Ao inaugurar hoje a primeira plataforma de petróleo construída no Estado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não está apenas consolidando Rio Grande como um dos principais pólos navais do país.
Entusiasmado com as descobertas de jazidas de petróleo nas camadas pré-sal, Lula pretende usar a monumental estrutura da P-53 para lançar as bases de um projeto de poder.
Lula, que desembarcou à 0h25min desta madrugada em Pelotas, ambiciona um governo que perdure além de seus dois mandatos. O combustível dessa hegemonia, raciocina o presidente, será o ouro negro que irá jorrar do fundo mar. A presença dele na P-53 faz parte da coreografia que o Planalto vem ensaiando com aptidão, apresentando-o como o único governante capaz de conciliar desenvolvimento social com crescimento econômico.
Somente a P-53 emprega atualmente 4,2 mil homens
Graças ao alcance do Bolsa-Família, Lula se outorgou o título de defensor dos pobres. Aos poucos, começa a conquistar as classes mais privilegiadas. Sua aprovação supera os 50% entre os mais ricos e os mais escolarizados. Na visita a Rio Grande, Lula busca fechar os dois lados dessa equação. Acaricia o setor produtivo, concedendo à cidade a primazia para a construção de oito cascos para plataformas de petróleo, cujo investimento estimado será de US$ 3,2 bilhões – valor 31 vezes superior ao orçamento do município. A prometida ascensão social pode resultar da demanda por empregos na região, uma das mais estagnadas do país. Somente a P-53 emprega 4,2 mil homens.
Os números e as cifras empolgam. Lula está conseguindo fazer o que Fernando Henrique Cardoso prometeu ao conquistar o primeiro mandato, em 1994: impulsionar o desenvolvimento da Metade Sul. E não será algo localizado. Os benefícios se pulverizam por toda a região sul do país, justamente onde estão as maiores resistências ao projeto petista.
Alinhavando interesses políticos e econômicos, Lula amplifica seus objetivos, usando a eleição municipal como trampolim para a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Como não poderá tentar um terceiro mandato em 2010, Lula escalou a pessoa em que mais confia para representá-lo na próxima disputa presidencial.
Na avaliação do presidente, Dilma é discreta e disciplinada o suficiente para declinar de uma reeleição em 2014, abrindo espaço para mais uma candidatura de Lula. Seria um retorno apoteótico, embalado pela riqueza do pré-sal. É por isso que Lula não se importa de servir de cabo eleitoral para candidatos de todos os matizes, que hoje tentam pegar carona em sua popularidade. Quanto menos oposição, melhor para os projetos futuros de Lula.
Daqui a seis anos, as novas reservas de petróleo já estarão irrigando a economia brasileira. O presidente, então, poderá anabolizar sua campanha eleitoral com imagens como as que irá protagonizar hoje pela manhã em Rio Grande, quando o casco da P-53 será batizado com espumante gaúcho.
Uma inauguração às vésperas da comemoração farroupilha
Antes do pré-sal, Lula imaginava percorrer o país inaugurando obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), projeto de infra-estrutura capitaneado pela ministra. Como o PAC ainda engatinha, Lula descobriu nas reservas subterrâneas o palanque perfeito para engatilhar seu discurso ufanista em torno do petróleo.
Sempre com Dilma a tiracolo, cada vez mais ele irá surgir vestido de macacão e com as mãos sujas de óleo, como fez recentemente no Espírito Santo, durante o primeiro teste das extrações no pré-sal. Num gesto simbólico, como se passasse adiante o bastão da sucessão, Lula fez questão de posar para os fotógrafos, imprimindo as mãos tingidas de petróleo nas costas de Dilma.
Dono de um raro senso de oportunidade, o presidente chega ao Estado às vésperas das comemorações farroupilhas. Não por acaso, ele e Dilma estão hospedados em uma tradicional charqueada de Pelotas, propriedade que foi símbolo do último apogeu econômico gaúcho – o ciclo do charque. Quase dois séculos depois, Lula tenta se apresentar como o fiador do ciclo do petróleo.
(Por Klácio Santos, Zero Hora, 18/09/2008)