Em 2005, Lisboa teve mais de 180 dias, ou seja, metade do ano, em que os níveis de poluição atmosférica, nomeadamente das partículas inaláveis, ultrapassaram largamente o que é permitido por lei. O limite imposto pela legislação é de 35 dias. O alerta é dado por Francisco Ferreira, coordenador do estudo "Riskair Lisboa". O professor da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa diz ainda que, nesse ano, Lisboa esteve "entre as piores capitais europeias" no que toca à qualidade do ar. Um "problema grave" que é indissociável do tráfego automóvel, garante.
O que só torna mais pertinente o tema da sétima edição da Semana Europeia da Mobilidade - "Ar puro para todos!". A semana termina hoje com a comemoração do Dia Europeu sem Carros.
O sector dos transportes, nomeadamente o rodoviário, é responsável por cerca de 20% das emissões de gases com efeito de estufa e é também uma das principais causas de poluição com efeitos graves na saúde pública. Hélder Spínola, da Quercus, lembra que existem estudos da União Europeia que relacionam a poluição com quatro mil mortes prematuras por ano em Portugal. "É evidente que grande parte do problema está associado aos tráfego automóvel", diz.
O presidente da associação ambientalista considera por isso que esta é "uma iniciativa louvável", mas que não chega. "É acima de tudo um momento de alerta, de sensibilização para os problemas da mobilidade", diz. É também uma altura em que algumas autarquias aproveitam para ensaiar alternativas, lembra. No entanto, considera que as soluções para estes problemas "passam por medidas concretas, ao longo do ano, que respondam aos problemas e às necessidades das pessoas, porque só assim as pessoas vão aderir".
Hélder Spínola salienta que tem sido feito muito pouco para alterar a situação, que é notória desde 2001. "É necessário privilegiar o transporte colectivo e penalizar o individual. A subida do preço dos combustíveis é que tem levado as pessoas a usar menos o carro", diz.
A situação em Lisboa é "preocupante", afirma Francisco Ferreira, mas não caso único no País: se a capital regista os valores mais elevados, no Grande Porto há mais focos. Setúbal e Cascais são outros pontos onde se ultrapassam com frequência os níveis previstos na lei, alerta.
Até o ministro do Ambiente reconheceu esta semana que Portugal se encontra em incumprimento relativamente ao excesso de partículas emitidas para o ar nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e que são necessárias medidas para reduzir a entrada de carros nas cidades. Francisco Nunes da Silva concorda "que está quase tudo por fazer".
Alternativas para deixar o carro em casa
Como cidadão, que medidas pode tomar para reduzir as emissões do tráfego rodoviário, uma das principais fonte de poluição do ar? A primeira é obviamente reduzir a utilização do automóvel. Por isso, a organização da Semana Europeia da Mobilidade aconselha a ponderar alternativas como as deslocações a pé, de bicicleta, nos transportes públicos ou a utilização colectiva do carro. Nos casos em que é possível, a Quercus recomenda que se opte pelo teletrabalho, permitindo assim evitar as deslocações diárias.
Andar a pé
É mais fácil dizer do que fazer. Por isso, a organização da Semana Europeia da Mobilidade recomenda que se opte por viver perto do local de trabalho. O mesmo conselho é aplicável quando se escolhe a escola para os filhos, os locais para fazer compras, etc. - a proximidade ajuda a evitar a utilização do carro.
Andar de bicicleta
A segurança, as condições meteorológicas e topográficas são geralmente os principais obstáculos invocados para não utilizar a bicicleta no dia-a-dia. Argumentos que têm sido desmontados por várias experiências nas cidades portuguesas, como mostra o blogue "100 dias de bicicleta em Lisboa" (100diasdebicicletaemlisboa.blogspot.com). Paulo Guerra dos Santos percorreu a capital em duas rodas para a sua tese de mestrado sobre a "Contribuição do modo bici na gestão da mobilidade urbana" e concluiu que "Lisboa é uma cidade ciclável, para uma grande parte da população que nela vive, estuda e trabalha." Para superar as dificuldades pode contar com a ajuda de blogues como "A bicicleta é um meio de transporte e eu "Vou de Bicicleta" para todo o lado" (voudebicicleta.eu) e "Bicicleta na cidade" (bicicletanacidade.blogspot.com), apenas dois dos muitos em que se partilha informação útil para quem pretende utilizar a bicicleta como meio de transporte. Quanto à segurança, pressione as autoridades locais para melhorarem as infra-estruturas para o trânsito de bicicletas, aconselha a organização.
Transportes públicos colectivos
"A aposta no transporte colectivo é essencial", diz o presidente da Quercus. "É preciso garantir transportes rápidos, confortáveis e económicos porque de outra forma será muito difícil competir com o automóvel", conclui. Depois, resta ao cidadão fazer a sua parte. Considere as hipóteses de transporte quando escolher o local para morar: prefira locais acessíveis através do transporte público.
Partilhar o carro
A utilização colectiva do carro, partilhando com colegas de trabalho ou com pessoas que fazem percursos semelhantes é uma alternativa. Algumas câmaras já disponibilizam formas de os funcionários combinarem boleias através da intranet. Incentive o seu empregador a pôr em prática planos de deslocação para o trabalho, aconselha a organização da Semana Europeia da Mobilidade. A internet pode também ajudar quem quer deixar o carro em casa. Existem sites onde se pode tentar encontrar pessoas que façam o mesmo percurso para partilhar o carro, como o Deboleia.com ou carpool.com.pt.
(Por PATRÍCIA JESUS, Sapo, 22/09/2008)