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etanol política ambiental dos eua
2008-09-12

Duas notícias do mês de agosto interessam ao desenvolvimento do mercado de etanol. A mais importante veio dos Estados Unidos: a Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês) norte-americana anunciou dia 7 a decisão de não alterar o volume de biocombustíveis — em especial, de etanol de milho — que o país deve, por lei, misturar anualmente ao diesel e à gasolina. Em abril, o governador do Texas, Rick Perry, havia pedido que a EPA cortasse o volume obrigatório de biocombustíveis para conter a alta do preço dos grãos no mercado nacional. A iniciativa recebeu o apoio de companhias petrolíferas e empresas produtoras de carne, frango e ovos, muito numerosas no Estado.

A EPA tinha até 24 de julho para resolver se aceitaria ou não o pedido de Perry. Faltando dois dias para o fim do prazo, o administrador da EPA, Stephen L. Johnson, comunicou que a agência precisaria de mais tempo para chegar a uma conclusão. Motivo: a análise dos mais de 15 mil comentários sobre o assunto enviados pelos norte-americanos à EPA ainda não havia terminado. Johnson esperava resolver a questão no início de agosto — e foi o que aconteceu. A EPA disse não ter encontrado evidências de que o etanol e o biodiesel afetem gravemente a economia do Texas ou da nação. E, mesmo se essas evidências existissem, a agência concluiu que a diminuição do volume obrigatório de biocombustíveis teria apenas impacto secundário sobre o preço dos grãos no país.

A outra notícia do mês foi o lançamento da primeira minuta internacional de normas para produção sustentável de biocombustíveis, ocorrido dia 13 em Lausanne, na Suíça. Preparada pela Mesa Redonda sobre Biocombustíveis Sustentáveis, iniciativa com mais de 300 membros em todo o mundo — governos, empresas, fazendeiros, cientistas, organizações não governamentais —, a minuta lista 12 critérios para evitar que a produção de biocombustíveis interfira no preço dos alimentos, estimule o desmatamento de florestas, provoque mudanças no uso da terra e emita mais gases causadores do efeito estufa. Interessados no assunto terão 90 dias para manifestar-se sobre os critérios. Depois da aprovação da versão final do documento, esperada para o início de 2009, os critérios não se tornarão compulsórios, mas certamente ajudarão a abrir mercados para os produtores que os respeitarem.

Decisão da EPA
Nos Estados Unidos, o volume de etanol e biodiesel que tem de ser adicionado aos combustíveis fósseis aumenta anualmente: para 2008, são 9 bilhões de galões (cerca de 34 bilhões de litros); para 2009, 11,1 bilhões de galões (cerca de 42 bilhões de litros). O mandato consta da Norma de Combustíveis Renováveis (RFS, na sigla em inglês), estabelecida pela Lei de Política Energética, de 2005, e revista pela Lei de Independência e Segurança Energética, de dezembro de 2007. A primeira legislação autoriza a EPA a alterar a RFS caso entenda que o cumprimento da norma poderá afetar severamente a economia ou o meio-ambiente. Foi nesse ponto que o governador texano baseou-se para solicitar a redução da mistura obrigatória para 4,5 bilhões de galões (cerca de 17 bilhões de litros) entre 1º de setembro de 2008 e 31 de agosto de 2009.

"Após examinar os fatos, ficou claro que o pedido não satisfazia os critérios da lei", afirmou o administrador da EPA ao divulgar a decisão da agência. "A RFS continua sendo uma importante ferramenta em nossos crescentes esforços para reduzir as emissões de gases do efeito estufa dos Estados Unidos e diminuir nossa dependência do petróleo estrangeiro, de maneiras agressivas porém práticas", completou.

A agência consultou os Departamentos de Energia (DOE, na sigla em inglês) e de Agricultura, como determina a legislação norte-americana. Em junho passado, o DOE calculou que o preço do galão de gasolina (equivalente a 3,785 litros) subiria de US$ 0,20 a US$ 0,35 se não houvesse a adição de etanol de milho ao combustível. Outra estimativa do departamento mostrou que os Estados Unidos teriam de consumir 7,2 bilhões de galões de gasolina (cerca de 26,5 bilhões de litros) a mais em 2008 se não existissem os biocombustíveis, o que representaria um aumento de 5% em relação ao consumo previsto para o ano.

