No Brasil, além da morte das abelhas, os impactos dos agrotóxicos de
maneira geral aparecem quase que como algo exótico, coisa de quem
acredita em disco voador. Poucos veículos, na maioria nanicos ou
quixotescos,
dedicam tempo e esforço para explicar as inúmeras faces do
problema, e relembrar ao público o tamanho do negócio que ele
envolve.
Graças à pujante agricultura, o país assumiu em 2007
o segundo lugar no
ranking mundial no consumo de agrotóxicos, com 400 mil
toneladas/ano. O setor fatura US$ 5,4 bilhões em solo brasileiro, só
perdendo para os Estados Unidos.
Entender o processo de autorização de agrotóxicos é um dos passos
para a discussão sobre o passivo deles no Brasil. "As empresas
apresentam avaliações de diversos fatores, como quanto a periculosidade
para o meio ambiente, persistência do produto e efeitos sobre
organismos não alvos", explica a engenheira agrônoma, Marisa Zerbetto,
da Coordenação Geral de Avaliação e Controle de Substâncias Químicas do
Ibama em Brasília.
As análises são conduzidas por laboratórios
credenciados pelo Inmetro, com quem o Ibama trabalha em parceria. O
custo é pago pelas empresas. Mas essa é só uma das três avaliações para
autorizar agroquímicos. As outras duas são conduzidas pela Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que avalia o risco à saúde
humana, e pelo próprio Ministério da Agricultura, que avalia a eficácia
agronômica. Para que um registro seja concedido, são necessários
relatórios favoráveis dos três órgãos. Entretanto, um não pode se
envolver na competência legal do outro.
Não há porque desconfiar
do processo de liberação. Em princípio ele é conduzido da melhor
maneira possível pelas autoridades e não difere muito dos procedimentos
feitos em outros países.
O problema começa na avaliação prática, ou na
reavaliação deles. Se na teoria, ou na lei tudo parece bem, no campo o uso de agrotóxicos ainda não tem solução para uma gama variada de "imprevistos". Do controle e segurança na aplicação à
eliminação de agrotóxicos velhos. Sem falar que muitos estados
ainda
discutem os critérios para o uso de defensivos.
A questão envolve múltiplos interesses, internos e externos ao país. Baseada
na suspensão de substâncias químicas na Europa, a Anvisa vinha, desde
2006, reavaliando o registro de nove delas, presentes na composição de
99 agrotóxicos. A agência também vinha verificando um aumento enorme
na importação desses químicos pelo Brasil.
Antes de poder concluir o trabalho a reavaliação foi suspensa
por uma liminar da Justiça Federal do DF, concedida a uma ação do
Sindicato das Indústrias de Defensivos Agrícolas (Sindag). Entre os argumentos do Sindag está o de que o procedimento da
Anvisa nega aos fabricantes o direito de ampla defesa.
Ao mesmo tempo,
é interessante notar a total ausência de debate. O aumento da importação de agrotóxicos é outro tópico ignorado pela mídia. "Infelizmente, a Folha foi o único
veículo a se interessar pelo assunto que é muito grave e merece atenção
da mídia", reclama Málcia Afonso, assessora de comunicação da Anvisa.
(Por Mariano Senna da Costa*, Ambiente JÁ, 24/09/2008)