Uma manifestação que se esperava do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, desde sua primeira gestão, somente agora (depois de 6 anos) aconteceu. O presidente conclamou, por fim, uma organização de massa para sair às ruas em defesa de um projeto de interesse popular e da nossa soberania, acenando assim, ainda que timidamente, com uma nova estratégia de alianças e de ação.
Referimo-nos ao fato de o primeiro mandatário, depois de ter declarado que o petróleo recém descoberto na camada pré-sal é do nosso povo e não de meia dúzia de transnacionais, ter convocado a União Nacional de Estudantes (UNE) para erguer a mesma bandeira que a entidade empunhou há cerca de 60 anos, ao lado de centenas de outras organizações e movimentos – “O petróleo é nosso”.
A sinalização do presidente é bem-vinda e, se for mesmo para valer, ele encontrará respaldo da classe trabalhadora e do povo. A primeira prova disto está no encarte de quatro páginas que publicamos nesta edição, bancado por algumas dezenas de entidades populares, já articuladas em torno da palavra de ordem “O petróleo tem que ser nosso”.
É que, há vários meses já se formou no Rio de Janeiro (RJ), o Fórum Nacional em Defesa do Petróleo – composto por todos os sindicatos de petroleiros, movimentos da Via Campesina, Entidades da Assembléia Popular, CMS, movimentos e entidades estudantis, visando levar uma luta, no longo prazo, pela recuperação da nossa soberania sobre o petróleo brasileiro, rompida desde 1997, quando o governo do então presidente tucano Fernando Henrique Cardoso fez aprovar a Lei do Petróleo (nº 9.478), quebrando 44 anos de monopólio estatal do setor.
Pressões, invasões, desestabilizações e intimidações da Casa Branca
Mais que em qualquer outro caso ou momento, a mobilização e organização dos trabalhadores e do povo mostram-se indispensáveis na questão do petróleo e da descoberta da/s jazida/s do pré-sal.
A pressão dos sucessivos governos estadunidenses sobre os países latino-americanos no sentido de incrementarem a exploração, produção e exportação de energia, remonta ainda à “Crise da Opep” (Organização dos Paíse Exportadores de Petróleo), em 1973, quando ficou clara a dependência dos EUA (que consome um quarto da produção mundial) dos mercados petroleiros.
No entanto, será a partir do começo deste milênio, que Washington passa a se declarar em crise de segurança energética. Assim, a questão do petróleo e do gás torna-se cada vez mais aguda, e irá subjazer às invasões do Afeganistão e do Iraque, bem como às sucessivas desestabilizações, orquestradas pelos EUA, de governos como o do presidente Hugo Chávez na Venezuela, e do presidente Evo Morales na Bolívia.
Há poucos meses, Washington reativou sua Quarta Frota Naval (Comando Sul) – medida claramente intimidatória contra todo o continente. A esse respeito, é importante registrarmos algumas questões: a 4ª Frota voltou a patrulhar os nossos mares antes de ser/em conhecida/s (pelo menos oficial e publicamente) a/s nossa/s jazida/s do pré-sal. Ao lado disto, nãso esquecemos que, durante o regime do pós-1964, os EUA realizaram um exaustivo levantamento aerofotogramétrico (com mapeamento de todo o subsolo) de nosso território. Além do mais (fato por nós já denunciado) a empresa estadunidense Halliburton tem sob seu controle todo o arquivo de dados sobre petróleo da Agência Nacional de Petróleo (ANP).
Que sistema construir no pós-neoliberalismo?
Por fim, é indispensável termos a clareza de que toda essa movimentação em torno do pré-sal acontece exatamente no momento em que não apenas aderna e vai a pique a economia estadunidense, mas também todas as premissas do ciclo neoliberal, o que levará o sistema capitalista – em nível internacional – a se desorganizar e ter de se reorganizar em novo ciclo (estrutura) que continue a permitir a realização ampliada do capital.
Nesse quadro, não devemos subestimar a advertência de João Antônio Moraes, da Federação Única dos Petroleiros (FUP), integrante do Fórum Nacional em Defesa do Petróleo. Chamando a atenção para a importância estratégica, em termos geopolíticos, de o país se tornar uma potência em extração de combustível, ele afirma: “(...) Antigamente dizíamos que pior que nascer num país pobre, é nascer num país pobre com petróleo, pois além de o cidadão sofrer com a pobreza, ele sofre com as mazelas das guerras do império. Esperamos que o Brasil não siga essa regra”. (Pág. 3 – Encarte)
No editorial “Como os trabalhadores e o povo podem vencer a crise dos EUA”, da nossa edição nº 258 (7 a 13 de fevereiro de 2008), apontamos que, a partir daquele momento, a crise do império (a crise do capitalismo) tonava-se “o eixo central para que os trabalhadores e o povo construam suas estratégias, táticas e programas, buscando os instrumentos adequados para enfrentá-la”. Hoje, acrescentamos: ainda que a crise continue sendo, mais que nunca, o centro para a construção da política dos trabalhadores, em nosso país, a especificidade dessa crise é o fato dela acontecer exatamente num momento onde é descoberta uma jazida de petróleo que, na pior das hipóteses, quadruplicaria as nossas reservas provadas; e que nas estimativas mais triunfalistas nos levaria à posição de maior detentor de reservas provadas do mundo, superando de longe a Arábia Saudita. Ou seja, a crise do capitalismo e o pré-sal são as coordenadas que devem balizar a estratégia da classe trabalhadora no Brasil e do nosso povo, no sentido de acúmulo para a construção de sua hegemonia que deverá suceder o neoliberalismo.
(Brasil de Fato, 11/09/2008)