Antes de chegar a Cannes e arrebatar o prêmio de melhor atriz para Sandra Corveloni, em maio, o filme "Linha de Passe", de Walter Salles, liberou na atmosfera pelo menos 118.164 toneladas de CO2 equivalente, unidade de medida padrão para os gases do efeito estufa. A produtora do filme, que estreou na sexta-feira (5) em todo o país, pretende agora compensar essas emissões com o plantio de três hectares de floresta e a conservação de outros dois.
A lógica da compensação é que as árvores, ao crescerem, fixam carbono retirado da atmosfera em forma de biomassa (tronco, folhas e raízes, por exemplo). O gás carbônico é o principal responsável pelo aquecimento global, e compensações desse tipo têm virado uma febre entre as empresas.
O reflorestamento ocorrerá no parque estadual da Pedra Branca, na zona oeste do Rio - apesar de o filme ter sido rodado na periferia paulistana. "A preservação de uma área no Rio, em São Paulo ou na Amazônia é uma ação que acaba afetando positivamente o país como um todo", justifica Salles.
O diretor ressalta ainda que, com a iniciativa, não está apenas neutralizando as emissões de "Linha de Passe", mas também de projetos futuros da Videofilmes. É que cada hectare será capaz de seqüestrar em média 380 toneladas de carbono por ano, bem acima do total emitido durante as filmagens.
Responsabilidade - O cálculo é da Secretaria de Estado do Ambiente do Rio. O órgão está por trás da parceria firmada com o cineasta, que inaugura o chamado Parque do Carbono. O projeto prevê a recuperação de áreas degradadas pela iniciativa privada. Segundo a secretária Marilene Ramos, une o interesse estatal de resgatar a cobertura vegetal nativa à estratégia privada de compensar sua parcela de culpa no aquecimento global.
Culpa que Salles parece já ter reconhecido. "O fato de o cinema ser uma atividade cultural não o isenta de responsabilidades em outras áreas. Poluímos como qualquer outra atividade, porque utilizamos meios de transporte para levar os equipamentos e buscar atores, utilizamos eletricidade e química para revelar o negativo etc.", explica. "Para parafrasear (o filósofo Jean-Paul) Sartre, a gente sempre tende a achar que o inferno é o outro. Na verdade, nós somos parte do problema."
O plantio está previsto para começar em 21 de setembro, Dia da Árvore. Será conduzido pela Fundação de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, sob orientação e supervisão do Instituto Estadual de Florestas, ligado à secretaria. Segundo Ramos, serão plantadas cerca de 9.000 mudas de árvores nativas.
Valor - A recuperação e a conservação da área custará a Videofilmes R$ 150 mil. O valor, que não foi incluído no orçamento do "Linha de Passe", representa menos de 3,5% do custo total do longa, de R$ 4,5 milhões, e será desembolsado ao longo dos próximos quatro anos. Nesse período, explica Ramos, a empresa contratada pela produtora terá que zelar pelo crescimento das mudas, substituindo as que não vingarem.
"A compensação das emissões só ocorre depois de muitos anos", justifica a secretária. "É preciso garantir que as árvores cresçam sem problemas."
(Por Denise Menchen/ Folha Online,
Ambiente Brasil, 08/09/2008)