Repercussão
"O DOE está contente em ver que o processo disposto na lei foi efetivamente administrado e aprecia a diligência de nossos colegas da EPA em fazer essa determinação", declarou o secretário de energia dos Estados Unidos, Samuel W. Bodman. "Estamos buscando veículos híbridos que possam ser conectados na tomada, tecnologias de veículos avançados, biocombustíveis celulósicos avançados de fontes não alimentícias, motores a combustão mais eficientes e, no longo prazo, células a combustível de hidrogênio para ajudar a mudar o modo como abastecemos nossos veículos", acrescentou.

O departamento afirma já ter investido mais de US$ 1 bilhão desde 2007 na pesquisa e demonstração de tecnologias para produção sustentável e competitiva de biocombustíveis de segunda geração — ou seja, baseados em matérias-primas que não servem como alimento, como cavacos de madeira, palha de trigo e até lixo municipal.

A Associação dos Combustíveis Renováveis (RFA, na sigla em inglês) também aplaudiu a resposta da EPA à solicitação do Texas. "Esta é uma vitória importante para todos os norte-americanos", afirmou o presidente da entidade, Bob Dinneen. "Se a EPA tivesse concordado com o pedido de corte, nossa dependência da importação de petróleo teria aumentado. Além disso, tal decisão teria sabotado o desenvolvimento e crescimento de novas tecnologias e da indústria de biocombustíveis celulósicos."

O presidente da Federação Nacional do Peru, Joel Brandenberger, comentou a resolução da EPA em entrevista ao jornal The New York Times, que publicou matéria sobre o assunto na Internet (7 de agosto) e na versão impressa (8 de agosto). "A inflação dos alimentos que vocês viram agora, pelo menos no setor de carne e aves, provavelmente é branda em comparação com o que pode ocorrer no futuro", alertou ele. Segundo o jornal, a inflação dos alimentos nos Estados Unidos está em torno de 8,1% ao ano.

Biocombustíveis sustentáveis
A minuta de normas para produção sustentável de biocombustíveis, batizada de "Versão Zero", resulta de um ano de discussões. Nesse período, os membros da Mesa Redonda sobre Biocombustíveis Sustentáveis participaram de quatro reuniões presenciais, realizadas no Brasil, na China, na África do Sul e na Índia, e de cerca de 50 teleconferências de grupos de trabalho e grupos de especialistas. Os interessados também enviaram seus comentários para o site e para a Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL, na sigla em francês). Os 12 critérios listados no documento tratam de 11 temas: legalidade; consultas, planejamento e monitoração; emissões de gases do efeito estufa; direitos humanos e do trabalho; desenvolvimento rural e social; segurança alimentar; conservação; solo; água (há dois critérios referentes a esse tema); eficiência econômica, tecnologia e melhoria contínua; e direitos sobre a terra. A descrição completa dos critérios está disponível em português no site da EPFL.

Em reportagem publicada dia 13 de agosto, o Valor Econômico revelou que o terceiro critério, segundo o qual os biocombustíveis devem "contribuir para a mitigação das mudanças climáticas por meio da significativa redução das emissões dos gases do efeito estufa em comparação com os combustíveis fósseis", foi o mais aguardado pelos compradores de biocombustíveis. "Isso tem a ver com produtividade", disse ao jornal Roberto Smeraldi, diretor da organização não governamental Amigos da Terra-Amazônia Brasileira, que faz parte da Mesa Redonda sobre Biocombustíveis Sustentáveis. "Quais as culturas que necessitam mais fertilizantes derivados do petróleo? De que adianta ter um biocombustível que emite tanto ou mais carbono para ser produzido?", questionou ele.

Também entrevistada pelo Valor, a francesa Geraldine Kutas, assessora internacional da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), disse que existiam desequilíbrios na Mesa Redonda sobre Biocombustíveis Sustentáveis, formada há 18 meses. "Não havia nenhum representante de produtores de países em desenvolvimento", comentou. "Queríamos fazer sugestões a esses critérios. Temos necessidades diferentes." Segundo ela, uma das ações da Unica, que aderiu ao grupo em maio passado, foi lembrar que sustentabilidade também significa viabilidade econômica. A observação foi aproveitada no 11º critério da minuta, cujo enunciado diz o seguinte: "Os biocombustíveis devem ser produzidos do modo mais econômico. O uso de tecnologia deve melhorar a eficiência da produção e o desempenho social e ambiental em todos os estágios da cadeia de valor dos biocombustíveis". (R.B.)

(Inovação Unicamp, 10/09/2008)


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