Será o Sul da Europa a sofrer os maiores impactos das mudanças climáticas, num leque de prejuízos humanos, económicos, sociais e naturais. Portugal partilha dessa sorte futura com os outros países mediterrânicos.
A influência das alterações climáticas nos países europeus far-se-á sentir de modo distinto consoante a localização geográfica e os sectores. As décadas futuras levarão aos países nórdicos e centrais mais cheias catastróficas, mas serão eles a colher quase todos os benefícios das mudanças, seja na agricultura ou no turismo. Já a faixa Sul, em que Portugal se integra, irá partilhar não só algumas cheias, mas sobretudo a seca e a sede, a aridez e as vagas de calor. Mais: a agricultura estará a braços com mais perdas de colheitas, o turismo ver-se-á a contas com a fuga dos clientes em busca de temperaturas mais amenas. Quanto ao peixe dos nossos mares, eles irão viajar para águas mais a Norte.
Este cenário foi ontem divulgados em relatório pela Agência Europeia do Ambiente, que fez a confluência de dados dos diversos estudos nacionais (como o projecto português SIAM coordenado por Filipe Duarte Santos) com as informações da Organização Mundial de saúde e o Centro Europeu de Pesquisa (JRC) da Comissão Europeia. O intuito do trabalho é o de apelar aos países para que se preparem para situações de vulnerabilidade e, ao mesmo tempo, trabalhem em conjunto para a obtenção de mais dados locais, nacionais e continentais quanto às mudanças climáticas. Sobre vulnerabilidades que se instalam, os relatores reconhecem haver muito trabalho de preparação a fazer, já que, até agora, esta se centrou muito na prevenção de cheias.
Acentua-se a diferença entre o Norte e o Sul da Europa, no que se refere à quantidade de precipitação, segundo destaca o documento. Há os países molhados e os secos, indica o relatório, para lembrar que algumas das regiões mediterrânicas já sofreram uma redução de chuvas em 20% face há um século. É também no Sul que os rios vão tender a secar nos seus leitos, apesar de também aí haver probabilidades de cheias repentinas quando de precipitações extremas e repentinas. Para o Sul (definido como abrangendo quase toda a Península Ibérica, à excepção de uma faixa da Galiza e do Minho) as consequências económicas far-se-ão sentir na agricultura, no turismo e também na produção hidro-eléctrica, com as barragens a ter de parar.
A procura da água conhecerá também grandes picos nas regiões meridionais, e não só para a agricultura; as populações e os turistas poderão entrar nessa "competição insustentável", como caracteriza o relatório. As secas trarão inevitavelmente mais incêndios florestais, vaticina o documento. E a falta de qualidade do ar vai contribuir também para mais doenças. No Norte ganharão a agricultura e o turismo.
É caso para dizer que até os peixinhos fugirão de nós, rumando mais para Norte e fugindo do caldo oceânico onde também algas indesejáveis procurarão refúgio (muitas espécies piscícolas, nos últimos 40 anos, "subiram" cerca de mil quilómetros). O mesmo está a acontecer com aves e outras espécies, na busca de temperaturas mais moderadas.
(Por EDUARDA FERREIRA, Sapo.Pt, 29/09/2008)