Que festa! Os industriais e cientistas da energia fotovoltaica não param de se surpreender: nunca foram tantos em uma reunião. A 29ª Conferência da Energia Solar Fotovoltaica, que terminou nesta sexta-feira (5) em Valência (sul da Espanha), reuniu mais de 4 mil pesquisadores e mil expositores. Essa afluência reflete um mercado que explodiu há vários anos, depois da instauração na Alemanha em 2000 de uma tarifa de recompra vantajosa da eletricidade produzida pelos painéis solares.
Um aumento de 40% ao ano das capacidades instaladas no mundo, um faturamento mundial de 24 bilhões de euros, uma capacidade de produção instalada de 3.800 MWc em 2007: a energia fotovoltaica saiu da marginalidade. E as perspectivas são mais que animadoras: os analistas financeiros vêem o mercado passar para 5.000 MWc em 2008, 7.000 em 2010 e até 20.000 em 2012.
Mas com a maturidade poderia ocorrer a primeira crise: "Podemos chegar a uma situação em que produzimos mais do que o mercado pode absorver", advertiu Winfried Hoffmann, vice-presidente da Associação da Indústria Fotovoltaica Européia (Epia, na sigla em inglês). Poderia portanto haver uma "consolidação do setor", isto é, o desaparecimento de várias empresas em um mercado que assumiu ares de corrida do ouro. Segunda conseqüência, mais favorável: uma queda do preço, permitindo aumentar a demanda.
"O problema é que o mercado está concentrado em cinco países: Alemanha, EUA, Espanha, Japão e Itália", observa Ernesto Macias, presidente da Epia. "E se a Europa garante 75% do consumo, cobre apenas 24% do abastecimento. Os outros países deveriam fazer esforços para desenvolver seus mercados." A China, claramente visada, garante uma parte crescente da produção de painéis solares - a Suntech tornou-se em poucos anos uma das maiores firmas do setor -, mas cujo consumo continua muito fraco, com 100 MW em 2007.
O setor fotovoltaico já está superaquecido? "A recessão econômica esfria o entusiasmo dos investidores", observa Stephan Droxner, analista do escritório LBBW. "E sentimos aumentar as críticas dos políticos sobre o custo das medidas de apoio ao setor fotovoltaico."
Na Espanha, o mercado deverá se contrair depois da decisão do governo de José Luis Rodríguez Zapatero de limitar a ajuda ao setor a 300 MWc instalados em 2009. Mas outros mercados poderiam decolar, principalmente a França, que adotou uma tarifa de recompra de 0,57 por quilowatt-hora (kWh): "A EDF foi ultrapassada pelo sucesso", observa Jean-Louis Bal, da Agência do Meio Ambiente e do Controle de Energia (Ademe na sigla em francês). "Ela trata 800 ligações de instalações solares à rede todo mês."
Se a energia solar tiver de atravessar uma crise de crescimento, deverá ser apenas passageira. O recurso é imenso: "É dez mil vezes superior ao consumo elétrico atual da humanidade", observa o pesquisador Jean-François Guillemoles. "E é uma quantidade inesgotável para milhões de anos."
Paridade com a rede até 2020
Daniel Lincot, presidente do comitê científico do congresso de Valência, completa: "Em média na França 1 metro quadrado de solo recebe por ano 1 megawatt-hora. Se recuperarmos 10% dessa energia, representa 16 litros de petróleo; 5 mil quilômetros quadrados garantiriam todo o consumo elétrico do país, ou seja, 540 terawatts-hora". Para seus promotores, a energia solar é a energia do futuro. Segundo Hans-Josef Fell, deputado no Parlamento alemão, "o fotovoltaico tem a capacidade de substituir em algumas décadas a energia nuclear na Alemanha".
Essas perspectivas ainda pertencem, porém, ao domínio do sonho: o custo de produção da eletricidade fotovoltaica continua muito elevado, chegando conforme o país a 0,30 ou 0,60 euro por kWh. No entanto, os especialistas estimam que a "paridade com a rede", isto é, a igualdade entre o custo de produção de um kWh por uma casa equipada e o preço faturado pela rede para fornecer esse kWh à casa, será atingida até 2020. A pesquisa avança rapidamente, enquanto o desenvolvimento da indústria faz baixar os preços por economia de escala. Também há imensas possibilidades na eletrificação rural dos países pobres.
O setor deverá, porém, levar em conta o meio ambiente, que não se reduz à ausência de emissões de gás carbônico. "Podemos razoavelmente equipar a Europa com 50.000 MW em fotovoltaico", afirma Wolfgang Palz, que pilotou até 2002 as energias renováveis na Comissão Européia. "Mas não devemos nos enganar: isso significa painéis por toda parte. Será preciso buscar uma boa integração. Mas os industriais que querem dinheiro fácil não tentam fazer fotobaterias bonitas."
Se o fotovoltaico tem vocação para equipar os tetos dos edifícios, também pode passar por centrais que ocupam uma grande superfície no solo. Mas será preciso demonstrar que é o melhor uso que podemos fazer dele.
Os atores do solar garantem que sua preocupação é altruísta: "Existe um caráter de urgência que dá uma particularidade a essa comunidade", afirma Daniel Lincot. "Queremos resolver um problema coletivo, e não simplesmente produzir mais coisas, como outros setores como o automobilístico ou o de telas planas."
Referências
Uma energia limpa: a energia solar tem a vantagem de não emitir gases de efeito estufa e de não produzir dejetos. Ela pode ser captada segundo dois métodos: no solar passivo, a energia solar aquece um líquido cujo calor é utilizado para calefação ou para fazer girar uma turbina; no solar fotovoltaico, a energia solar excita um material condutor, produzindo eletricidade. Um lugar ainda marginal: a capacidade fotovoltaica instalada no mundo é da ordem de 10.000 MWc e fornece menos de 1% da produção elétrica mundial.
(Por Hervé Kempf, Le Monde, UOL, 06/09/2008)