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desmatamento da amazônia amazônia passivos da pecuária
2008-09-08
Ministro do Meio Ambiente pretende 'interagir fortemente' com internautas


Para o ministro, informações sobre desmatamento ainda são dispersas.

O carioca Carlos Minc Baumfeld, de 57 anos, completou, no dia 3, cem dias à frente do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Antes mesmo de assumir a pasta, já chamava atenção com declarações enfáticas, como "Tremei, poluidores".

Nesta entrevista exclusiva, em Brasília, Minc fala de sua expectativa em relação à vigilância da floresta amazônica que os internautas farão por meio do portal Globo Amazônia. Ele também avalia a atuação de seu ministério na região e detalha o que chama de “estilo diferente” de sua gestão, comparada à da antecessora, Marina Silva. O ministro faz uma promessa: aumentar a fiscalização nas áreas de conservação, que incluem Florestas e Parques Nacionais e Reservas Extrativistas.


Globo Amazônia: O que o senhor acha do mapa do Globo Amazônia , que apresenta de forma clara os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) sobre a devastação na Amazônia?

Carlos Minc: Acho fundamental que o público tenha acesso a essa informação de forma sistematizada, simplificada e acessível. As pessoas têm interesse e querem fazer alguma coisa. As informações são dispersas. Ter isso sistematizado com fotos, programas, números é um instrumento de cidadania e de exercício do amor à ecologia.

Nós, ministério e órgãos ambientais, temos o dever de dar resposta a essas demandas, de apurar essas denúncias. Pretendemos interagir fortemente com o público que acessar este portal.

Globo Amazônia: O Ibama faz uso regular das imagens de satélite do Inpe para ações práticas?

Minc: Toda ação do Ibama tem se guiado pelas imagens de satélite do Inpe, que são de ótima qualidade, e de um satélite japonês muito bom, que atravessa as nuvens.

Globo Amazônia: A Floresta Nacional de Jamanxim, no Pará, que apresenta muitos focos de incêndio, é um exemplo de unidade de conservação em que não há autoridade para tomar conta. Ainda existem muitas unidades nestas condições? Há uma previsão de quando isso vá acabar?

Minc: Determinamos que as unidades que não têm fiscal, tenham. Em setembro, todas terão fiscal. Em Jamanxim, estivemos diretamente combatendo a queimada e determinamos a retirada de 4.200 cabeças de gado que estavam ali ilegalmente. Depois do leilão do boi pirata, esse gado foi retirado.

Operações de fiscalização na Amazônia precisariam dobrar, diz o ministro.

Globo Amazônia: O número de operações de fiscalização na Amazônia praticamente dobrou nos últimos tempos. Quantas seriam necessárias para ter um controle efetivo da região?

Minc: Passamos de 20 para 40 operações por dia. Deveríamos ter o dobro disso – 80 por dia. Ainda é insuficiente, apesar da boa parceria com a Polícia Federal. As equipes estão exaustas e o ritmo de criação de empregos sustentáveis está mais lento que o ritmo em que estamos conseguindo, por exemplo, fechar serrarias ou carvoarias ilegais.

Globo Amazônia: Os números de desmatamento apontados pelo sistema Deter, do Inpe, caíram de junho para julho e, em entrevistas, o senhor atribuiu isso ao aumento da fiscalização . Ela será mantida no mesmo ritmo? Que evolução podemos esperar do índice de desmatamento?

Minc: O desmatamento caiu por três anos no Brasil e começou a subir de novembro do ano passado para cá. A expectativa é que nesse ultimo período houvesse uma explosão, porque aumentou muito o preço da carne e da soja, e aumentou a pressão em cima dessas áreas. Conseguimos reduções nestes últimos três meses – maio, junho e julho. Foram reduções importantes, que farão com que neste ano, em que iria haver uma explosão, provavelmente vá haver um aumento modesto.

Agora, todos os instrumentos que usamos não são suficientes. O desmatamento pode aumentar apesar deste esforço, porque você fecha uma serraria em uma hora, mas não cria 50 empregos em uma hora. O que está atrasado é o “Arco Verde” - todas as alternativas para criar empregos sustentáveis no extrativismo, no manejo florestal, na tecnologia limpa. Este é o desafio...

"Você fecha uma serraria em uma hora, mas não cria cinqüenta empregos em uma hora."

