Durante a cerimônia de inauguração de uma fábrica de pás para turbinas eólicas em Viana do Castelo, o Primeiro-Ministro de Portugal, José Sócrates, afirmou que a estratégia de seu Governo é apostar nas fontes renováveis. Disse ele: “é fundamental que o país tome consciência de que não deve ficar tão dependente do petróleo, e a melhor forma de reduzir essa dependência é aumentar a percentagem de eletricidade baseada em energias renováveis, aproveitando um tipo de energia que podemos produzir”.
Portugal passou de 500 MW de energia eólica instalada em 2004 para os atuais 2.500 MW sendo que a projeção é chegar a 5.000 MW em 2010. A opção eólica permitirá ao país que poupe mais de R$ 2,67 bilhões por ano, tanto em termos econômicos quanto em emissões de CO2, permitindo, também, que Portugal cumpra seus compromissos para com o Protocolo de Kyoto.
O complexo de Viana do Castelo, quando estiver finalizado, dentro de um ano, criará 2.500 novos postos de trabalho diretos e mais de 7.500 indiretos. É evidente que em toda Europa a questão de mudar a matriz energética atual investindo maciçamente em energias limpas, desmantelando as custosas e perigosas usinas nucleares e as movidas a carvão, está se transformando cada vez mais numa prioridade.
Essa consciência da mudança também existe no Brasil, tal como revela a recente pesquisa do ISER sobre o que o brasileiro sabe em relação às mudanças climáticas. Divulgada na Câmara dos Deputados, a pesquisa demonstra muito mais do que simples números e percentagens; ela retrata um Brasil preocupado em relação ao futuro imediato, principalmente os cientistas (que são os mais conscientes), seguido pela sociedade civil, a mídia e o empresariado.
Paradoxalmente, o tema teve menos importância entre os parlamentares. Alguns deputados reconheceram que as mudanças climáticas são um problema urgente, mas o Congresso Nacional ainda não inseriu o tema entre suas prioridades. E quando se fala em mudanças climáticas também se fala em energia e, principalmente, em modo de consumo.
A Câmara já criou uma Comissão Especial Mista sobre Mudanças Climáticas para analisar projetos que propõem uma Política Nacional sobre Mudança do Clima, mas interesses conflitantes não permitem que se discuta em profundidade temas fundamentais como a destruição do Cerrado e da Amazônia com o objetivo de plantar soja e criar gado; a do Pantanal, para cana-de-açúcar; não se chega a um acordo quanto ao desmatamento zero, nem sobre a rotulagem dos organismos geneticamente modificados. A bancada ruralista domina a política agrícola e a Frente Parlamentar Ambientalista não tem força, pese a ser uma maioria, para impor uma nova visão de desenvolvimento baseado na sustentabilidade.
Entramos agora no fim da corrida eleitoral, e é de se desejar que, com a nova eleição municipal, o Brasil possa escolher prefeitos e vereadores capazes de fazer essa mudança em nível local. Seria muito bom aprender a lição política de Portugal, ouvindo as palavras de José Sócrates: “todos disseram em Portugal que era preciso reduzir a dependência do combustível fóssil, mas se nada fosse feito, ninguém nos perdoaria. Daqui a 15 ou 20 anos, os atores da nova geração nos acusariam de que nada fizemos; não quero que isso aconteça”. Só para lembrar aos nossos políticos eleitos e aos que ainda o serão: Portugal hoje está numa situação privilegiada no mundo em termos energéticos, na liderança dos países mais evoluídos em termos de energias renováveis. O Brasil, com tanto sol e vento avança remando contra a maré.
Gaia viverá!
(Por René Capriles e Lúcia Chayb, Eco21, 21/09/2008)