios do desenvolvimento sustentável claramente acolhidos pela Constituição Federal no seu artigo 225”. E a ANEEL, mesmo assim, já marcou o leilão do Sistema de Transmissão para o dia 28 de novembro. Sem Licença Prévia.
Essa crise financeira global poderia dar uma ajudazinha, fazendo faltar os R$ 100 bilhões necessários como investimento nas mega - obras desse Plano de Aceleração de Calamidades (PAC) de Dilma Rousseff . Ou iremos assistir a uma hecatombe ambiental.
(Por Telma Delgado Monteiro, Colaboração para o Ambiente JÁ, 30/11/2008)