O relatório Planeta Vivo 2008, publicação bianual da Rede WWF, mostra que, caso o modelo atual de consumo e degradação ambiental não seja superado, é possível que os recursos naturais entrem em colapso a partir de 2030, quando a demanda pelos recursos ecológicos será o dobro do que a Terra pode oferecer.
Alguns países, como os EUA e a China, demandam mais que sua biocapacidade (aquilo que seus ecossistemas são capazes de oferecer), se caracterizando como “países devedores ecológicos”. Outros, como o Brasil, por exemplo, são “países credores ecológicos”, pois ainda possuem mais recursos ecológicos do que consomem, e usualmente “exportam” sua biocapacidade para os devedores.
“Assim como a bolha financeira mundial gerou a crise econômica atual, o consumo desenfreado dos recursos naturais disponíveis no planeta pode gerar uma nova crise. Temos que ficar atentos a isso”, alerta Denise Hamú, secretária-geral do WWF-Brasil. “O Brasil precisa ter consciência da importância de conservar seus ativos ecológicos e de engajar-se no desenvolvimento de modelos de negócios inovadores e baseados em uma gestão sustentável dos recursos naturais. Temos de começar agora a enfrentar o desafio de gerenciar responsavelmente o capital natural e, ao mesmo tempo, aumentar a qualidade de vida dos cidadãos.”
Esta é a sétima edição do estudo, que traz dois indicadores da saúde da Terra. Um deles é o Índice Planeta Vivo, que reflete o estado dos ecossistemas do planeta. Baseado nas populações mundiais de 1.686 espécies de vertebrados, como peixes, aves, répteis e mamíferos, esse indicador apresentou uma redução de quase 30% em apenas 35 anos.
Em algumas áreas temperadas, não houve redução nas populações. Em compensação, a redução de 60% na região tropical mostra a urgência de conservarmos os ecossistemas e seus serviços ecológicos.
O outro índice medido no relatório Planeta Vivo é a Pegada Ecológica, que evidencia a extensão e o tipo de demanda humana por recursos naturais e sua pressão sobre os ecossistemas. A média individual mundial é de 2,7 hectares globais por ano.
O índice recomendado no relatório para que a biocapacidade do planeta seja suficiente para garantir uma vida sustentável seria de 2,1 ha/ano por pessoa. No entanto, a média brasileira por pessoa já supera este patamar e está atualmente em 2,4 ha/ano.
“Para diminuir a Pegada Ecológica do País é importante que os consumidores adotem uma postura consciente ao realizar suas compras.
Também é fundamental que as empresas façam sua parte, pensando em processos de produção, embalagem e distribuição menos impactantes. Já os governos precisam prover infra-estrutura, estabelecer marcos regulatórios e incentivos para tornar viáveis ações sustentáveis”, exemplifica Irineu Tamaio, coordenador do programa de Educação para Sociedades Sustentáveis do WWF-Brasil.
Segundo Irineu Tamaio, os astronômicos níveis de consumo atuais em algumas sociedades só são possíveis porque há pessoas consumindo menos que o necessário para ter uma vida digna em outras. Os países com mais de um milhão de habitantes que tiveram maior Pegada Ecológica foram os Emirados Árabes Unidos, os EUA, o Kuwait, a Dinamarca e a Austrália.
Segundo o relatório, o Brasil ocupa o 58º lugar em termos de consumo entre os países com mais de um milhão de habitantes. Impedir o crescimento da Pegada Ecológica e principalmente estabelecer uma padrão consistente de redução dela é uma lição de casa para a sociedade brasileira.
O crescente desmatamento de florestas no Brasil e perda da biodiversidade exemplificam bem os riscos de aumento da Pegada em conseqüência de um modelo de desenvolvimento econômico tradicional.
É preciso zerar o desmatamento na Amazônia e utilizar de forma sustentável a floresta, melhorando a qualidade de vida das populações locais. Nesse contexto são diversas as estratégias a serem adotadas, como critérios socioambientais na produção agropecuária, melhor produtividade em áreas de uso extensivo, exploração manejada dos recursos florestais e criação e implementação de áreas protegidas, além de outras medidas.
Esse momento de crise mundial é uma oportunidade de atuar decisivamente nos três fatores responsáveis pela expansão da Pegada Ecológica: crescimento populacional, consumo per capita e intensidade e forma de uso dos recursos naturais.
As soluções para conter uma possível crise ambiental são diversas e muitas se complementam. Ente elas estão a diversificação da matriz elétrica, já proposta pelo WWF-Brasil no estudo Agenda Elétrica Sustentável 2020, e o aumento dos investimentos em infra-estrutura sustentável, como a criação de modelos habitacionais baseados em um melhor uso de água, energia e solo.
Outra estratégia fundamental é incentivar os meios de transportes coletivos, tornando-os mais eficientes, menos poluentes e mais confortáveis, além de promover a conservação de áreas verdes em grandes centros urbanos.
“Não é mais possível ignorar os recursos naturais nos modelos de negócio praticados nas diferentes atividades econômicas. O capital natural é tão importante quanto o financeiro, o humano e o material envolvidos na produção de qualquer bem. Enquanto o custo de preservá-lo adequadamente não estiver incluído no preço dos produtos, estaremos caminhando rapidamente para exaurir o nosso crédito ecológico”, conclui Carlos Alberto de Mattos Scaramuzza, superintendente de Conservação de Programas Temáticos do WWF-Brasil.
(WWF-Brasil, 28/10/2008)