Convocada a escolher entre Norte e Sul, a natureza preferiu ser justa. Criou um fenômeno único no mundo, que leva água aos dois extremos do país, e o colocou no Planalto Central. Na Estação Ecológica de Águas Emendadas, uma mesma vereda abriga as nascentes dos córregos Brejinho e Veredas, que correm em direções opostas. O primeiro segue para o Rio Paraná, o outro, para o Rio Tocantins.
A reserva, localizada em Planaltina, tem 10.547 hectares de fauna e flora nativas e preserva espécies do cerrado ameaçadas de extinção. A estação conserva o habitat natural de plantas e animais, mas enfrenta a degradação das terras que a cercam. Nos arredores da unidade, há plantações de grãos, criação de gado, estradas e terrenos loteados sem infra-estrutura. Um consórcio contratado pelo GDF acaba de concluir um diagnóstico com os problemas da região e prepara um plano de manejo para coibir abusos no futuro.
“A manutenção das espécies em vida livre é barata e eficiente. Porém, isso é afetado pelo isolamento da área, a ameaça de espécies invasoras e o convívio com o homem, fogo, caça e defensivos agrícolas”, explicou a zootecnista Valéria Saracura, uma dos 13 consultores que participaram do trabalho. O primeiro impacto provocado pelo homem foi o desmatamento para ocupação urbana e agricultura. A reserva está ilhada por casas, chácaras e fazendas.
A substituição da vegetação nativa por asfalto, concreto ou mesmo plantas exóticas reduz a absorção de água pelo solo. O resultado são lençóis freáticos vazios e enxurradas nas ruas durante as chuvas. A chance de erosão aumenta. “O solo do cerrado é estável quando tem vegetação nativa. Se ela é retirada, ele se torna frágil”, afirmou o geólogo Christian Giustina, diretor da consultoria Geológica, uma das responsáveis pelo diagnóstico. A expansão de Planaltina aproxima a cidade da vegetação. As casas do bairro Estância e do Sarandi chegam perto do Córrego Fumal, que nasce na estação. No Sarandi, os muros ficam a menos de 2m do curso d’água. A água usada nas pias e chuveiros de parte do Estância cai direto no Fumal.
(Por Elisa Tecles,
Correio Braziliense, 19/10/2008)