A Índia está à beira de uma crise pela falta de mecanismos seguros para manejar o lixo eletrônico. Nem mesmo há leis a respeito. A população indiana passará da geração das atuais 380 mil toneladas ao ano de lixo eletrônico para um bilhão até 2012, segundo especialistas. “E isto são apenas televisores, telefones celulares e computadores ninguém dá conta de uma ampla gama de resíduos que passam ao setor de reciclagem informal e que causam problemas sanitários e ambientais”, disse Ramapati Kumar, gerente da campanha do Greenpeace Internacional a respeito da Índia. Este país carece de leis que limitem o uso de substâncias tóxicas derivadas da fabricação de produtos eletrônicos ou que controlem sua eliminação.
Como a contaminação ocorre principalmente na fase de eliminação e reciclagem dos resíduos desta natureza, é necessária a aprovação de leis que incluam toda esta área de atividade, disse Kumar. Os aparelhos elétricos e eletrônicos contêm metais altamente tóxicos como chumbo, cádmio, dioxinas, cloro, bromo, PVC e outros, que ao serem incinerados liberam gases tóxicos. O comércio de lixo eletrônico é controlado pelo Convenio da Basiléia sobre o Controle dos Movimentos Transfronteiriços, de Dejetos Perigosos e sua Eliminação, em vigor desde 1992, que não inclui o reparo e o recondicionamento de produtos eletrônicos usados.
Toda uma “indústria artesanal” cresceu com base na retirada de substancias químicas reutilizáveis de produtos eletrônicos descartados. O processo acontece em rudimentares fundições que emitem gases tóxicos e contaminam o solo e a água. Numerosos operários trabalham nesses locais “em condições primitivas, usando banhos ácidos, cocção e queima a céu aberto para recuperar apenas entre 30% e 35% dos metais. A melhor solução é ter uma responsabilidade marcante”, disse Abhishek Pratap, do Greenpeace.
A campanha desta organização ambientalista se centrava na indústria, que deveria manufaturar produtos limpos e implementar uma política de devolução de produtos usados por parte dos consumidores para enviá-los a recicladores autorizados. A firma de telecomunicações finlandesa Nokia, principal fabricante de telefone celular do mundo, está em primeiro lugar na lista trimestral de indústrias eletrônicas “verdes” e “livres de PVC” do Greenpeace.
“Antes esta empresa tinha duplo discurso em sua política de devoluções. O sistema não funcionava na Índia, mas ia bem em outros países. A partir de nossa campanha, a Nokia tem aqui, agora, o maior centro de coleta para seus produtos descartados para reciclagem”, disse Kumar. Os gigantes indianos da tecnologia da informação Infosys e Wiporo também são conscientes, enquanto a multinacional holandesa Philips está impondo “forte resistência” para assumir suas responsabilidades, disse o Greenpeace.
Como a maior parte dos produtos eletrônicos fabricados na Índia, especialmente computadores, é destinada à exportação, a indústria costuma responder com rapidez aos chamados por uma produção livre de tóxicos e pela reutilização, ambientalmente sã, de seus produtos. Setenta e cinco por cento das grandes companhias indianas de tecnologias da informação cumprem a diretriz da União Européia conhecida pela sigla em inglês ROHS (Restriction of Hazardous Substances” – restrição de substâncias perigosas), especialmente para a indústria eletrônica.
A multinacional coreana Sansung tem 31 centros de coleta em toda Índia, enquanto há pouco a multinacional de informática Apple livrou seus produtos do vinil, dessa forma eliminando a emissão de dioxinas no processo de incineração. Mas as grandes empresas representam apenas 30% ou menos do lixo eletrônico da Índia. “Menos de 5% do lixo gerado chegam ao setor de reciclagem organizado”, disse P. Parthasarathy, diretor da E-Parisara, primeira empresa indiana de reciclagem eletrônica, com sede em Bangalore. Atualmente operam apenas entre oito e 10 companhias de reciclagem de lixo eletrônico autorizadas na Índia.
Outro problema é a eliminação de 50 mil toneladas de lixo eletrônico obsoleto ao ano, segundo Parthasarathy, o número é “muito, muito maior” se for somado o que jogam neste país firmas ocidentais para seu recondicionamento e reutilização na Índia. “O problema é sua eliminação, pois as nações exportadoras não especificam estas mercadorias como lixo”, afirmou. Em 2007, um informe da Agência Britânica de Meio Ambiente determinou que várias empresas exportavam lixo eletrônico da Grã-Bretanha para Índia, Paquistão e China.
A organização Toxics Link, com sede em Nova Déli, já alertava em 2003 que a cidade comercial de Mumbai (ex-Bombaim) gera 19 mil toneladas anuais de lixo eletrônico, boa parte disto através de importações clandestinas desde o mundo industrial. Nova Déli é apontada como a maior recicladora de lixo eletrônico do país, e também se destaca nesta atividade Kolkata, a metrópole oriental antes conhecida como Calcutá. Mas, tanto o Greenpeace quanto Parthasarathy se manifestaram ansiosos para que se continue apelando ao setor informal enquanto se busca maneiras de reciclar de maneira segura.
“Queremos que o setor informal mantenha seus meios de sustento. Queremos envolvê-lo na coleta e no transporte desses dejetos em um programa de benefícios mútuos”, disse Kumar. O modelo ISO 14.001 de Parthasarathy – desenvolvido na Índia com ajuda das instituições de assistência ao desenvolvimento GTZ, da Alemanha, e EMPA, da Suíça – usa um método simples pelo qual se desmonta manualmente produtos como computadores, impressoras e cartuchos, entre outros, além de separá-los e pulverizá-los, tudo sem prejudicar o meio ambiente. Os mais de 50 clientes da E-Parisara são empresas importantes, entre elas IBM, Lucent-Alcatel, Hewlett Packard, Intel, Infosys e Motorola.
Todos os envolvidos nesta atividade – organizações não-governamentais, ativistas, recicladores de produtos eletrônicos e agências – agora se preparam para apresentar ao governo indiano um pedido de lei exaustiva sobre geração, manufatura, importação e exportação de lixo eletrônico. “As pautas emitidas pelo conselho central de controle da contaminação no começo deste ano sobre manejo do lixo eletrônico não são obrigatórias. Queremos uma lei à parte”, disse Parathasarathy.
(Por Keya Acharya, Envolverde, IPS, 06/10/2008)