Globo Amazônia: Então, quais são as iniciativas de criação de atividades econômicas sustentáveis que têm dado certo e devem ser ampliadas?

Minc: Depois de muito tempo em banho-maria, começaram nas florestas públicas as licitações para uso sustentável. Você tem uma floresta, explora um quarenta avos a cada ano, e daqui a 40 anos a floresta está do mesmo tamanho. Produz-se madeira, móveis e armários, pagam-se salários, e a floresta fica do mesmo tamanho. A primeira licitação desta foi há dez dias. Faremos várias outras. A melhor forma de combater a madeira ilegal é o aumento da oferta da madeira legal de manejo.

Outra iniciativa importante é o extrativismo. Temos 56 reservas extrativistas. A maior parte destas pessoas vive na miséria. Agora vamos lançar preços mínimos dos produtos extrativistas, como castanha, borracha, cupuaçu, pequi, piaçava, açaí, e vamos valorizar a cadeia de produtos a partir dos produtos florestais. Com isso, vamos melhorar a renda, a vida e a defesa das florestas.

Globo Amazônia: Há quem diga que a Amazônia deveria ser uma mistura de Finlândia com Costa Rica, ou seja, ter uma indústria madeireira forte, mas regulamentada, e, por outro lado, dar muita ênfase à conservação e ao ecoturismo. O que o senhor acha dessa comparação?

"Amazônia não deve ser nem Finlândia, nem Costa Rica".

Minc: Acho que a Amazônia dever ser mesmo brasileira, nem Finlândia, nem Costa Rica. Agora, é claro que nós temos que cuidar dela. Não basta criar parques. Nós criamos muitos parques mas eles estavam muito mal cuidados. Tinham pouco turismo. Hoje, no Brasil, 3,5 milhões de pessoas visitam nossos parques. Nos EUA, são 192 milhões. E os nossos, modéstia à parte, são muito mais bonitos. Temos um grande potencial que não estava sendo usado. Até três meses atrás, 68 parques não tinham chefes e 121 parques não tinham um fiscal. Então não basta criar parques, temos que cuidar deles. Tudo isso está sendo feito agora.

Globo Amazônia: Como o senhor vê a presença estrangeira na Amazônia, tanto de ONGs como de empresas?

Minc: Temos que defender a Amazônia e garantir sua soberania. Por isso, junto com os ministérios da Defesa e da Justiça, resolvemos fazer um recadastramento de todas as ONGs estrangeiras, pois há as bem-intencionadas e as mal-intencionadas. Também faremos recadastramento de terras públicas a partir de um certo tamanho, compradas por estrangeiros. Vamos rever isso rapidamente para evitar qualquer ataque à soberania nacional.

Globo Amazônia: E o Fundo Amazônia ? Qual é o interesse dos outros países em participar?

Minc: Em relação ao Fundo Amazônia, é um fundo completamente soberano. Os países que doarem sequer têm assento no conselho que vai determinar para onde vai o recurso. É um fundo privado alocado no BNDES, em que há três componentes: os governos da Amazônia, o Governo Federal e a sociedade civil. O interesse dos países doadores é que o nosso compromisso é a redução progressiva do desmatamento, que interessa a todo o planeta.


Globo Amazônia: Os “bois piratas” só foram vendidos em leilão com um deságio de 60%. Há alguma outra destinação melhor para os animais apreendidos?

Minc: O decreto prevê que em áreas embargadas onde persista o crime ambiental, depois do processo administrativo e da ampla defesa, se leiloe o material apreendido e que esse recurso reverta para o Bolsa Família e para o incremento da própria fiscalização. Já fizemos seis leilões de madeira, dois de cereais e esse de gado. O de gado deu problema e nós só conseguimos vender na quarta tentativa.

Agora, nós leiloamos 3.500 cabeças, mas outras 35 mil saíram das unidades de conservação. Nosso objetivo não é vender gado e ganhar dinheiro. Nosso objetivo é proteger as unidades de conservação e combater a impunidade ambiental.

 
"Leiloamos 3.500 cabeças de gado, mas outras 35 mil saíram das unidades de conservação"

Globo Amazônia: O senhor defende que em algumas áreas já desmatadas da Amazônia seja plantado, por exemplo, o dendê para a produção de biodiesel. Não seria melhor recuperar a mata nativa nessas áreas?

