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terras indígenas demarcação de terras raposa serra do sol
2008-09-23

No mês passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu adiar a decisão que há 30 anos é motivo de conflito entre indígenas e arrozeiros do norte de Roraima: a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol.  Essa situação, da não garantia de terras para os indígenas, não é, entretanto, um caso único no Brasil.  Há pelo menos outras 197 terras reivindicadas por populações indígenas que ainda não foram demarcadas.

A Constituição de 1988 previa a demarcação de todas as terras indígenas brasileiras, que representam 13% do território nacional, em no máximo cinco anos. No total, são 627 Terras Indígenas, entre as que estão no processo de demarcação e as que já foram demarcadas e estão aguardando a homologação por decreto do presidente da República, segundo o Instituto Socioambiental (ISA).

Apenas 430 já estão garantidas aos índios.  Dessas, 386 terras já tiveram o processo de demarcação finalizado, 25 já foram homologadas e estão na fase de registro e 19 aguardam a homologação.  Das que ainda não foram garantidas, são 112 em etapa de identificação, 28 já identificadas e 57 declaradas.

Segundo o site o instituto, na Amazônia, região onde existem mais terras sendo reivindicadas, há 160 povos indígenas que dispõem hoje de um conjunto de 377 terras reservadas, sendo que 76% destas têm de reconhecimento legal em diversos graus (terras delimitadas, homologadas ou registradas).

Situações críticas
Para Ana Paula Souto Maior, advogada do programa direito e política socioambiental do ISA, o caso dos índios Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, é um dos mais críticos.  Segundo ela, suas terras devem ser garantidas urgentemente.

Os guarani-kaiowá perderam suas terras nos projetos de colonização do Mato Grosso do Sul, resultando em um problema fundiário que já causou muitos conflitos e mortes.  Um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado pela Procuradoria da República e a Funai obriga que a demarcação dessa terra seja resolvida até 2010.  Na última terça-feira (16), no entanto, a Funai anunciou que iria suspender temporariamente a demarcação, atendendo aos protestos dos produtores rurais do estado.

De acordo com Ana Paula, a não demarcação das terras resultam em muitos outros problemas para esse povo.  "Eles vivem uma realidade muito crítica, sofrendo com problemas de saúde e desnutrição, que são problemas relacionados à terra", explica.

Outro povo que está passando por problemas com a demarcação de suas terras é o Pataxó Hãhãhãe, do sul do Bahia.  Suas terras estão sendo questionadas no Supremo Tribunal Federal há 26 anos.

Os pataxós Hãhãhãe tiveram suas terras reconhecidas em 1937, pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI), órgão que antecedeu a Funai.  O próprio SPI, entretanto, passou a favorecer fazendeiros de cacau e gado, arrendando as terras dos pataxós.  Nas décadas de 1960 e 1970, o governo da Bahia distribuiu títulos imobiliários a grileiros da região.  Os pataxós sofrem, desde então, grande violência.  O caso mais notório ocorreu em 1997, quando o índio pataxó Galdino Jesus dos Santos foi queimado vivo por jovens em Brasília.

A demarcação das terras dos pataxós será julgada pelo STF no próximo dia 26 de setembro.  Ao todo, existem 143 ações contra Terras Indígenas tramitando no Supremo Tribunal Federal.

Raposa Serra do Sol
Apesar de estar sendo questionada no STF, a Terra Indígena Raposa Serra do Sol já está homologada e registrada, isto é, já passou por todas as etapas do processo de demarcação.  O julgamento, que foi adiado após o voto do ministro Carlos Ayres Brito, no entanto, deve se refletir em todos os outros casos de demarcação de terras indígenas.

"O processo de demarcação dessa terra durou 30 anos e os principais obstáculos e questionamentos foram vencidos", explica Ana Paula.  Raposa Serra do Sol fica no norte de Roraima, foi homologada em prol dos povos Macuxi, Ingarikó, Patamona, Taurepáng e Wapishana, mas está sendo contestada pelo governo de Roraima e por produtores de arroz na região, que se recusam a sair.

Segundo a advogada do ISA, a demarcação de Raposa Serra do Sol teve participação dos índios da região.  "A confirmação de Raposa é importante para as demais Terras Indígenas e nós acreditamos que o Supremo deve confirmar a conquista dos índios da região", conclui.

Demarcação
A Constituição brasileira considera Terra Indígena como as terras "por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições".  Essas áreas são patrimônio da União, sob concessão dos índios.

A Constituição de 1988 trouxe mudanças decisivas na forma como se demarcam as terras indígenas e de como o estado brasileiro atua na promoção dos direitos dos indígenas.  "Os índios conseguiram, com a Constituição de 1988, o direito de manter suas diferenças culturais, sua identidade", diz Ana Paula.  Segundo ela, antes disso a orientação do Estado era integrar o índio na identidade nacional e na cultura majoritária no país.

O código definiu as etapas para se demarcar uma terra indígena.  Primeiro, são feitos estudos de identificação, por um antropólogo reconhecido e nomeado pela Fundação Nacional do Índio (Funai).  Este produz um relatório, que deve ser aprovado pelo presidente da Funai e depois publicado no Diário Oficial da União.

Após a publicação, os não-índios afetados têm 90 dias para pedir indenizações ou contestar o laudo.  O parecer vai para o Ministério da Justiça (MJ), que pode aprovar ou não a identificação.  Se aprovado, o MJ declara os limites da área e a Funai inicia a demarcação física.  O procedimento é então submetido ao Presidente da República, que homologa a Terra Indígena por decreto.  A última etapa é o registro da terra em cartório e no Serviço de Patrimônio da União.

De acordo com Ana Paula, o processo costuma ser demorado.  "É muito difícil estabelecer um prazo para se demarcar, porque a demarcação envolve muita coisa, como decisões políticas e orçamentárias.  Não basta só dizer que determinada terra passa a ser indígena, tem que ter orçamento, pessoal.  Além disso, a resistência dos estados muitas vezes atrasa o processo", explica.

(Por Bruno Calixto, Amazonia.org.br, 23/09/2008)


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