“Embora estejamos nos movendo na direção correta, não o fazemos suficientemente rápido” para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, disse o secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon. Em um momento em que as nações em desenvolvimento, particularmente na África, admitem sua incapacidade de cumprir a maioria dos oito Objetivos, um país latino-americano vai contra a corrente: o Chile. Esta nação inclusive acredita que poderá atingir as Metas no prazo estabelecido pela ONU.
“Modesta e orgulhosamente, anunciamos a esta Assembléia que o Chile está conseguindo os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio fixados para 2015”, disse aos delegados a presidente chilena, Michelle Bachelet. Dirigindo-se à Assembléia Geral, de 192 membros, afirmou: “Podemos dizer que é possível erradicar a pobreza, sair do subdesenvolvimento e – o que é ainda mais importante – fazê-lo dentro da democracia e com liberdade”. O Chile, que quase triplicou o tamanho de sua economia entre 1990 e 2008, “avançou fortemente” em todas as frentes: saúde, educação, habitação, qualidade de vida e coesão social, acrescentou Bachelet se referindo a alguns objetivos estabelecidos pela ONU.
Com população de aproximadamente 16,4 milhões de habitantes, o nível de pobreza no Chile diminuiu: passou de cerca de 40% em 1989 para 13% atuais. Bachelet proporcionou na semana passada um dos poucos alívios políticos em uma reunião de aproximadamente cem líderes mundiais, a maioria se queixando de que a atual crise de alimentos, combustível e energia está minando suas tentativas de conseguir os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.
Estas metas, definidas pela Assembléia Geral da ONU, incluem reduzir pela metade a proporção de pessoas que sofrem fome e pobreza (em relação a 1990); garantir educação primária universal; promover a igualdade de gênero; reduzir a mortalidade infantil e a materna; combater à Aids, a malária e outras doenças; assegurar a sustentabilidade ambiental e fomentar uma associação mundial para o desenvolvimento, tudo isto tendo como data-limite 2015.
A volátil situação se vê agravada pela crise econômica sem precedentes que vivem os Estados Unidos, descrita por alguns como uma “tempestade que se aproxima”, ameaçando devastar o mundo em desenvolvimento. “Embora estejamos nos movendo na direção certa, não o fazemos com suficiente rapidez”, disse Ban Ki-moon em uma reunião de alto nível sobre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.
O presidente da 63ª Assembléia Geral, sacerdote Miguel d’Escoto Brockman, advertiu que a atual crise financeira terá “conseqüências muito sérias” que impedirão um avanço significativo, “se é que se conseguirá algum avanço” rumo aos Objetivos do Milênio, “que são em si mesmos insuficientes. Sempre são os pobres que pagam o preço pela cobiça desenfreada e pela irresponsabilidade dos poderosos”, afirmou d’Escoto se referindo ao resgate de US$ 700 bilhões proposto pelo governo dos Estados Unidos para salvar os bancos de investimento de Nova York da bancarrota e do colapso.
Consultado se outros países em desenvolvimento fizeram pronunciamentos públicos sobre sua capacidade de cumprir todos os Objetivos antes da data estipulada, Salil Shetty, diretor da Campanha do Milênio, disse à IPS: “Tristemente, não temos informação de fácil acesso em nível de país em um único lugar. Mas, sabemos que 47 países estão no rumo de cumprir o objetivo de educação, 44 o referente a pobreza e 34 no tocante à mortalidade infantil”, afirmou. Isto inclui algumas das nações mais pobres, como Zâmbia, que está bem encaminhada em seis dos oito objetivos, e também alguns países grandes, como o Brasil, que só está atrasado no objetivo relacionado ao saneamento, afirmou Shetty.
Para Shetty, os maiores desafios são os objetivos sobre meio ambiente e mortalidade materna. Thoraya Ahmed Obaid, diretora-executiva do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), disse que custaria ao mundo cerca de US$ 6 bilhões, menos de um dia e meio de gasto militar mundial, impedir que as mulheres morram ao darem à luz. “Não cumpriremos os Objetivos do Milênio, a menos que a saúde reprodutiva e os direitos das mulheres se convertam em uma prioridade política e financeira”, disse Obaid à IPS.
A reunião de alto nível realizada na semana passada viu a criação de uma nova coalizão para cumprir os desafios que enfrentam os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio: organizações governamentais e não-governamentais, presidentes de corporações multinacionais, organizações religiosas e filantropos. Ban Ki-moon pediu US$ 72 bilhões por ano em financiamento externo para se atingir as Metas do Milênio até 2015. “Embora a quantia pareça enorme, de fato pode ser custeada, particularmente considerando os US$ 267 bilhões gastos no ano passado por países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE) somente na área de subsídios agrícolas”, acrescentou.
O presidente do Quênia, Mwai Kibaki, apontou o aumento nos preços do petróleo com fator da atual crise econômica que enfrenta hoje a maioria dos países pobres. Mas, o presidente de Ruanda, Paul Kagame, se mostrou mais confiante em sua luta contra a pobreza. Disse que em seu país - uma das histórias de êxito mais recentes da África – se registra “um saudável crescimento econômico, que atualmente é, em média, de 7% ao ano, em um contexto cada vez mais aberto e propício que incentiva os investidores externos e internos”.
Explicando alguns dos êxitos dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, Ban Ki-moon disse que as vacinas contra o sarampo impediram 7,5 milhões de mortes. Também houve avanços contra a Aids, enquanto aumentaram as matrículas escolares em vários países africanos, após a abolição de cotas escolares, acrescentou. “Milhões de lares pobres saíram da extrema pobreza, não somente na China e Índia, mas em muitas nações, entre elas algumas das mais pobres”, disse Ban. Além disso, admitiu que a África subsaariana experimentou um aumento dos pobres entre 1990 e 2005.
Alison Woodhead, porta-voz da Oxfam Internacional, disse as IPS que a reunião de alto nível “demonstrou que há um renovado apetite pela luta contra a pobreza”. Este encontro deu nova vida aos Objetivos do Milênio, acrescentou. Mas o grande fracasso da cúpula é a resposta à crise alimentar – prosseguiu Woodhead – porque os líderes mundiais não responderam ao desafio, deixando amplamente de cumprir compromissos assumidos há meses.
(Por Thalif Deen, Envolverde, IPS, 30/09/2008)