A recente declaração do Prêmio Nobel da Paz, Rajendra Pachauri, presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), de que as pessoas deveriam considerar comer menos carne como uma forma de combater o aquecimento global ratifica um alarme dado pela própria ONU há dois anos, com o lançamento do relatório A Grande Sombra dos Estoques Vivos: questões ambientais e opções.
O documento, assinado pela FAO, a agência da ONU para Agricultura e Alimentação, conclui que a pecuária industrial (leia-se a produção de carne, laticínios e outros produtos de origem animal em larga escala) é responsável por 18% do total de emissão de gases ligados diretamente ao aquecimento global. A porcentagem é maior do que a soma da poluição causada por todos os meios de transporte do planeta, que chega a 13%.
“Entre as opções para reduzir as mudanças climáticas, mudar a dieta é algo que deveria ser considerado”, declarou Pachauri num encontro promovido em setembro, na Inglaterra, pela organização Compaixão nas Fazendas Mundiais (CIWF, em inglês). Essa associação é a base de outro documentário, Meet the truth (Carne, a verdade, ou, num trocadilho em inglês com a pronúncia das palavras meat – carne – e meet – encontrar, conhecer – Conheça a verdade).
Meat the truth é uma produção da fundação holandesa Nicolaas G. Pierson e teve estréia mundial em maio desse ano em Londres. Aqui no Brasil, ele não deve vir tão cedo. Há um jeito de não ficar esperando sentado. Mas dá um certo trabalho. É preciso ir até o site do filme e entrar em contato com a fundação. Alguém lá então faz um login e entra com uma senha para que o filme possa ser visto pela Internet.
“A fundação já vinha pesquisando estudos que mostravam que uma dieta vegetariana se caracteriza por uma emissão menor de gases poluentes, se comparada à dieta que inclui carnes”, diz Karen Soeters, diretora de Meat the Truth. E quanto mais a gente se dava conta do quanto a pecuária industrial era impactante para o clima, mais nos perguntávamos sobre o porquê de Al Gore não ter feito nenhuma citação do assunto em seu filme Uma verdade inconveniente. Começamos a desconfiar que esta verdade talvez fosse muito inconveniente para ele”, explica Soeters, remetendo ao fato de Gore ser dono de criações de gado.
Dieta pela natureza
A fundação que produziu “Meat the truth” é uma espécie de braço científico do Partido dos Animais da Holanda, primeiro e único do mundo, e o filme é apresentado por Marianne Thieme, membro do parlamento holandês e fundadora do partido. Ao longo de pouco mais de uma hora, o filme mostra exemplos dos dados levantados pelo documento da FAO e faz uma avaliação crítica do que ele qualifica de modelo norte-americano carnívoro de dieta. Aponta também o impacto da pecuária sobre áreas naturais sendo transformadas em pastagem, com destaque para a Amazônia.
Meat the truth estima que se os hábitos de consumo não se modificarem, em 2050, quando se prevê que o planeta será habitado por 9 bilhões de pessoas, a produçnao de carne atingirá 450 bilhões de quilos de carne por ano. Há 8 anos, ela estava em 233 bilhões de quilos anuais. A redução do consumo de carne pode ser significativa, diz o filme. Se cada norte-americano substituísse a galinha por uma opção vegetariana em apenas uma refeição por semana, isso equivaleria a evitar a emissão de gás carbônico causada por 500 mil carros rodando pelo país.
“O filme não diz ‘não coma carne’. A mensagem que pretendemos passar é ‘por favor, pense em diminuir o seu consumo de carne pelo planeta e pelos animais’. Encorajar as pessoas a reduzir o consumo de carne, mesmo que seja aos poucos, é provavelmente uma estratégia mais eficiente no longo do que esperar que todos se tornem vegetarianos”, afirma Soeters, adepta do vegetarianismo, assim como os membros da fundação e do partido dos animais.
(Por Jaqueline B. Ramos*, Ambiente-se, OEco, 14/10/2008)
*Repórter em São José dos Campos (SP)