A notícia de que o governo espanhol prepara um decreto que reduzirá drasticamente a instalação de energia solar fotovoltaica provocou uma forte reação de ecologistas, sindicatos e empresas do setor, que rechaçam qualquer medida negativa para essa fonte alternativa. O rascunho do decreto estabelece não apenas uma redução da instalação de centrais fotovoltaicas, mas também uma acentuada redução do subsídio concedido às empresas fabricantes.
“Isto causa indignação, o que deveria fazer o governo é apoiar a luta para reduzir a emissão de gases contaminantes e as instalações nucleares, que são perigosas, e não agir contra a energia limpa”, disse à IPS o ativista José Luis García, responsável por energia e Mudança Climática da organização Greenpeace na Espanha. “Tivemos uma desagradável surpresa, o anúncio do governo chega exatamente quando se está demonstrando que esta energia é uma opção real e avalizada de maneira sem precedentes, já que está dando soluções práticas e crescentes na luta contra a mudança climática”, concluiu García.
Rodrigo Morel, diretor da empresa de energias renováveis Eclareon, disse à IPS que é compreensível que se aplique reduções aos subsídios, “mas não de maneira tão drástica”, porque, além de reduzir a cota de produção energética, levará ao desemprego de um quarto do pessoal que trabalha no setor, que já conta com cerca de 50 mil trabalhadores. Além disso, na geração de energia fotovoltaica foram investidos 1,5 bilhão de euros (cerca de US$ 2,3 bilhões), acrescentou.
Após o anúncio do governo, as duas centrais sindicais majoritárias, a União Geral de Trabalhadores (UGT, pró-socialista) e a Comissões Operarias (CCOO, pró-comunista) ser pronunciaram de maneira enérgica. “A Espanha deve manter sua aposta em ser um dos líderes mundiais no desenvolvimento da energia fotovoltaica, uma das fontes de energia com maior potencial de todas, e uma das melhores opções do país para lutar contra o aquecimento global e reduzir sua dependência energética”, afirmaram em um comunicado conjunto, também assinado por organizações não-governamentais e associações empresariais.
A drástica mudança de posição do governo, que passou de apoio a abandono desta indústria, se manifesta enquanto acontece, desde segunda-feira, na Comunidade de Valencia, sudeste do país, a 23ª Conferência e Feira Européia da Energia Solar Fotovoltaica, da qual participam 60 companhias espanholas entre um total de 3.500 empresas de 25 países. Dezenas de cientistas de todo o mundo assinaram nessa reunião, que termina hoje, um documento indicando que a fonte solar “é uma solução-chave para a produção sustentável de energia”.
Por essa razão, exortam que seja produzida “uma forte ação em nível internacional para acelerar a produção solar e seu enriquecimento através de programas de pesquisa, desenvolvimento, cooperação e educação”. Sergio Macías, presidente da Associação Européia da Energia Fotovoltácia, garantiu em Valencia que o uso maciço desta fonte nas residências será uma realidade em 2015 e que para isso é preciso manter a atual legislação, e não modificá-la, como pensa fazer Madri. Macías também disse que esta fonte alternativa se vê ajudada pelos elevados preços do petróleo, do gás e do urânio.
Outro presente à reunião, o representante da empresa fotovoltaica Siliken, Carlos Navarro, alertou que se o governo concretizar sua decisão a sua empresa poderá se mudar para um país do Sul em desenvolvimento. O rascunho do decreto que será publicado ainda este mês propõe uma cota de instalação anual de 300 megawatts até 2009. Dois terços dessa quantidade corresponderiam a instalações sobre telhados e um terço ao nível do solo. Juan Laso, presidente da Associação Empresarial Fotovoltaica, lembrou que esses números contradizem totalmente o que se está fazendo. Ao finalizar 208, estarão instalados 1.200 megawatts, afirmou.
Representantes das empresas se reuniram na quarta-feira com o secretário-geral da Energia, Pedro Marin, mas não conseguiram compromissos de mudanças no texto do decreto. “Não houve nenhuma sensibilidade em relação à nossa posição”, afirmou Laso ao sair do encontro. A Associação da Indústria Fotovoltácia, a Associação de Produtores de Energias Renováveis, CCOO, Ecologistas em Ação, Greenpeace Espanha, UGT e a filial espanhola do Fundo Mundial para a Natureza exortaram o governo a modificar sua proposta, “de modo a evitar um grave golpe em um setor caracterizado por seu dinamismo e sua inovação, que pode provocar o fechamento de numerosas empresas e é um insólito passo atrás na luta contra a mudança climática”.
Estas entidades se referiram também a outra provisão do decreto, a limitação do mercado solar a apenas 300 megawatts até 2009, o que seria “70% menos do volume de mercado existente entre janeiro e setembro deste ano de 2008. Esta brusca redução de atividade, contrária à política de fomento das energias renováveis e à defesa do meio ambiente, representará um duro golpe no setor fotovoltaico espanhol que as organizações signatárias consideram desnecessário e excessivo”.
Mas, nem tudo parece perdido. Ao chegar à cidade de Santander para pronuncia ruma conferência, o ministro da Indústria, Miguel Sebastián, disse a jornalistas que o rascunho do decreto não é definitivo e que o novo contexto será “razoável dentro do que significa a sustentabilidade econômica e tecnológica”.
(Por Alicia Fraerman, Envolverde, IPS, 05/09/2008)