A questão sobre a responsabilidade ambiental do Poder Público é bastante controversa em nossa doutrina. Referida controvérsia gira em torno dos critérios para a distinção da força maior, do caso fortuito, e a possibilidade de acolhimento deste último como causa excludente da responsabilidade do Estado, bem como a possibilidade de as concausas atenuarem a responsabilidade do Estado.
Sobre o assunto, dois são os entendimentos: o primeiro, de que a responsabilidade do Estado por conduta omissiva é de natureza subjetiva, de acordo com o disposto no artigo 15, do antigo Código Civil, sendo, portanto, a responsabilidade de natureza objetiva, apenas aquelas originadas por condutas comissivas. O segundo entendimento, no entanto, defende a teoria da responsabilidade objetiva tanto para a conduta comissiva como para a omissiva, fundamentando-as no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal.
Tal divergência advém do fato da Constituição Federal, em seu artigo 37, parágrafo 6º, não ter diferenciado ambas as condutas – comissivas e omissivas. Assim, o vocábulo “causarem”, do citado dispositivo, apresenta sentido amplo e deve ser entendido como “causarem por ação ou omissão”.
No entanto, verifica-se que o entendimento doutrinário majoritário é de que a responsabilidade do Estado é objetiva, ou seja, advém independente da existência de culpa. Deve ser entendida, portanto, como a obrigação incumbida ao Estado de reparar economicamente os danos causados a outrem e que lhe sejam imputáveis em decorrência de comportamentos unilaterais, lícitos ou ilícitos, comissivos ou omissivos.
No tocante ao contra-argumento sobre o preceito da igualdade de todos ante os ônus e encargos públicos, também denominado “solidariedade”, se, de fato, todos se beneficiam com a atividade da Administração, nada mais lógico que todos (sociedade) compartilhem com o ressarcimento pelos danos que essa atividade tenha causado à um ou mais indivíduos.
Tal evolução doutrinária originou-se exatamente com o objetivo de evitar que o lesado tivesse de provar a culpa do agente, ampliando assim o seu amparo frente ao Leviatã (Estado).
Portanto, o Estado responde objetivamente, sempre que demonstrado o nexo de causalidade entre o dano e a atividade funcional do Estado ou do agente estatal. Eventual discussão sobre culpa ou dolo somente será aceita em ação regressiva do Estado contra o agente causador do dano. Importante frisar, que não é apenas a ação que produz dano, mas também a omissão do agente público pode causar prejuízo ao particular, bem como à própria Administração.
No tocante a responsabilidade extracontratual do Estado por danos causados ao meio ambiente, o sistema de responsabilidade civil por danos causados ao meio ambiente, introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei nº 6.938/81, definiu a responsabilidade objetiva do poluidor pelos prejuízos ambientais e, além do mais, facilitou a ampla responsabilização de pessoas físicas e jurídicas, de direito privado e público, direta ou indiretamente causadoras de degradações do ambiente.
Tal ampliação nas possibilidades de sujeitos responsáveis adveio com a noção de “poluidor’ adotada pelo legislador no artigo 3°,IV, da Lei nº 6.938/81, como “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental”, disciplinando aqui também, a responsabilização solidária de todos aqueles que, de alguma forma, direta e/ou indiretamente, realizam condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.
Extrai-se, portanto, ao menos em tese, a possibilidade de se responsabilizar o Poder Público pelos danos causados ao meio ambiente, mesmo nas hipóteses em que ele não se apresenta como causador direto do dano, seja devido à sua omissão em fiscalizar as atividades potencialmente poluidoras e/ou degradadoras do meio ambiente, seja por não ter agido para impedir a ocorrência da degradação ambiental, ou, seja em função do indevido licenciamento de empreendimentos poluidores/degradadores.
Vale lembrar que a responsabilidade é inerente a lógica do Estado de Direito, onde todos estão subsumidos ao império das leis. Além da legalidade, devem ser observados os princípios da igualdade e da justiça, de modo que o individuo causador de um dano à terceiro fica obrigado à sua imediata reparação.
Portanto, como o meio ambiente é um bem jurídico de terceira geração, nada mais justo que essa garantia seja plenamente respeitada e garantida pelo Estado aos particulares, além do dever constitucional imputado ao Estado de preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Muito embora alguns doutrinadores preconizem que o Estado não pode ser considerado um segurador universal, nada mais justo a aplicação do principio da igualdade e da equidade social também para a tutela ambiental.
(Por Renata Franco de Paula Gonçalves Moreno*,
Consultor Jurídico, 10/09/2008)
*Renata Franco de Paula Gonçalves Moreno é advogada, especialista da área ambiental do escritório Emerenciano Baggio e Associados Advogados.