A ideia de que as indústrias europeias devem pagar pelos gases com efeito de estufa lançados pelas suas chaminés passou hoje pelo seu primeiro teste no Parlamento Europeu. Mas a resistência de alguns países e a actual crise financeira mundial sugerem que uma decisão final neste sentido não será fácil.
A Comissão de Ambiente do Parlamento aprovou um relatório defendendo que cada unidade industrial compre, por leilão, as licenças de que necessita para compensar as suas emissões. O relatório apoia, assim, a proposta de directiva da Comissão Europeia, com as regras para a nova fase do comércio europeu de licenças de emissões, entre 2013 e 2020.
Para as unidades indústriais do sector energético – como centrais térmicas – a totalidade das licenças terão de ser compradas. Para outros sectores, o processo será gradual, começando com 15 por cento de leilão em 2013, subindo até aos cem por cento em 2020.
Poderá haver derrogações para sectores industriais que possam ficar em situação difícil, caso apenas a União Europeia avance com medidas ousadas para conter o aquecimento global.
“Os ‘verdes’ não ficaram muito contentes e os que estão do lado da indústria não ficaram muito contentes. Por isso, creio que consegui acertar bem no meio”, disse hoje a eurodeputada irlandesa Avril Doyle, relatora do Parlamento para a directiva do comércio de emissões.
O comércio europeu de licenças de emissões está em vigor desde 2005. Mas a maioria das licenças é hoje atribuída gratuitamente. No máximo dez por cento podem ser vendidos em leilão, a critério de cada Estado-membro. Ao final de cada ano, cada fábrica devolve as licenças correspondentes às suas emissões. Quem as tiver em excesso, pode-as vender para quem as tiver em falta.
Negociação difícil em cenário de crise financeira mundial
A aprovação do relatório hoje é apenas o primeiro passo de uma negociação que promete ser difícil, ainda mais no contexto de crise financeira mundial. A relatora Avril Doyle tem mandato agora para discutir com a Comissão e o Conselho europeus, antes de levar o assunto ao plenário do Parlamento, em Dezembro.
Há pressões para uma decisão final logo em Dezembro, sem uma segunda leitura pelos eurodeputados. O objectivo seria evitar uma eventual ruptura no processo, devido às eleições para o Parlamento e a nomeação da nova Comissão Europeia, em meados de 2009.
Mas um acordo próximo não será fácil. Países como a Alemanha e Itália têm-se oposto a medidas do comércio de emissões que fragilizem a sua indústria perante a concorrência externa. A Polónia, muito dependente do carvão, também tem contestado a proposta da nova directiva.
As divergências entre os governos reflectem-se entre os eurodeputados. “O Parlamento está muito dividido. O resultado pode ser imprevisível”, avalia o ex-eurodeputado Jorge Moreira da Silva, que foi relator do Parlamento quando foi discutida a primeira fase do comércio europeu de emissões, em 2003.
(Por Ricardo Garcia, Ultima Hora, 08/10/2008)