Houve bloqueio de estradas, invasões e protesto diante de repartições públicas ligadas à reforma agráriaPara lembrar o Dia Nacional do Trabalhador Rural, os sem-terra voltaram ontem a promover uma onda de manifestações pelo País. Cerca de 10 mil pessoas, espalhadas em 9 Estados, foram mobilizadas em ações que envolveram bloqueio de estradas, invasões de propriedades e atos de protesto diante de prédios de repartições públicas ligadas à reforma agrária. Os manifestantes exigiam sobretudo o aceleramento dos processo de desapropriação de terras, a criação de assentamentos rurais e a redução das dívidas dos pequenos agricultores.
Em Pernambuco, militantes do Movimento dos Sem-Terra (MST) bloquearam o tráfego da BR-101, na altura do município de Escada, na região da Zona da Mata. No mesmo Estado, 2 mil pessoas fecharam a ponte que vai de Petrolina à vizinha cidade de Juazeiro, na Bahia.
Houve invasões em São Paulo, Pernambuco e Alagoas. No Paraná, em 14 cidades, mil integrantes do MST montaram acampamentos diante de agências do Banco do Brasil. Em Curitiba, eles protestaram contra a lentidão da reforma agrária, na frente da sede regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
No Rio Grande do Sul, militantes do MST e do Movimento dos Pequenos Agricultores mantiveram o acampamento montado no pátio de acesso ao prédio da Receita Federal, obrigando a suspensão do atendimento ao público.
Outro grupo, acampado no Parque Harmonia, no centro da capital gaúcha, promoveu uma marcha pela cidade, até a agência central da Caixa Econômica Federal, onde entregou um documento com reivindicações. A principal delas é a redução de 70% das dívidas dos agricultores. "Isso deve ser considerado como investimento na agricultura", explicou um dos coordenadores do MST no Estado, Cedenir de Oliveira.
Em Campos dos Goytacazes, na região norte do Estado do Rio, integrantes do MST também se dirigiram a uma agência da CEF e a mantiveram sob ocupação até serem recebidos pelo superintendente da instituição. Eles pediram a liberação de recursos para financiar lavouras e habitações e cobraram mais crédito agrícola.
De acordo com a assessoria do banco, o financiamento para as casas não foi liberado porque o movimento ainda não apresentou a documentação sobre os imóveis - não teria informado quantas casas serão construídas nem exibido plantas assinadas por engenheiros.
No Rio Grande do Norte, estudantes ligados ao MST ocuparam a sede regional do Incra. Eles cobravam a liberação de recursos federais para escolas e projetos educacionais dos assentamentos.
GREVEDe maneira indireta, as manifestações refletiram a greve dos funcionários do Incra, que já dura mais de dois meses. A paralisação tem provocado atrasos na liberação de créditos e até de cestas básicas para famílias acampadas e assentadas.
Segundo uma nota divulgada ontem pelo Fórum Nacional da Reforma Agrária, que reúne 47 entidades, o Brasil é um dos poucos países que não realizaram a reforma agrária. Isso, segundo integrantes do fórum, provoca "uma contradição entre os avanços tecnológicos no campo da produção e o crescente avanço da pobreza rural, que, aliado ao êxodo, tem influenciado de forma definitiva a situação de milhões de trabalhadores no campo e na cidade".
A Via Campesina, organização internacional representada no Brasil pelo MST, divulgou nota lembrando que na safra 2007/2008 o governo deve liberar R$ 58 bilhões para o agronegócio, "ao passo que a agricultura camponesa receberá R$ 12 bilhões". A nota lembra ainda que "há aproximadamente R$ 40 bilhões em dívidas acumuladas pelos ruralistas, negociadas nos anos anteriores - só os juros não pagos destas dívidas ultrapassam os R$ 4 bilhões por ano, mais do que o governo disponibiliza para toda a reforma agrária".
(Por Roldão Arruda
, O Estado de S. Paulo, 09/9/2008)