Um insumo indispensável para a vida, mas tratado de forma absolutamente inadequada. A nada difícil conclusão veio após a mesa redonda "Água no Século XXI", que fez parte do ciclo de palestras dedicadas ao tema na sexta-feira (17), durante o Encontro Latino-Americano de Comunicação e Sustentabilidade. "Devemos pensar em todos os usos da água, que serve para a manutenção de todos os ecossistemas. Sem ela, não existe vida nenhuma, a começar da intra-uterina. Ficamos dentro d'água na barriga da nossa mãe. A água é um fator de felicidade para o ser humano", lembrou Cecy Oliveira, diretora da revista digital Águaonline.
A jornalista passou a mostrar para a platéia dados relevantes sobre a água na natureza: apenas 1% dela é doce, ou seja, adequada para o consumo de humanos, plantas e animais. Dos 99% restantes, 2% estão nas geleiras e os outros 97% é a água salgada dos mares e oceanos. Por conta da desocupação desigual, 40 países convivem com o stress hídrico. São locais em que o consumo do precioso líqüido supera em 20% sua disponibilidade.
Outro fato alarmante é que simplesmente 1/3 da população terrestre, ou cerca de 2 bilhões de pessoas, não consome água de qualidade. Em termos de América Latina, mais de 135 milhões de pessoas não têm acesso à água potável e a serviços de esgoto sanitário. E o mais triste: mais de 900 crianças morrem por hora no mundo devido a doenças causadas por falta de saneamento.
O uso da água é mais do que irracional. Calcula-se que um europeu consuma, em média, 150 litros por dia. Nos Estados Unidos, uma pessoa gasta espantosos 300 litros diários, enquanto que para a outra ponta, que tem a Índia como exemplo, sobram apenas 25 litros per capita. Na produção industrial, a situação é igualmente alarmante: uma tonelada de papel faz com que uma fábrica gaste entre 220 mil e 380 mil litros. Uma simples tonelada de cimento exige 3.500 litros de água.
A platéia de jornalistas e comunicadores engoliu em seco ao saber que 2 bilhões de pessoas bebem uma água que nenhum deles usaria para lavar o carro em casa, enquanto outros 1,2 bilhão gostariam de ter pelo menos esta água à sua disposição. A falta crônica deste elemento é uma porta aberta para a contaminação do ar, que mata 3 milhões de pessoas, seguida pela Aids (2,7 milhões) e doenças diarréicas como a cólera (2,2 milhões).
A maneira negativa como pessoas e administrações municipais enxergam a água provoca sua utilização inadequada. Quem está em casa dá valor ao insumo só quando ele falta ou quando chega a conta (alta!) no fim do mês. Na hora do passeio, o desejo é apenas de muito sol, sem levar em conta de que estiagem prolongada também não é nada bom. Para as prefeituras, rios e lagos são obstáculos ao desenvolvimento e tráfego de veículos. Nas obras de canalização, as zonas de drenagem são ignoradas e o resultado é conhecido: enchentes, derivadas de chuva abundante e sem condições de ser absorvida pelo solo.
Gestão, a grande saída
A proteção das águas da natureza de maneira sustentável é o único meio de resguardar este bem que permite a existência de vida na Terra. Para esta finalidade, as metas a serem atingidas passam pelo aumento da consciência da sociedade sobre a importância ambiental e social do insumo, difundir informações e reforçar a atuação dos Comitês de Bacia e promover o conhecimento do Sistema de Gestão de Águas.
Quando se fala em gestão hídrica, deve-se levar em consideração aspectos como a outorga (autorização do governo para uso, mediante documento onde são fixados valores, prazos e finalidade), o pré e o enquadramento em si (adequação de projeto para a melhor utilização e conservação do ecossistema) e a cobrança pelo uso (captação de recursos para prover mudanças necessárias). Devem pagar todos aqueles que captam a água diretamente de rios, lagos e poços profundos, os que usam a água para uma atividade econômica e quem lança esgotos no rio e na rede pública.
A lei brasileira estabelece que o abastecimento humano deve prevalecer sobre todos os demais usos. Quando a água começa a faltar nas casas é porque a situação atingiu um nível crítico. A gestão dos recursos hídricos é o instrumento que compatibiliza os diversos usos. Um bom exemplo é a Resolução 49/2008, do Conselho de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul, que acaba de estabelecer condicionantes para a retirada de água da Bacia do rio Gravataí, com prazo de validade até 15 de março de 2009.
As condições precárias da Bacia do Gravataí e a grande demanda de água para a agricultura, especialmente do plantio de arroz, exige um maior controle nas captações para irrigação durante a primavera e o verão em toda a região percorrida por este manancial.
O case ilustra o grande objetivo da gestão hídrica: ter água em quantidade e qualidade para todos os usos.
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(Por Mônica Paula, Agência Envolverde, 18/10/2008)
* Mônica Paula é jornalista e foi editora da Agência Estado.