O governo de São Paulo acaba de criar três Áreas de Proteção Ambiental (APAs) ao longo de seu litoral. Chamadas APAs Marinhas Norte, Centro e Sul, elas cobrem 1,124 milhão de hectares de oceano, entre os municípios de Ubatuba e Cananéia. De acordo com os decretos da criação [entra link decreto], publicados ontem (9/10) no Diário Oficial, a partir de agora, cabe ao estado controlar a proibição da pesca predatória, aplicação de multas em casos de danos ambientais, restrição ao uso de jet-ski, atividades poluidoras e construção de casas em ilhas. Além disso, o documento inclui áreas de manguezal, permitindo maior controle sobre obras que possam drenar estes locais.
O governador José Serra ainda deixou sua assinatura em decreto que cria um Mosaico de Ilhas e Áreas Marinhas Protegidas. Um dos objetivos desta medida é limitar o acesso às ilhas, assim como hoje ocorre no arquipélago de Fernando de Noronha (PE), onde há cotas com número máximo de visitantes. Segundo o secretário de Meio Ambiente de São Paulo, Xico Graziano, a fiscalização destas áreas será facilitada pelo aumento no número de embarcações disponíveis para os trabalhos da Polícia Ambiental. Na manhã desta sexta-feira, os policiais receberam seis barcos de presente do governo do estado.
Discurso bonito, prática nem tanto
Apesar do bom tom com que as medidas foram anunciadas, a criação das áreas encontrou críticas em todo o processo. A começar pelo fato de que nem o Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) e comunidades de pescadores ficaram sabendo da criação das APAs. Eles foram pegos de surpresa quando a mídia noticiou, há quatro meses, que o governo tomaria esta medida. A partir de então, começaram vários debates sobre o texto do documento, o que provocou atraso na publicação.
Entre os pontos que ficaram sem resolução está o fato de que as áreas não são contínuas, porque há espaços reservados à navegação no entorno dos portos de Santos e São Sebastião, e que a Ilha de Alcatrazes, onde vivem animais ameaçados de extinção, ficou de fora. Sobre este ponto, o governo do estado alega que não tem controle sobre a ilha, por ela ser de propriedade da Marinha.
Estes foram alguns dos pontos questionados pela ONG Greenpeace. Para a organização, medida só será eficaz se realmente implementada. “Este é um primeiro passo de muito trabalho que vem pela frente, porque uma APA só faz sentido quando implantada. Estamos dando um voto de confiança ao governo do estado de São Paulo”, diz Leandra Gonçalves, coordenadora da campanha de Oceanos da entidade. Atualmente, apenas 0,4% dos 4,3 mil quilômetros quadrados de oceanos sob jurisdição brasileira estão protegidos em unidades de conservação.
Já para Maria Tereza Jorge Pádua, conselheira da União Internacional de Conservação da Natureza (IUCN) e colunista de O Eco, iniciativas como esta são “pura demagogia”. Dos tipos de unidades de conservação, as APAs são as menos restritivas e permitem várias atividades antrópicas. “Sou muito contra esta categoria [de UC], porque ela é um instrumento muito fraco de preservação”, diz.
Segundo ela, a fragilidade se dá porque as legislações orgânicas dos municípios se sobrepõem às restrições impostas nas UCs. Com isso, se um proprietário se sentir lesado, ele pode recorrer na justiça para conseguir usar a área como bem entender. “Mais do que tudo nas APAs terrestres, no frigir dos ovos, os proprietários podem fazer tudo o que quiserem”, argumenta.
Como o mar não pode ser de propriedade de ninguém, este aspecto melhora um pouco no caso das APAs marinhas, lembra Maria Tereza. No entanto, ela deixa de ser frágil, já que não leva em conta aspectos muito importantes para a preservação, como os “corredores marinhos”, que deveriam existir, assim como os corredores florestais que têm a função de conectar a biodiversidade local. Para ela, o melhor mesmo é que sejam criadas unidades mais restritivas, como parques e estações ecológicas.
“O governo geralmente vai fazendo [Áreas de Proteção Ambiental] porque é mais fácil e dá a falsa impressão de que há muitas UCs. Mas se você for ver, as verdadeiras são muito poucas. A grande maioria é pura demagogia”, diz. Atualmente, a única área de proteção integral marinha do estado é o Parque da Laje de Santos. No entanto, não são raros os flagrantes de pesca ilegal por ali.
(Por Cristiane Prizibisczki, OEco, 10/10/2008)