Em meio à crise financeira, o motivo de discórdia entre os 27 membros da União Européia (UE) nesta semana não é econômico, mas ambiental. A Itália e a Alemanha lideram o grupo de países que alertam para os custos da redução em 20% das emissões de gases do efeito estufa até 2020, com base no ano de 1990, proposta para ser adotada em dezembro.
“Os custos do plano climático da UE são irracionais”, disse o primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, ontem durante a Assembléia da União Industrial de Nápoles, na Itália. O premier propôs uma adoção gradual do pacote climático, lembrando que dez países estão a favor da Itália.
“Se a Europa e os cidadãos europeus querem dar o exemplo para todo o mundo, precisam fazer com que o preço seja pago por todos e de modo igualitário, porque não pode recair sobre a Itália 18% dos custos”, afirmou.
Segundo Berlusconi, dez países o apóiam na ameaça de vetar a proposta do plano climático da UE caso não sejam adotadas medidas para proteger a indústria italiana.
O posicionamento da Itália deu peso para o movimento de um grupo de países ex-comunistas do leste europeu, que acreditam que os cortes acabariam com a competitividade das suas indústrias movidas a carvão, ainda mais com as indicações de uma desaceleração econômica mundial para o próximo ano.
“Não podemos ser nós, que possuímos a maior economia manufatureira da Europa junto com a Alemanha, os responsáveis por assumir os custos que irão depreciar nossa economia, nosso setor automobilístico, comparado com outras economias, em um momento de crise”, disse Berlusconi.
A porta-voz da UE para assuntos de meio ambiente, Barbara Helfferich, entende que os números apresentados pela Itália para pôr em dúvida a viabilidade econômica das medidas são "exagerados". Por essa razão, uma série de reuniões técnicas bilaterais serão realizadas na próxima semana para esclarecer os custos.
Postura inesperada
Analistas e ambientalistas dizem que a mudança inesperada da Itália pegou a UE de surpresa e coloca em risco a possibilidade do bloco alcançar as metas climáticas. “Ninguém esperava ter um jogo duro com um estado europeu ocidental”, disse à Reuters o analista Simon Tilford do Centro para a Reforma Européia, de Londres.
De acordo com Tilford, isto não irá diluir a meta, mas tornará mais difícil alcançá-la. “E isto acontece mesmo antes da crise econômica ser realmente sentida”, comentou.
A ministra de Meio Ambiente italiana, Stefania Prestigiacomo, disse que pressionaria a UE para revisar a meta, mas outros ministros presentes no encontro de Bruxelas nesta semana afirmaram que ela não levantou o assunto durante as reuniões. Segundo a Reuters, isto poderia ser um sinal de que os líderes da Itália e da Europa Oriental estariam jogando com os eleitores e empresários de seus países.
Stefania, porém, argumentou que o presidente francês Nicholas Sarkosy havia assumido um “compromisso político” de que as novas medidas da UE seriam decididas por unanimidade e não por meio de votações por maioria, que normalmente são usadas – o que daria o poder de veto à Itália.
O porta-voz do Greenpeace, Mark Breddy, criticou a Itália, dizendo que Berlusconi estaria ignorando os interesses do povo para ser o centro das atenções políticas na Europa por duas semanas. “Mas a UE não é o Império Romano e ele não é o imperador”, enfatizou. Durante a reunião ministerial em Bruxelas, a ministra espanhola, Elena Espinosa, afirmou que a crise econômica não pode ser usada como pretexto para o cumprimento dos planos de reduções de emissões.
Metas de Quioto
O relatório de emissões anuais progressivas da Comissão Européia, divulgado na última semana, indica que os 15 países da UE com metas pelo Protocolo de Quioto irão alcançar a redução de 8% nas emissões de gases do efeito estufa até 2012. “As últimas projeções trazem boas notícias. Elas mostram que as ações coordenadas na Europa para alcançar as metas de Quioto estão funcionando”, disse o comissário de Meio Ambiente da UE, Stravos Dimas.
Apesar das comemorações, Dimas afirmou que este é apenas o primeiro passo e que agora o mundo precisa de um novo acordo climático internacional que incorpore os cortes ambiciosos propostos pela Europa. “Por esta razão, as medidas adicionais que os membros da UE planejam precisam ser colocadas em prática, e os pacotes de mudanças climáticas e energia da Comissão precisam ser aprovados pelo Parlamento Europeu, sem atrasos”, comentou na última quinta-feira.
(Por Paula Scheidt, CarbonoBrasil, Envolverde, 23/10/2008)
* Com informações de agências internacionais.