Sem se importar com a circulação de 2,5 mil alunos por dia, um casal de quero-queros construiu um ninho no pátio de uma das maiores escolas públicas do Rio Grande do Sul.
Atenta ao corre-corre de milhares de crianças e adolescentes no improvável local, a fêmea choca três ovos, que devem dar origem a filhotes em até duas semanas, enquanto o macho observa de longe a presença de possíveis intrusos.
As aves foram observadas há cerca de 15 dias em um campo localizado nos fundos da Escola Estadual de Ensino Médio Baltazar de Oliveira Garcia, no bairro Jardim Leopoldina, em Porto Alegre. Uma semana depois, ao brincar no local, crianças depararam com os ovos, e a notícia se espalhou. A instituição é a sexta maior em número de alunos mantida pela Secretaria Estadual da Educação (SEC).
Para proteger o ninho, a professora Sinara Oliveira tirou R$ 32 do próprio bolso para comprar uma tela de 10 metros de comprimento, semelhante às utilizadas como mosquiteiro. Sensibilizada com os cuidados dos quero-queros com os ovos, a servente Marilene Fontana Bonetti, 52 anos, fixou a tela em quatro postes de madeira de cerca de um metro de altura, formando um quadrilátero de proteção.
– A tela ia até o chão. Como a fêmea não conseguia entrar, levantamos um pouco para que ela chegasse pelo chão até os ovos – conta Marilene.
Durante o recreio, os alunos se aproximam para observar as aves, que respondem com gritos característicos e vôos rasantes para mostrar os esporões existentes nas asas. Em sala de aula, uma turma de 2ª série escolheu o nome do casal em uma votação: Bad e Gracinha.
– Estávamos estudando a diferença entre nomes próprios e comuns. Os alunos chegaram a pensar em escolher os nomes dos três filhotes, mas logo chegaram à conclusão de que ainda não sabem o sexo dos bichos – informa a professora, que considera um “presente de Deus” as aves terem escolhido a escola para procriar.
A maior lição para os alunos é a preservação da natureza. Como tem área verde, o colégio já teve também a presença de gambás, lagartos e diversos pássaros, como pica-paus e joões-de-barro. A aluna da 3ª série Andrieli Martins da Silva, nove anos, integra uma “patrulha ambiental” criada para proteger o ninho dos visitantes:
– Aprendi que o quero-quero é a ave símbolo do Rio Grande do Sul e que voa baixo para assustar outros animais e cuidar dos filhotes – diz.
O período de incubação dos ovos de um quero-quero dura, em média, 27 dias. A ave costuma habitar campos úmidos e margens de rios e lagoas. Como estratégia para despistar predadores, chama a atenção para locais afastados do ninho. Seu grito serve de alarme para indicar a presença de intrusos, o que auxilia outros animais a se protegerem de predadores.
(
Zero Hora, 06/09/2008)