Na capital gaúcha, manifestação deixa 11 militantes e 1 policial feridosA Via Campesina realizou ontem manifestações em 13 Estados, para protestar contra o agronegócio e lembrar o Dia Internacional de Defesa da Soberania Alimentar. Em Porto Alegre, um confronto entre um pelotão com cerca de 350 soldados da Brigada Militar e 1,5 mil manifestantes deixou 11 militantes e um policial feridos.
Foram registrados conflitos também em Presidente Prudente, interior de São Paulo. Soldados da Polícia Militar enfrentaram com bombas de gás pimenta e balas de borracha um grupo de 400 manifestantes, quando tentavam invadir o escritório regional do Instituto de Terras do Estado (Itesp). Dois manifestantes foram atingidos e ficaram com hematomas.
Em Porto Alegre, o confronto ocorreu diante do Palácio Piratini, sede do governo gaúcho. No final da tarde, após várias manifestações pela cidade, os manifestantes, com apoio do Movimento dos Sem-Terra (MST) e da Coordenação dos Movimentos Sociais e Central Única dos Trabalhadores (CUT), decidiram se concentrar naquele local.
O confronto com os policiais começou quando estes impediram o deslocamento de caminhões de som pela área. A maioria dos feridos sofreu escoriações decorrentes de quedas, pisoteio, estilhaços e golpes de cassetetes.
Também ocorreram protestos no Paraná, Pernambuco, Ceará, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Paraíba, Mato Grosso, Maranhão, Minas Gerais, Pará e Espírito Santo. No Paraná, mulheres da Via Campesina liberaram durante algumas horas um conjunto de oito praças de pedágio, em diferentes rodovias do Estado.
Um dos principais alvos dos protestos foram as empresas estrangeiras. Na capital gaúcha, houve concentração em frente ao Supermercado Nacional, da rede americana Wall-Mart. No Recife, a loja da rede McDonald?s da Rua do Hospício, no centro, teve a entrada bloqueada durante 15 minutos por cerca de 70 manifestantes.
"Estamos aqui porque a rede McDonald?s representa o que há de pior na cultura alimentar do mundo", disse uma das manifestantes, num rápido discurso. Em oposição aos alimentos que "vêm de fora para encher as pessoas de veneno", eles distribuíram batata-doce, mandioca, fava e milho, plantados pelos sem-terra. Poucas pessoas aceitaram os alimentos .
Segundo organizadores das manifestações, empresas transnacionais como Wall-Mart, Bunge e Cargill controlam o agronegócio e são responsáveis pelas altas nos preços dos alimentos. "O modelo brasileiro privilegia o agronegócio, os grandes exportadores, os produtores de cana, soja, milho e eucalipto, enquanto a agricultura camponesa, que produz 70% dos alimentos no País, enfrenta dificuldades", disse Meffilene Silva, da coordenação nacional do MST, ligada à Via Campesina.
Ainda segundo Meffilene, as recentes altas dos preços dos alimentos, no Brasil e no mundo, estão ligadas à especulação financeira comandada por grandes grupos. "Fizemos protestos nas cidades para mostrar à sociedade o que está ocorrendo com os camponeses brasileiros, cuja cultura é cada vez mais desvalorizada."
Ela também citou dados do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), segundo os quais a cesta básica consome 52,8% do salário mínimo. Pela proposta da Via Campesina, o governo deveria dar mais assistência aos assentamentos rurais e aos pequenos produtores - que são chamados de camponeses nas entrevistas, discursos e folhetos.
ENTRAVE
Os pedágios foram atacados, segundo os manifestantes, porque constituem um entrave para para a pequena agricultura, encarecendo a produção. Ontem também foram realizadas marchas no Rio, em São Paulo, Campinas e João Pessoa.
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), 16 de outubro é o Dia Mundial da Alimentação. Para a Via Campesina é o Dia Internacional em Defesa da Soberania Alimentar.
A Via Campesina é um movimento internacional. No Brasil é formada por uma coalizão de várias organizações, encabeçadas pelo MST. Também participam Comissão Pastoral da Terra (CPT), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Pastoral da Juventude Agrária, Federação dos Estudantes de Agronomia e Movimento de Mulheres Camponesas.
(Por JOSÉ MARIA TOMAZELA, ROLDÃO ARRUDA, ANGELA LACERDA E ELDER OGLIARI,
O Estado de S. Paulo, 17/10/2008)