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2008-09-17
AGU aplica a empresas com capital internacional mesmas restrições impostas aos não-residentes

A Advocacia-Geral da União (AGU) deu o primeiro passo para limitar a compra de terras por empresas brasileiras de capital estrangeiro no Brasil. O consultor-geral da União, Ronaldo Vieira Araújo Júnior, deu um parecer técnico revendo a norma vigente desde 1994, que liberava completamente as aquisições. O texto precisa ser aprovado pelo advogado-geral, José Antonio Dias Toffoli, e pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A expectativa da AGU é que a decisão saia em, no máximo, um mês.

Hoje, pelo menos um território equivalente ao Estado da Paraíba - ou 5,5 milhões de hectares - está nas mãos de estrangeiros, segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, o Incra. Mas esse número já deve ser bem maior, porque os donos não são obrigados a declarar a nacionalidade quando registram suas terras. Além disso, nem sempre os cartórios cumprem as normas que exigem a anotação dos registros de estrangeiros em livro auxiliar.

A decisão de rever o parecer partiu do próprio governo, segundo Araújo Júnior. "A questão estava adormecida havia 15 anos. No ano passado, com o descontrole da aquisição de terras por grupos estrangeiros, o governo ficou preocupado e consultou a AGU para saber se uma revisão era viável", explica o consultor. "A questão está solucionada no âmbito da AGU, mas a palavra definitiva é do presidente."

Caso Lula aprove o texto, as empresas brasileiras de capital estrangeiro passam a ter as mesmas restrições impostas hoje aos estrangeiros não-residentes no País. A principal delas diz respeito ao tamanho das propriedades. A área rural não pode, por exemplo, ultrapassar um quarto do território do município onde está o imóvel. Em regiões delimitadas pelo Incra, o futuro dono vai precisar de autorização do instituto caso queira comprar trechos a partir de 15 hectares, dependendo da localização do imóvel.

A decisão certamente criará uma barreira para as empresas que estão se instalando no País. São grandes grupos agrícolas, geralmente argentinos, e fundos de investimentos americanos e europeus com muito dinheiro em caixa e dispostos a comprar dezenas de milhares de hectares de uma só vez. O Brasil virou um destino natural porque, além de água e clima, tem o maior estoque de terras disponíveis para a agricultura do mundo.

A lei que limita a compra de terras por estrangeiros foi criada no regime militar. Em 1994, o texto recebeu uma reinterpretação, que excluiu as empresas brasileiras de capital estrangeiro desse grupo. "Com a crise dos alimentos, a alta das commodities e o desenvolvimento da tecnologia do etanol, o valor das terras cresceu muito. São fatores que não existiam há dez anos", afirma Araújo Júnior. "O País precisa definir sua política fundiária. Um dos objetivos fundamentais da Constituição é a soberania nacional. É uma regra encontrada nos EUA e no México, por exemplo."

O assunto é polêmico. Muitos produtores brasileiros viram na associação com grupos estrangeiros uma forma de financiar e viabilizar seus negócios no campo. "A preocupação agora é com os efeitos dessa decisão. O governo vai ter de sentar com esses produtores para discutir a lei", diz o consultor.

(Por Patrícia Cançado, O Estado de S. Paulo, 17/09/2008)

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