As revelações que vieram à tona em relação a uma série de incidentes ocorridos num centro experimental de tratamento e enterramento de lixo radioativo deram uma nova dimensão para a polêmica em torno do armazenamento de resíduos nucleares na Alemanha.
Na terça-feira, 2 de setembro, o ministro social-democrata (SPD) do meio-ambiente, Sigmar Gabriel, apresentou um relatório a respeito da situação da mina de Asse, na Baixa Saxônia. Este documento dava conta de uma pesquisa que confirmava a existência, naquele depósito, de riscos mais importantes e mais antigos do que aqueles conhecidos até então.
Entre 1967 e 1978, 126 mil recipientes que continham resíduos radioativos médios e fracos foram armazenados nesta antiga mina de potássio e de sal. Ora, desde o começo das operações, os empregados observaram a existência de escoamentos de salmoura nas cavidades da mina. A empresa que garante a manutenção deste centro de armazenamento, o centro Helmholtz para a saúde e o meio-ambiente de Munique (HMGU), havia reconhecido a existência de tais escoamentos, só que ela se manifestou a respeito apenas a partir de 1988.
Com uma vazão de 12 m3 por dia, esse escoamento ameaça a estabilidade da mina. Pior ainda, ao entrarem em contato com os recipientes, dos quais alguns estariam deteriorados, os fluidos de salmoura foram impregnados pela radioatividade. A autoridade de vigilância responsável, que é o departamento das minas da Baixa Saxônia (LBEG), tinha o conhecimento desta situação havia vários anos, mas só tomou a iniciativa de divulgá-la para o grande público em junho passado.
Além disso, diferentemente daquilo que havia sido anunciado anteriormente, combustíveis nucleares também foram armazenados junto com o lixo radioativo em Asse. Por fim, a companhia responsável pelo armazenamento não agiu conformemente às normas e aos procedimentos padrões que se aplicam diante de tais riscos. "Foram sonegadas informações a respeito das infiltrações", fustigou o ministro do meio-ambiente.
Para enfrentar o problema, o governo federal transferiu a tarefa de vigiar o depósito de lixo radioativo para o departamento federal para a proteção contra as radiações, que depende do ministério federal do meio-ambiente.
Esta decisão, que confere ao depósito de Asse um estatuto que é normalmente atribuído a um centro de armazenamento de resíduos altamente radioativos, deverá ser homologada pelo conselho dos ministros daqui até o final de setembro. Além disso, as autoridades de Berlim também se preparam para apresentar um projeto de fechamento da mina daqui até o final do ano.
Suspensão das atividades
Este escândalo contribui para complicar mais ainda o problema já muito delicado da questão nuclear na Alemanha. O projeto de armazenamento definitivo por meio do enterramento dos resíduos altamente radioativos se encontra na estaca zero desde 2000. Foi naquele ano que as autoridades de Berlim tomaram a decisão de suspender as atividades do depósito de Gorleben, na Baixa Saxônia. O partido conservador e o partido democrata-cristão (CDU-CSU) que integram o governo de coalizão com o partido social-democrata (SPD), temem daqui para frente que o ministro Sigmar Gabriel, um feroz adversário de todo prosseguimento da atividade das centrais, se valha dos incidentes que ocorreram em Asse para reivindicar o abandono completo de toda atividade relacionada à energia nuclear.
Ora, em 5 de setembro, a chanceler Angela Merkel (CDU) posicionou-se mais uma vez como defensora deste tipo de energia e pronunciou-se em favor da manutenção do centro de armazenamento de Gorleben. Nesse sentido, os democrata-cristãos, liderados pela chanceler, estão exigindo a supressão da proibição deste centro.
Além do mais, os defensores das atividades nucleares argumentam, em resposta ao ministro do meio-ambiente, que as buscas de locais alternativos custariam ao menos um bilhão de euros (cerca de R$ 2,7 bilhões). O ministro rejeitou imediatamente esta proposta.
(Por Cécile Calla, Le Monde, UOL, 23/09/2008)