A cidade ecológica, que se orgulha de suas áreas verdes, tem pouquíssimos motivos para estufar o peito quando o assunto é a qualidade do seu ar e dos seus rios. Entre os problemas vividos por Curitiba estão vários que acometem qualquer centro urbano em época de aquecimento global, como o aumento da temperatura média, na última década, em 10C em relação à média do século.
Mas há outros dados que comprometem a imagem que a cidade tem. Um estudo que vem sendo feito pelo Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da Universidade de São Paulo (USP) deve comprovar que o céu curitibano não é mais tão azul como antigamente. “Curitiba atende ao padrão que a legislação determina atualmente. O problema é que esse padrão que a gente tem é muito antigo. É dos anos 80”, diz o patologista Paulo Hilário Nascimento Saldiva, professor da Faculdade de Medicina da USP.
Saldiva enfatiza a importância do desenvolvimento de políticas públicas ambientais e afirma que o custo dos serviços de saúde teria de ser levado em conta na hora de planejar sistemas e obras de transporte e energia. “Estamos procurando medir a poluição e calcular o impacto disso na saúde pública, para dizer ao certo qual é o custo da poluição”, afirma o pesquisador.
O que o cigarro provoca em grande escala – doenças cardiorrespiratórias na população – a poluição também faz, mas em pequena proporção. O efeito disso, cita Saldiva, é o agravamento de doenças respiratórias, mais casos de pneumonia entre as crianças e maior mortalidade por enfermidades cardiovasculares entre os idosos. Os números da pesquisa da USP devem ficar prontos no mês que vem. A capital onde nascem mais carros do que pessoas – no ano passado foram 56,3 mil novos carros contra 24,3 mil bebês curitibanos – aguarda ansiosa.
O ar ainda está sendo avaliado, mas os rios curitibanos, dizem os especialistas, já foram reprovados. Estão todos contaminados. E isso é responsabilidade de todos, principalmente daqueles que jogam bitucas ou papéis de bala pela calçada. “Quem polui o Rio Bélem, se ele nasce e morre dentro da cidade? Não é a Vila das Torres, onde a maioria das casas tem coleta de esgoto. Temos que desmistificar essa história de que são áreas favelizadas que provocam sujeira”, afirma Carlos Mello Garcias, professor de Engenharia Ambiental da PUCPR. Para ele, é inadmissível que uma cidade grande e desenvolvida conviva com águas sujas. O desafio para o prefeito eleito, segundo ele, é criar projetos bem estruturados que tenham uma continuidade nas próximas décadas. “Não vamos conseguir resolver isso em quatro anos. Mas é preciso conscientização. O rio é aquilo que a sociedade é.”
O engenheiro agrônomo Nicolas Floriani, professor do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do Paraná (UFPR), concorda: “Não existe rio que não esteja contaminado em Curitiba. O grande desafio para os governantes é aliar a demanda urbana com a capacidade dos sistemas periféricos que hoje abastecem a cidade, notadamente dos mananciais dos municípios que estão a Oeste da região metropolitana.” (RF e BMW)
Com a palavraParticiparam desta edição o engenheiro civil Carlos Mello Garcias, o engenheiro agrônomo Nicolas Floriani, os administradores públicos Anna Paula Penteado, Marilza Oliveira Dias e José Tadeu Motta, o pesquisador Leo Heller, a promotora Margaret Matos de Carvalho e os médicos Paulo Hilário Nascimento Saldiva, Karin Regina Luhm e Rita Esmanhoto.
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Gazeta do Povo, 22/09/2008)