Minc: A lei determina que as áreas degradadas têm que ser recuperadas na maior parte com floresta nativa. Essa é a nossa posição. A lei também prevê que, uma vez aprovado o zoneamento econômico ecológico do estado, uma parte das áreas degradadas seja recuperada com uma atividade produtiva. A lei permite isso e o plano diretor diz qual é o tipo de atividade. Então, por exemplo, se você tem uma grande área 100% degradada no Pará e obrigar o proprietário à recuperação exclusivamente com floresta nativa, ele não vai ter estímulo nenhum. Moral da história: não vai recuperar nada.

O dendê, o babaçu, o pinhão manso, além de serem árvores que recuperam o solo e absorvem o carbono, ainda geram combustível, o biodiesel, que é menos poluente.

Segundo Minc, seu ministério dá continuidade ao de Marina Silva, mas com "estilo diferente".

Globo Amazônia: Seu ministério é mais conciliador entre os diversos grupos de interesse na Amazônia ou é tão ambientalista quanto era considerado o da Marina Silva ?


Minc: Quero dizer que sou amigo e companheiro da Marina Silva há 25 anos. Nosso ministério é de continuidade, mas é uma continuidade em estilo diferente, agregando outras componentes. Por exemplo, simplificamos o licenciamento ambiental, com mais rigor. Através de uma série procedimentos, passamos o licenciamento ambiental para metade do tempo, mas muito mais rigoroso, com padrões de emissão mais rigorosos e exigência de contrapartidas, como, por exemplo, saneamento ambiental, adoção com recursos para manutenção de parques e reservas indígenas.

Globo Amazônia: As Forças Armadas não poderiam também ajudar no combate ao desmatamento?

Minc: Combinamos várias parcerias com o ministro (Nelson) Jobim, da Defesa. A primeira delas é que várias tropas que hoje estão no Sudeste irão para a Amazônia em torno de terras indígenas na área de fronteiras e também protegendo parques. A união entre ambientalistas e as Forças Armadas é uma realidade e vai se aprofundar.
 
"A união entre ambientalistas e as Forças Armadas é uma realidade e vai se aprofundar. "

Globo Amazônia: Qual deve ser o nível de ingerência do Ministério do Meio Ambiente na questão fundiária na Amazônia?

Minc: A questão fundiária é essencial. Sem regularização fundiária você não consegue fazer política pública. Se você não sabe quem é o dono da terra, quem é que você vai multar? A quem você vai dar crédito para reconstituir a reserva? Quem é que você vai obrigar a fazer a reserva legal, que no caso da Amazônia é de 80% e no caso do cerrado é de 35%? Temos trabalhado junto com os governos estaduais, junto com o Incra e junto com os institutos de terra. Por exemplo, com recursos nossos, o Pará e outros estados, estão computadorizando os dados dos cartórios. E vamos acelerar a regularização ambiental, ou seja, em vez de cada proprietário fazer o georreferenciamento, que é uma coisa que às vezes é cara e demorada, vamos incentivar que seja feito em grupo. Nós entramos com 30% do valor.
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Globo Amazônia: Em 2008, completam-se 20 anos da morte de Chico Mendes. O modelo de reserva extrativista que ele desenvolveu e defendeu ainda hoje é uma solução válida para parte dos problemas da Amazônia?

Minc: A reserva extrativista idealizada por Chico Mendes é um bom modelo. Mas o que acontecia? Das 56 reservas só duas tinham plano de manejo e a maioria dos extrativistas não tinha carteira assinada ou 13º salário. Muitos deles estavam vendendo madeira para madeireiras ilegais, ou deixando entrar gado, em troca de um bezerro a cada três nascidos. Então determinamos que vamos contratar todos os 54 planos de manejo que faltam. Já fizemos quatro estes dias, inclusive da Reserva Extrativista Chico Mendes, e conseguimos o preço mínimo para dez produtos extrativistas.

Devemos estar brevemente com o presidente Lula, no Acre, até em homenagem aos 20 anos do Chico Mendes, lançando os preços mínimos que vão permitir que estes extrativistas, com o preço mínimo e com plano de manejo, tenham crédito, valorizando a cadeia produtiva, e tenham mais recursos para viver com dignidade, mantendo a floresta em pé, sem vender madeira ao madeireiro ilegal e sem permitir que o gado entre na reserva extrativista.

(Globo Amazônia,  G1, 07/09/2008)

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