Dono de posto de gasolina, desmatador e aliado dos assentados, Bepe critica queimadas e ?aberrações legais?
O madeireiro José Paterno, mais conhecido como Bepe na agrovila Nova Fronteira, sede do assentamento do Incra em Tabaporã, tem orgulho da profissão. Ele acha que trabalha para a conservação da natureza, porque sempre segue a lei. Há sete anos em Mato Grosso, o madeireiro deve à mata o patrimônio que construiu.
Dono de um posto de gasolina e derrubador de árvores, "sempre com a autorização necessária", ele comprou uma fazenda de 10 mil hectares ao lado dos lotes dos assentados, seus amigos e aliados.
"A floresta será conservada, se for obedecida a política do desmate sustentável, que consiste no corte de árvores adultas e no plantio de mudas", acredita Bepe. Um madeireiro consciente, observa ele, tem interesse na conservação da mata porque vive dela.
Bepe reivindica do governo incentivo e financiamento para o reflorestamento. Como exemplo, aponta a iniciativa de José Carlos Siqueira, que chegou do Paraná há sete anos, comprou um lote de 55 hectares e montou, ao lado da criação de gado, uma sementeira para plantar pau-balsa, uma árvore que cresce um metro por mês nos primeiros 18 meses e pode dar bom lucro.
Crítico dos desmatadores que utilizam a queimada para abrir espaço nos lotes, Bepe concorda que 20% é uma porcentagem baixa para a exploração da terra, mas acha que os pequenos proprietários poderão sobreviver se o governo melhorar a política agrícola. "Quem só tem menos de 15 hectares para cultivar poderia ocupar áreas próximas dos centros urbanos para vender seu produto."
Bepe defende também a venda de lotes exclusivamente para gente que saiba tratar a terra. Já padre João Selhorst, que diz conhecer melhor do que ninguém a realidade de Nova Fronteira, denuncia a "profissionalização dos assentamentos" - conseguir um lote do governo só para vender em seguida.
Como Nova Fronteira não tem delegacia, quando precisam da polícia os sitiantes e assentados têm de rodar 50 km por estradas de terra, intransitáveis no período de chuvas, até Americana do Norte. Foi o que fez na manhã de anteontem Lidemar Brunetto para registrar um boletim de ocorrência sobre um incêndio em sua terra. O policial militar registrou a queixa, mas advertiu que, se não informar quem provocou o incêndio, ele será responsabilizado por crime ambiental.
"É mais uma aberração da lei", comentou Bepe, que levou o amigo à delegacia. O madeireiro insiste em que os órgãos públicos deveriam ser mais ligeiros na análise de supostos crimes, como no caso dos desmatamentos, "uma questão de sobrevivência para quem um dia desbravou a Amazônia acreditando que era preciso ?ocupar para integrar?, como se pregava no governo Médici".
(Por José Maria Mayrink, Estadão Online, 05/10/2008)