O Conselho Nacional do Meio
Ambiente (CONAMA) esteve reunido nos dias 10 e 11 de setembro, em
Brasília, para discutir, entre outras coisas importantes, as questões
sobre o licenciamento das Hidrelétricas do Madeira. Vou deixar de lado
o fato de ter presenciado o escandaloso atropelo da legislação
ambiental, a complacência da Secretária Executiva com os conselheiros
do governo e o prejuízo decorrente que, mais dia, menos dia, vai pesar
no bolso do contribuinte.
Acredito que sejam poucos os que têm
tido oportunidade de presenciar uma dessas reuniões e constatar como
elas são movimentadas e pouco produtivas. Na 91ª Reunião CONAMA,
estavam presentes, aproximadamente, trezentas pessoas sob a presidência
da Secretária Executiva, Izabella Teixeira, a “toda poderosa” (deu para
perceber) "Ministra" de Carlos Minc. O Ministro do Meio Ambiente abriu
os trabalhos no primeiro dia com aquele discursinho, ao qual já me
referi, do "prendo e aconteço", como se atitudes de preservação do meio
ambiente se resumissem nisso.
Os conselheiros são os
representantes dos governos municipais, estaduais, dos ministérios, das
agências, dos segmentos da sociedade que incluem as minorias, os
empresários - comércio e indústria, os profissionais liberais, as
organizações não governamentais ambientalistas, num total de 107
membros dos quais 104 votam e três têm direito só à voz. A impressão
que tive durante os trabalhos de apreciação dos itens da pauta
(bastante extensa, por sinal) como votações, discussões de resoluções,
moções, emendas, é que o CONAMA parece um conjunto de contas de um
colar cujo cordão arrebentou.
Não há diálogo, não há
entrosamento, não há camaradagem e, principalmente, não há uma visão
dos indivíduos voltada para a sociedade, e sim para aquilo que cada um
dos conselheiros deseja para seu "nicho". São apenas egos. Lógico, não
vou transformar essa impressão num carimbo, há exceções, e mesmo essas
são difíceis de localizar naquele mar de desconfiança e indiferença. As
matérias em discussão, necessárias à saúde do meio ambiente, são
manipuladas pelos representantes do governo e das empresas. Eles não
entendem nada de meio ambiente e ,claramente, não se esforçam para
entender. Um Conselho pressupõe um grupo com o mesmo objetivo, embora
composto de diferentes visões e níveis de importância.
Não
faltam lobistas, aos montes, desde aqueles que estão tentando construir
uma plataforma para ocupar uma vaga na próxima eleição para o Conselho
(pasmem, tinha até pseudo - ambientalista fazendo isso) até os que
pretendem um "arranjo" especial no texto de uma Resolução, que parece
simplesinha, mas que pode ajudar a eleger o prefeito de um pequeno
município. Acreditem, é tão nítido que impressiona. Meio ambiente? Onde?
A Hecatombe do MadeiraNo
segundo dia, finalmente, chegamos ao polêmico e aguardado item da
pauta, depois de dois dias debatendo como jogar no lixo pilhas e
baterias - parece que a responsabilidade desse descarte não é de
ninguém. Era o momento de ouvir as respostas aos questionamentos dos
ambientalistas sobre o processo de licenciamento das Hidrelétricas
Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira. Foram convidadas, por Secretária
Executiva, Izabella Teixeira, para integrar a mesa, as instituições
citadas no pedido de informações: IBAMA, Funai, Funasa, Ministério
Público Federal e a Ong Amigos da Terra - Amazônia Brasileira.
Para
responder às perguntas dirigidas ao IBAMA, escolheram ninguém melhor
que seu presidente, Roberto Messias Franco, que demonstrou absoluto
desconhecimento do processo de licenciamento e dos trâmites que levaram
à sua assinatura na concessão da Licença de Instalação da usina de
Santo Antônio. Não só não respondeu a nenhuma das questões, como
confundiu tudo sobre como, quem, quando e onde.
Os
representantes da FUNAI e da Funasa deram respostas mornas
acompanhadas por queixumes sobre a falta de estrutura e equipamento
desses órgãos. Isso proporcionou uma boa desculpa para legitimar os
empreendimentos do rio Madeira. O representante do Ministério Público
Federal no CONAMA falou em nome do Procurador Heitor Alves Soares, de
Rondônia, sobre as ações já em curso na Justiça Federal e a instauração
de Inquérito Público para apurar a emissão da Licença de Instalação da
Hidrelétrica Santo Antônio, que ignorou as recomendações da equipe
técnica do IBAMA.
Quando me foi concedida a palavra questionei
diretamente o Presidente do IBAMA, Roberto Messias Franco, sobre sua
participação na futura hecatombe anunciada para jusante da usina de
Santo Antônio e que põe em risco a cidade de Porto Velho. A expressão
utilizada "cíclicas hecatombes" consta do Parecer Técnico 45/2008, de
03 de agosto, que analisou o Projeto Básico Ambiental (PBA) para fins
de emissão da Licença de Instalação. A hecatombe seria o impacto
ambiental decorrente da descarga de sedimentos pelos vertedouros em
operações cujas conseqüências não foram dimensionadas nos estudos
ambientais.
Aproveitei para denunciar, também, o conjunto de
condicionantes da Licença de Instalação da Hidrelétrica Santo Antônio,
que nada mais é que um Termo de Referência para um novo EIA, uma vez
que são pedidos outros diagnósticos e estudos. Ao fazer lembrar as
palavras do Ministro Minc, no seu discurso, sobre "valorizar os
técnicos da casa", percebi um ligeiro desconforto na mesa. Messias
Franco, quando assinou a licença do Madeira, se esqueceu de ler o
parecer dos "técnicos da casa" . Nessa hora estavam sendo exibidas, no
telão, imagens de amostras da “hecatombe” - o assoreamento do rio
Madeira e o encalhe das balsas lotadas de veículos de carga.
Momento
significativo foi quando a Neidinha, Ivaneide Bandeira, da Kanindé de
Rondônia, com sua coragem seringueira criticou duramente a FUNAI por
dar anuência às obras das hidrelétricas e transferir as
responsabilidades das ações de coordenação de índios isolados para os
empreendedores. Neidinha, legítima representante das comunidades
indígenas, acusou a FUNAI de omissão nas questões dos índios isolados e
apontou a irresponsabilidade do órgão em permitir a construção da
usina de Jirau nas proximidades das terras indígenas Karitiana e
Karipuna.
Zuleica Nycz, da APROMAC (PR), fez uma proposta
para formação de um Grupo Assessor com o objetivo de analisar o
licenciamento do Madeira e cobrou do Presidente do IBAMA, Messias
Franco, as respostas às questões do governo boliviano sobre os impactos
transfronteiriços. Infelizmente, a proposta para a formação do Grupo
Assessor foi bombardeada pelo plenário e as respostas à Bolívia,
segundo Messias Franco, serão dadas pelo Ministério de Relações
Exteriores (MRE). Continua...
(Por Telma Delgado Monteiro, Ambiente JÁ /
Blogspot, 15/09/2008)