Há espaço para a pauta ambiental, o que é preciso é ter boas pautas. “Dá pra vender muito bem”, afirma Eduardo Acquarone, editor dos Programas Fantástico, Profissão Repórter e criador do site Globo Amazônia da Rede Globo de Televisão. Depois de pouco mais de um mês de funcionamento, o site registrou o acesso de 30 milhões de internautas que hoje monitoram o desmatamento do bioma. A atração é o mapa interativo, atualizado até seis vezes por dia pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Acquarone conta que ele mesmo achava que a Globo não iria comprar essa briga, de denunciar o avanço da soja e da pecuária na Amazônia. Mas para sua surpresa, a empresa não só comprou a idéia – que teve o dedo de uma amiga militante do Greenpeace – como pretende ampliar os serviços do site e a cobertura ambiental no ano que vem.
Essas foram algumas das revelações da mesa redonda Sustentabilidade na Mídia, moderada pelo jornalista Vilmar Berna, no primeiro dia do Encontro Latino-Americano de Comunicação e Sustentabilidade, ontem (16/10), no hotel Jaraguá no centro de São Paulo. Acquarone relata que não foi a empresa que se opôs, mas os próprios colegas da produção que precisaram ser convencidos da importância do assunto. Ele teve que explicar o que significava questões como a invasão de soja perto de Santarém, no Pará. E Acquarone conseguiu mostrar para a equipe e montar a matéria em conjunto com o Greenpeace. Resultado: uma matéria de 10 minutos flagrando a guerra dos ambientalistas com os grandes plantadores, que simplesmente chegam no meio da floresta, desmatam e espalham sementes de soja. Segundo o Greenpeace, 40% dessa soja é exportada para Europa, serve de ração para frango confinado. O produto sai da região pelo porto da Cargill.
E toda essa história foi contada em pleno horário nobre da Globo. O jornalista, que diz não ser ambientalista, lembra que o grande problema das redações é a falta de pauta. Só se trabalha as pautas quando o resultado é garantido. E a líder de audiência está constando, pelo Ibope, que a cobertura da situação da Amazônia vale a pena, mesmo sendo muito cara. “Só o aluguel de um monomotor sai 30 mil reais”, comenta.
AvaliaçãoJá Luciano Martins Costa, editor do Observatório da Imprensa, que analisa há oito anos a cobertura de imprensa, inclusive com um programa na Rádio Cultura, Rede Brasil e Rede Inconfidência, assegura que a imprensa está muito atrasada com relação à cobertura dos temas envolvendo a sustentabilidade. Ele conta um caso citado por uma jornalista da revista Época durante um evento da área. Ela revelou que se sentia participando de movimentos de vanguarda, mas se sentina recuando 10 anos quando voltava para a redação. “Na verdade, o retrocesso é de 20, 30 anos”, acredita Martins Costa. Ele recorda dos tempos do jornal “Estado de Alerta”, quando era enxotado das vilas Natal e Socó em Cubatão, por seguranças da Petrobras. E hoje a empresa vem mostrando o que tem feito pelo bem do ambiente, comenta.
Para Martins Costa, a imprensa não percebeu a evolução dos tempos, que hoje a questão da sustentabilidade não é assunto só de ecologista. Ele entende que o jornalista precisa vivenciar mais a importância do seu papel social na sociedade. Na sua avaliação, falta na maior parte dos profissionais da imprensa uma estrutura de valores que dê significado à profissão. “Acompanhei todos os processos de modernização dos jornais de São Paulo, a troca de profissionais mais experientes por menos experientes” comenta. Como resultado, as redações ficaram dominadas pelo perfil “Yes man e Yes woman”, menos crítico. Ele conclui que os editores hoje estão mais preocupados com o status do emprego, assumindo uma posição conservadora e resistindo a discutir os sistemas.
E o jornalista que já passou pelas redações da Folha de S. Paulo, do Estadão e da Veja aponta que a própria questão da sustentabilidade vem de um longo processo, desde o pós-guerra, passando pelo Clube de Roma, que nos anos 60 propôs a discussão sobre os limites do crescimento econômico, até chegar às atuais questões do aquecimento global e da crise do sistema financeiro.
Joaquín Costanzo, Diretor da IPS para América Latina, começou sua palestra lembrando o desafio da imprensa a manter as pautas da sustentabilidade com o grande assunto do momento: a crise do mercado financeiro. E observa: antes da queda das bolsas se falava que não havia dinheiro para resolver os problemas do aquecimento global. Mas de repente, surgiram três trilhões de dólares dos governos para salvar os bancos. “Há dinheiro para algumas coisas, para outras não”, pontua.
Para Costanzo, a crise ambiental é muito grave, é preciso resolver problemas comuns entre os países. Entretanto, para isso é preciso um jornalismo que faça análise dos fatos, que tenha profundidade. “É preciso tomar partido”, ratifica, para isso é necessário informação com consciência, para haver participação. Ele entende que a realidade da imprensa entre os países da América Latina é muito parecida. São poucas famílias que detém o poder da grande mídia.
Como exemplo, ele menciona o “Terramérica”, um suplemento que é publicado em 20 diários da América Latina (veja no site http://www.envolverde.com.br, às segundas-feiras), que tem uma boa receptividade do público. “É importante a permanência da periodicidade”, complementa.
(Por Silvia Franz Marcuzzo,
Envolverde, 16/10/2008)