Um plano de mudanças climáticas no país sem propostas e metas efetivas e que, entre outras ações, considera a construção de hidrelétricas e apóia a produção do biodiesel na Amazônia é um plano fraco. É essa a conclusão que ambientalistas tiveram a partir do Plano Nacional de Mudanças Climáticas, lançado no dia 25 de setembro.
Com a perspectiva de fazer com que o país diminua a emissão de gases de efeito estufa e mitigue os danos causados pelo aquecimento global, o plano apresenta ações que, de acordo com especialistas, são deficientes inclusive em relação às questões sobre a Amazônia.
O plano pretende reduzir as taxas de desmatamento até que se chegue ao desmatamento ilegal zero, eliminando a perda líquida de área de cobertura florestal no Brasil até 2015. Para atingir esse objetivo, o governo pretende diminuir a devastação florestal já existente e aumentar as áreas de reflorestamento.
De acordo com o coordenador do programa de mudanças climáticas do Greenpeace Guarany Osório, não basta propor apenas combate ao desmatamento ilegal. "Se é ilegal, já existe lei que o combata. O que nós propomos é o desmatamento zero", explica. Para Osório, a principal falha do plano é a ausência de metas. "Ora tem metas, ora não tem, ora não estão detalhadas. No geral, não existem metas consistentes".
A Amazônia também aparece nas propostas relacionadas à energia. O plano argumenta que, para manter uma matriz energética relativamente limpa, é necessário levar em conta a continuidade "no aproveitamento do vasto recurso hidrelétrico ainda inexplorado". Todas as hidrelétricas apontadas se encontram na Amazônia Legal.
No entanto, a construção de usinas hidrelétricas na Amazônia sofre grandes críticas da sociedade civil. Essas usinas aumentam a pressão sobre o desmatamento das florestas. Além disso, um estudo do pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) Philip Fearnside mostra que hidrelétricas na Amazônia pode ser grandes emissoras de gases de efeito estufa.
O plano também apresenta os incentivos que o governo vem oferecendo para a produção de biodiesel nos estados do Amazonas e do Pará. Os biocombustíveis são alvo de polêmicas envolvendo o temor de que estejam contribuindo para a inflação dos alimentos e que pressione o desmate na floresta amazônica.
Para Osório, as propostas relacionadas aos biocombustíveis no plano não apresentam profundidade e nem consideram a questão dos possíveis impactos ambientais, visando apenas à expansão da produção. "Neste ponto, o plano parece mais uma propaganda do governo federal a respeito da expansão dos biocombustíveis", diz.
Amazônia e aquecimento globalA falta de metas na questão do desmatamento e o incentivo às grandes hidrelétricas e expansão dos biocombustíveis preocupam porque a Amazônia tem um papel crucial no clima, sendo uma peça-chave para combater o aquecimento global. O próprio Plano mostra que a destruição das florestas, no Brasil, é a grande vilã do aquecimento global. "O desmatamento no bioma Amazônia tem grande participação nas emissões brasileiras, respondendo por mais de 60% das emissões de CO2 do Brasil".
O diretor-adjunto da organização Amigos da Terra - Amazônia Brasileira Mario Menezes explica que, diferente do que se acreditava antigamente, a Amazônia não é o "pulmão do mundo", mas na verdade o "ar condicionado" do mundo, absorvendo o calor e distribuindo a umidade.
"A Amazônia tem importância para o clima em três aspectos: na fixação do carbono, no processo de evapo-transpiração e na redistribuição da umidade", diz o diretor. Menezes explica que a floresta conserva grande quantidade de carbono que, quando liberado por desmatamento ou queimada, contribui com o aquecimento global.
Ao se ter a evapo-transpiração, as folhas das árvores respiram, jogando umidade para a atmosfera. Essa umidade influi no clima tanto do hemisfério norte quanto o do sul e é distribuída pelos chamados ventos alísios, que levam as nuvens para diversas regiões do continente, como o Centro-oeste e Sudeste do Brasil.
"Se esse processo ficar comprometido, teremos menos chuvas e mais calor. O aquecimento do Oceano Atlântico resulta em maior quantidade e intensidade dos furacões, no hemisfério norte. Já a falta de chuva compromete toda a agricultura do centro-sul do Brasil", explica Menezes. O pesquisador ainda lembra os dados do relatório "Aquecimento Global e a nova geografia da produção agrícola no Brasil", produzido pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e Universidade de Campinas (Unicamp), mostrando que a agricultura brasileira pode ter perdas de 7,4 bilhões por ano, a partir de 2020, com o aumento da temperatura.
Consulta públicaO Plano Nacional de Mudanças Climáticas ficará aberto para consulta pública por 30 dias. Depois disso, será lançado pelo presidente Lula em um evento que antecede a 14ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC).
Segundo Guarany Osório, o Greenpeace está preparando uma proposta com pontos básicos para apresentar na consulta pública. "A nossa idéia é utilizar idéias já existem, com as propostas dos relatórios 'Desmatamento Zero' e 'Revolução Energética'. Esperamos que exista participação de toda a sociedade civil, pois não tem mais tempo para plano sem metas, objetivos e compromissos", conclui.
(
Amazonia.org.br, 02/10/2008)